INTRODUÇÃO
1. Perita em humanidade, a Igreja está sempre interessada por tudo o que diz respeito ao homem e à mulher. Nestes últimos tempos, tem-se reflectido muito sobre a dignidade da mulher, sobre os seus direitos e deveres nos diversos âmbitos da comunidade civil e eclesial. Havendo contribuído para o aprofundamento desta temática fundamental, sobretudo com o ensinamento de João Paulo II,1 a Igreja sente-se hoje interpelada por algumas correntes de pensamento, cujas teses muitas vezes não coincidem com as finalidades genuínas da promoção da mulher.
O presente documento, depois de uma breve apresentação e apreciação crítica de certas concepções antropológicas hodiernas, entende propor algumas reflexões inspiradas pelos dados doutrinais da antropologia bíblica — aliás indispensáveis para a salvaguarda da identidade da pessoa humana — sobre alguns pressupostos em ordem a uma recta compreensão da colaboração activa do homem e da mulher na Igreja e no mundo, a partir dessa sua mesma diferença. Pretendem estas reflexões, ao mesmo tempo, propor-se como ponto de partida para um caminho de aprofundamento no seio da Igreja e para instaurar um diálogo com todos os homens e mulheres de boa vontade, na busca sincera da verdade e no esforço comum de promover relações cada vez mais autênticas.
I. O PROBLEMA
2. Nestes últimos anos têm-se delineado novas tendências na abordagem do tema da mulher. Uma primeira tendência sublinha fortemente a condição de subordinação da mulher, procurando criar uma atitude de contestação. A mulher, para ser ela mesma, apresenta-se como antagónica do homem. Aos abusos de poder, responde com uma estratégia de busca do poder. Um tal processo leva a uma rivalidade entre os sexos, onde a identidade e o papel de um são assumidos em prejuízo do outro, com a consequência de introduzir na antropologia uma perniciosa confusão, que tem o seu revés mais imediato e nefasto na estrutura da família.
Uma segunda tendência emerge no sulco da primeira. Para evitar qualquer supremacia de um ou de outro sexo, tende-se a eliminar as suas diferenças, considerando-as simples efeitos de um condicionamento histórico-cultural. Neste nivelamento, a diferença corpórea, chamada sexo, é minimizada, ao passo que a dimensão estritamente cultural, chamada género, é sublinhada ao máximo e considerada primária. O obscurecimento da diferença ou dualidade dos sexos é grávido de enormes consequências a diversos níveis. Uma tal antropologia, que entendia favorecer perspectivas igualitárias para a mulher, libertando-a de todo o determinismo biológico, acabou de facto por inspirar ideologias que promovem, por exemplo, o questionamento da família, por sua índole natural bi-parental, ou seja, composta de pai e de mãe, a equiparação da homossexualidade à heterossexualidade, um novo modelo de sexualidade polimórfica.
3. A raiz imediata da sobredita tendência coloca-se no contexto da questão da mulher, mas a sua motivação mais profunda deve procurar-se na tentativa da pessoa humana de libertar-se dos próprios condicionamentos biológicos.2 De acordo com tal perspectiva antropológica, a natureza humana não teria em si mesma características que se imporiam de forma absoluta: cada pessoa poderia e deveria modelar-se a seu gosto, uma vez que estaria livre de toda a predeterminação ligada à sua constituição essencial.
Muitas são as consequências de uma tal perspectiva. Antes de mais, consolida-se a ideia de que a libertação da mulher comporta uma crítica à Sagrada Escritura, que transmitiria uma concepção patriarcal de Deus, alimentada por uma cultura essencialmente machista. Em segundo lugar, semelhante tendência consideraria sem importância e sem influência o facto de o Filho de Deus ter assumido a natureza humana na sua forma masculina.
4. Perante tais correntes de pensamento, a Igreja, iluminada pela fé em Jesus Cristo, fala ao invés de colaboração activa, precisamente no reconhecimento da própria diferença entre homem e mulher.
Para melhor compreender o fundamento, o sentido e as consequências desta resposta, convém voltar, ainda que brevemente, à Sagrada Escritura, que é rica também de sabedoria humana, e onde esta resposta se manifestou progressivamente, graças à intervenção de Deus em favor da humanidade.3
II. OS DADOS FUNDAMENTAIS DA ANTROPOLOGIA BÍBLICA
5. Uma primeira série de textos bíblicos a examinar são os primeiros três capítulos do Génesis. Colocam-nos eles «no contexto do “princípio” bíblico, no qual a verdade revelada sobre o homem como “imagem e semelhança de Deus” constitui a base imutável de toda a antropologia cristã».4
No primeiro texto (Gen 1,1-2,4) descreve-se o poder criador da Palavra de Deus que estabelece distinções no caos primigénio. Aparecem a luz e as trevas, o mar e a terra firme, o dia e a noite, as ervas e as árvores, os peixes e as aves, todos «segundo a própria espécie». Nasce um mundo ordenado a partir de diferenças que, por sua vez, são outras tantas promessas de relações. Eis, assim, esboçado o quadro geral em que se coloca a criação da humanidade. «Disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem e semelhança... Deus criou o ser humano à sua imagem; criou-o à imagem de Deus; criou-o homem e mulher» (Gen 1, 26-27). A humanidade aqui é descrita como articulada, desde a sua primeira origem, na relação do masculino e do feminino. É esta humanidade sexuada que é explicitamente declarada «imagem de Deus».
6. O segundo relato da criação (Gen 2,4-25) confirma inequivocavelmente a importância da diferença sexual. Uma vez plasmado por Deus e colocado no jardim, de que recebe a gestão, aquele que é designado ainda com o termo genérico de Adam sente uma solidão que a presença dos animais não consegue preencher. Precisa de uma ajuda que lhe seja correspondente. O termo indica, aqui, não um papel subalterno, mas uma ajuda vital.5 A finalidade é, efectivamente, a de permitir que a vida de Adam não se afunde num confronto estéril, e por fim mortal, apenas consigo mesmo. É necessário que entre em relação com um outro ser que esteja ao seu nível. Só a mulher, criada da mesma «carne» e envolvida no mesmo mistério, dá um futuro à vida do homem. Isso dá-se a nível ontológico, no sentido que a criação da mulher da parte de Deus caracteriza a humanidade como realidade relacional. Neste encontro brota também a palavra que abre, pela primeira vez, a boca do homem numa expressão de maravilha: «Esta é realmente carne da minha carne e osso dos meus ossos» (Gen 2,23).
«A mulher — escreveu o Santo Padre em referência a este texto do Génesis — é um outro “eu” na comum humanidade. Desde o início, [o homem e a mulher] aparecem como “unidade dos dois”, e isto significa a superação da solidão originária, na qual o homem não encontra “um auxiliar que lhe seja semelhante” (Gen 2,20). Tratar-se-á aqui do “auxiliar” só na acção, no “dominar a terra”? (cfr Gen 1,28). Certamente se trata da companheira da vida, com a qual o homem pode unir-se como se une com a esposa, tornando-se com ela “uma só carne” e abandonando, por isso, o “seu pai e a sua mãe” (cfr Gen 2,24)».6
A diferença vital é orientada à comunhão e é vivida de forma pacífica, expressa no tema da nudez: «Ora ambos andavam nus, o homem e a sua mulher, e não sentiam vergonha» (Gen 2,25). Assim, o corpo humano, marcado pelo selo da masculinidade ou da feminilidade, «comporta “desde o princípio” o atributo “esponsal”, ou seja a capacidade de exprimir o amor: aquele amor precisamente no qual o homem-pessoa se torna dom e — mediante esse dom — realiza o próprio sentido do seu ser e existir».7 Ainda comentando estes versículos do Génesis, o Santo Padre continua: «Nesta sua particularidade, o corpo é a expressão do espírito, e é chamado, no próprio mistério da criação, a existir na comunhão das pessoas, “à imagem de Deus”».8
Na mesma perspectiva esponsal, compreende-se em que sentido o antigo relato do Génesis dê a entender como a mulher, no seu ser mais profundo e originário, exista «para o outro» (cfr 1Cor 11,9): é uma afirmação que, bem longe de evocar alienação, exprime um aspecto fundamental da semelhança com a Santíssima Trindade, cujas Pessoas, com a vinda deCristo, revelam estar em comunhão de amor, umas para as outras. «Na “unidade dos dois”, o homem e a mulher são chamados, desde o início, não só a existir “um ao lado do outro” ou “juntos”, mas também a existir reciprocamente “um para o outro”... O texto de Génesis 2,18-25 indica que o matrimónio é a primeira e, num certo sentido, a fundamental dimensão desta chamada. Não é, porém, a única. Toda a história do homem sobre a terra realiza-se no âmbito desta chamada. Na base do princípio do recíproco ser “para” o outro, na “comunhão” interpessoal, desenvolve-se nesta história a integração na própria humanidade, querida por Deus, daquilo que é “masculino” e daquilo que é “feminino”».9
A visão pacífica com que termina o segundo relato da criação ecoa no «muito bom» que, no primeiro relato, encerrava a criação do primeiro casal humano. É aqui que se encontra o coração do plano originário de Deus e da verdade mais profunda do homem e da mulher, como Deus os quis e criou. Por mais perturbadas e obscurecidas que sejam pelo pecado, tais disposições originárias do Criador jamais poderão ser anuladas.
7. O pecado original altera a maneira como o homem e a mulher acolhem e vivem a Palavra de Deus e a sua relação com o Criador. Logo a seguir à entrega do dom do jardim, Deus dá um mandamento positivo (cfr Gen 2,16), seguido de outro negativo (cfr Gen 2,17), em que implicitamente se afirma a diferença essencial entre Deus e a humanidade. Sob a insinuação da Serpente, essa diferença é contestada pelo homem e pela mulher. Em consequência, é também alterada a maneira de viver a sua diferença sexual. O relato do Génesis estabelece assim uma relação de causa e efeito entre as duas diferenças: quando a humanidade considera Deus como seu inimigo, a própria relação do homem e da mulher é pervertida. Quando esta última relação se deteriora, o acesso ao rosto de Deus corre, por sua vez, o perigo de ficar comprometido.
Nas palavras que Deus dirige à mulher a seguir ao pecado, é expressa de forma lapidar, mas não menos impressionante, o tipo de relações que passarão a instaurar-se entre o homem e a mulher: «Sentir-te-ás atraída para o teu marido e ele te dominará» (Gen 3,16). Será uma relação em que frequentemente se desnaturará o amor na mera busca de si mesmo, numa relação que ignora e mata o amor, substituindo-o com o jogo do domínio de um sexo sobre o outro. A história da humanidade reproduz de facto tais situações, em que se exprime claramente a tríplice concupiscência que São João recorda, ao falar da concupiscência da carne, da concupiscência dos olhos e da soberba da vida (cfr 1Jo 2,16). Nesta trágica situação, perdem-se a igualdade, o respeito e o amor, que no plano originário de Deus a relação do homem e da mulher exige.
8. Repassar estes textos fundamentais permite reafirmar alguns dados capitais da antropologia bíblica.
Antes de mais, há que sublinhar o carácter pessoal do ser humano. «O homem é uma pessoa, em igual medida o homem e a mulher: os dois, na verdade, foram criados à imagem e semelhança do Deus pessoal».10 A igual dignidade das pessoas realiza-se como complementaridade física, psicológica e ontológica, dando lugar a uma harmoniosa «unidualidade» relacional, que só o pecado e as “estruturas do pecado” inscritas na cultura tornaram potencialmente conflituosa. A antropologia bíblica convida a enfrentar com uma atitude relacional, não concorrencial nem de desforra, os problemas que, a nível público ou privado, envolvem a diferença de sexo.
Há que salientar, por outro lado, a importância e o sentido da diferença dos sexos como realidade profundamente inscrita no homem e na mulher: «a sexualidade caracteriza o homem e a mulher, não apenas no plano físico, mas também no psicológico e espiritual, marcando todas as suas expressões».11 Não se pode reduzi-la a puro e insignificante dado biológico, mas é «uma componente fundamental da personalidade, uma sua maneira de ser, de se manifestar, de comunicar com os outros, de sentir, exprimir e viver o amor humano».12 Esta capacidade de amar, reflexo e imagem de Deus Amor, tem uma sua expressão no carácter esponsal do corpo, em que se inscreve a masculinidade e a feminilidade da pessoa.
A dimensão antropológica da sexualidade é inseparável da teológica. A criatura humana, na sua unidade de alma e corpo, é desde o princípio qualificada pela relação com o outro-de-si. É uma relação que se apresenta sempre boa e, ao mesmo tempo, alterada. É boa, de uma bondade originária declarada por Deus desde o primeiro momento da criação; mas é também alterada pela desarmonia entre Deus e a humanidade provocada pelo pecado. Esta alteração não corresponde, porém, nem ao projecto inicial de Deus sobre o homem e sobre a mulher, nem à verdade da relação dos sexos. Daí que, portanto, esta relação boa, mas ferida, precise de ser curada.
Quais podem ser os caminhos dessa cura? Considerar e analisar os problemas inerentes à relação dos sexos, só a partir de uma situação marcada pelo pecado, levaria necessariamente o pensamento a regredir aos erros acima acenados. Há portanto que romper esta lógica de pecado e procurar uma saída que permita extirpá-la do coração do homem pecador. Uma orientação clara nesse sentido encontra-se na promessa divina de um Salvador, em que aparecem empenhadas a «mulher» e a sua «descendência» (cfr Gen 3,15). É uma promessa que, antes de se cumprir, terá uma longa preparação na história.
9. Uma primeira vitória sobre o mal está representada na história de Noé, homem justo, que, guiado por Deus, escapa ao dilúvio com a sua família e com as diversas espécies de animais (cfr Gen 6-9). Mas é sobretudo na escolha divina de Abraão e da sua descendência (cfr Gen 12,1ss) que a esperança de salvação se confirma. Deus começa assim a revelar o seu rosto, para que, através do povo escolhido, a humanidade aprenda a estrada da semelhança divina, ou seja, da santidade e, por conseguinte, da mudança do coração. Entre as muitas maneiras com que Deus se revela ao seu povo (cfr Heb 1,1), segundo uma longa e paciente pedagogia, encontra-se também a referência ao tema comum da aliança do homem e da mulher. É paradoxal, se se considera o drama evocado pelo Génesis e a sua réplica muito concreta no tempo dos profetas, bem como a mistura entre o sagrado e a sexualidade presente nas religiões que circundam Israel. Mesmo assim, tal simbolismo afigura-se indispensável para se compreender o modo com que Deus ama o seu povo: Deus faz-se conhecer como Esposo que ama Israel, sua Esposa.
Se nesta relação Deus é descrito como «Deus ciumento» (cfr Ex 20,5; Naum 1,2) e Israel denunciado como Esposa «adúltera» ou «prostituta» (cfr Os 2,4-15; Ez 16,15-34), é porque a esperança, reforçada pela palavra dos profetas, está precisamente em ver a nova Jerusalém tornar-se a esposa perfeita: «tal como o jovem desposa uma virgem, o teu Construtor te desposará; e como a esposa é a alegria do marido, tu serás a alegria do teu Deus» (Is 62,5). Recriada «na justiça e no direito, na benevolência e no amor» (Os 2,21), aquela que se afastara para procurar a vida e a felicidade entre os falsos deuses há-de voltar, e Àquele que lhe falará ao coração «cantará como nos dias da sua juventude» (Os 2,17); e ouvi-lo-á declarar: «o teu esposo é o teu criador» (Is 54,5). Substancialmente, é o mesmo dado que se afirma, quando, paralelamente ao mistério da obra que Deus realiza através da figura masculina do Servo sofredor, o livro de Isaías evoca a figura feminina de Sião, ornada de uma transcendência e de uma santidade que prefiguram o dom da salvação destinada a Israel.
O Cântico dos Cânticos representa, sem dúvida, um momento privilegiado no uso desta modalidade de revelação. Nas palavras de um amor muito humano que celebra a beleza dos corpos e a felicidade do procurar-se um ao outro, exprime-se também o amor de Deus para com o seu povo. A Igreja, portanto, não se enganou, quando, usando as mesmas expressões, descobriu na audaciosa união do que há de mais humano com o que há de mais divino, o mistério da sua relação com Cristo.
Ao longo de todo o Antigo Testamento, configura-se uma história de salvação que joga simultaneamente com a participação do masculino e do feminino. Os termos esposo e esposa, e também aliança, com que se caracteriza a dinâmica da salvação, embora possuindo uma evidente dimensão metafórica, são muito mais que simples metáforas. Tal vocabulário nupcial atinge a própria natureza da relação que Deus estabelece com o seu povo, mesmo se essa relação é mais vasta do que se possa provar na experiência nupcial humana. Igualmente, as mesmas condições concretas da redenção estão em jogo, na forma como oráculos, do tipo dos de Isaías, associam papéis masculinos e femininos no anúncio e na prefiguração da obra de salvação que Deus está para realizar. Tal salvação orienta o leitor, tanto para a figura masculina do Servo sofredor, como para a figura feminina de Sião. Os oráculos de Isaías, de facto, alternam esta figura com a do Servo de Deus, antes de culminar, no fim do livro, com a visão misteriosa de Jerusalém que dá à luz um povo num só dia (cfr Is 66,7-14), profecia da grande novidade que Deus está para realizar (cfr Is 48,6-8).
10. No Novo Testamento, todas estas prefigurações encontram a sua realização. Por um lado, Maria, como filha eleita de Sião, na sua feminilidade, recapitula e transfigura a condição de Israel/Esposa à espera do dia da sua salvação. Por outro, a masculinidade do Filho permite reconhecer como Jesus assume na sua pessoa tudo o que o simbolismo veterotestamentário aplicou ao amor de Deus para com o seu povo, des- crito como o amor de um esposo para com a sua esposa. As figuras de Jesus e de Maria, sua Mãe, não só asseguram a continuidade do Antigo Testamento com o Novo, mas superam-no, a partir do momento que, com Jesus Cristo, aparece — como diz Santo Ireneu — «a novidade toda».13
Tal aspecto é posto em particular evidência pelo Evangelho de João. Na cena das núpcias de Caná, por exemplo, Jesus é solicitado pela mãe, chamada “mulher”, a dar como sinal o vinho novo das futuras núpcias com a humanidade (cfr Jo 2,1-12). Tais núpcias messiânicas realizar-se-ão sobre a cruz, onde, ainda na presença da mãe, indicada como “mulher”, brotará do coração aberto do Crucificado o sangue/vinho da Nova Aliança (cfr Jo 19,25-27.34).14 Nada surpreende, portanto, se João Baptista, interrogado sobre a sua identidade, se apresenta como «o amigo do esposo», que se alegra ao ouvir a voz do esposo e que deve eclipsar-se à sua chegada: «Quem tem a esposa é o esposo; e o amigo do esposo, que o acompanha e escuta, sente muita alegria ao ouvir a sua voz. Essa é a minha alegria, que agora é completa: Ele deve crescer e eu diminuir» (Jo 3,29-30).15
Na sua actividade apostólica, Paulo desenvolve todo o sentido nupcial da redenção, concebendo a vida cristã como um mistério nupcial. Escreve à Igreja de Corinto, por ele fundada: «Sinto por vós um ciúme semelhante ao ciúme de Deus, porque vos desposei com um só esposo, que é Cristo, a quem devo apresentar-vos como virgem pura» (2Cor 11,2).
Na Carta aos Efésios, a relação esponsal entre Cristo e a Igreja é retomada e amplamente aprofundada. Na Nova Aliança, a Esposa amada é a Igreja, e — como ensina o Santo Padre na Carta às famílias — «esta esposa, de que fala a Carta aos Efésios, faz-se presente em cada baptizado e é como uma pessoa em quem o olhar do seu Esposo se compraz: “Amou a Igreja e por ela Se entregou... para a apresentar a Si mesmo como Igreja gloriosa sem mancha nem ruga, nem qualquer coisa semelhante, mas santa e imaculada” (Ef 5,25-27)».16
Meditando, portanto, sobre a união do homem e da mulher, como é descrita no momento da criação do mundo (cfr Gen 2,24), o Apóstolo exclama: «É grande este mistério, digo-o em relação a Cristo e à Igreja!» (Ef 5,32). O amor do homem e da mulher, vivido na força da vida baptismal, passa a ser sacramento do amor de Cristo e da Igreja, testemunho dado ao mistério de fidelidade e de unidade, donde nasce a «nova Eva», e de que esta vive na sua peregrinação sobre a terra à espera da plenitude das núpcias eternas.
11. Inseridos no mistério pascal e tornados sinais vivos do amor de Cristo e da Igreja, os esposos cristãos são renovados no seu coração, podendo evitar as relações marcadas pela concupiscência e pela tendência a subjugar, que a ruptura com Deus por causa do pecado havia introduzido no casal primitivo. Para eles, a bondade do amor, de que o desejo humano ferido sentia saudade, revela-se com novas acentuações e possibilidades. É nesta luz que Jesus, perante a pergunta sobre o divórcio (cfr Mt 19,3-9), pode recordar as exigências da aliança entre o homem e a mulher, como Deus as quisera nas origens, ou seja, antes da aparição do pecado que justificaria as sucessivas acomodações da lei de Moisés. Longe de ser a imposição de uma ordem dura e intransigente, essa palavra de Jesus é, na verdade, o anúncio de uma «boa nova»: a da fidelidade mais forte que o pecado. Na força da ressurreição, torna-se possível a vitória da fidelidade sobre as fraquezas, sobre as feridas recebidas e sobre os pecados do casal. Na graça de Cristo que renova o seu coração, o homem e a mulher tornam-se capazes de se libertar do pecado e de conhecer a alegria do dom recíproco.
12. «Vós que fostes baptizados em Cristo fostes revestidos de Cristo... não há mais homem nem mulher» — escreve São Paulo aos Gálatas (3,27-28). O Apóstolo não declara aqui que deixou de existir a distinção homem-mulher, distinção que alhures diz pertencer ao projecto de Deus. O que, ao invés, quer dizer é o seguinte: em Cristo, a rivalidade, a inimizade e a violência, que desfiguravam a relação do homem e da mulher, são superáveis e estão superadas. Neste sentido, mais do que nunca é reafirmada a distinção do homem e da mulher, que aliás acompanha até ao fim a revelação bíblica. Na hora final da história presente, quando se vislumbram no Apocalipse de João «um novo céu» e «uma nova terra» (Ap 21,1), é apresentada em visão uma Jerusalém feminina «bela como noiva adornada para o seu esposo» (Ap 21,2). A própria revelação termina com a palavra da Esposa e do Espírito que imploram a vinda do Esposo: «Vem, Senhor Jesus» (Ap 22,20).
O masculino e o feminino são, portanto, revelados como pertencentes ontologicamente à criação e, por conseguinte, destinados a perdurar além do tempo presente, evidentemente numa forma transfigurada. Desse modo caracterizam o amor que «não terá fim» (1Cor 13,8), embora se torne caduca a expressão temporal e terrena da sexualidade, ordenada para um regime de vida marcado pela geração e pela morte. Dessa forma de existência futura do masculino e feminino, o celibato pelo Reino quer ser profecia. Para os que o vivem, antecipa a realidade de uma vida que, embora permanecendo a de um homem e de uma mulher, deixará de estar sujeita às limitações presentes da relação conjugal (cfr Mt 22,30). Para os que vivem a vida conjugal, também o seu estado constitui referência e profecia da perfeição que a sua relação encontrará no encontro face a face com Deus.
Distintos desde o início da criação e permanecendo tais no próprio coração da eternidade, o homem e a mulher, inseridos no mistério pascal de Cristo, deixam de conceber a sua diferença como fonte de discórdia, a superar com a negação ou com o nivelamento, mas como uma possibilidade de colaboração, que devem cultivar no recíproco respeito da distinção. Daqui se abrem novas perspectivas para uma compreensão mais profunda da dignidade da mulher e do seu papel na sociedade humana e na Igreja.
III. A ACTUALIDADE DOS VALORES FEMININOS NA VIDA DA SOCIEDADE
13. Entre os valores fundamentais relacionados com a vida concreta da mulher, existe o que se chama a sua «capacidade para o outro». Não obstante o facto de um certo discurso feminista reivindicar as exigências «para ela mesma», a mulher conserva a intuição profunda de que o melhor da sua vida é feito de actividades orientadas para o despertar do outro, para o seu crescimento, a sua protecção.
Uma tal intuição é ligada à sua capacidade física de dar a vida. Vivida ou potencial, essa capacidade é uma realidade que estrutura em profundidade a personalidade feminina. Permite-lhe alcançar muito cedo a maturidade, sentido da gravidade da vida e das responsabilidades que a mesma implica. Desenvolve em si o sentido e o respeito do concreto, que se opõe às abstracções, muitas vezes mortais para a existência dos indivíduos e da sociedade. É ela, enfim, que, mesmo nas situações mais desesperadas — a história passada e presente são testemunho disso —, possui uma capacidade única de resistir nas adversidades; de tornar a vida ainda possível, mesmo em situações extremas; de conservar um sentido tenaz do futuro e, por último, recordar com as lágrimas o preço de cada vida humana.
Embora a maternidade seja um elemento chave da identidade feminina, isso não autoriza absolutamente a considerar a mulher apenas sob o perfil da procriação biológica. Pode haver nesse sentido graves exageros que exaltam uma fecundidade biológica em termos vitalistas e que frequentemente são acompanhados de um perigoso desprezo da mulher. A existência da vocação cristã à virgindade, audaciosa em relação à tradição veterotestamentária e às exigências de muitas sociedades humanas, é neste campo de grandíssima importância.17 Nega ela de forma radical toda a pretensão de fechar as mulheres num destino que seria simplesmente biológico. Como a virgindade recebe da maternidade física a advertência de que não existe vocação cristã senão no dom concreto de si ao outro, do mesmo modo a maternidade física recebe da virgindade o apelo à sua dimensão fundamentalmente espiritual: não é contentando-se em dar a vida física que se gera verdadeiramente o outro. Isto quer dizer que a maternidade pode encontrar formas de realização plena também onde não há geração física.18
Numa tal perspectiva, compreende-se o papel insubstituível da mulher em todos os aspectos da vida familiar e social que envolvam relações humanas e o cuidado do outro. Aqui se manifesta com clareza o que João Paulo II chamou génio da mulher.19 Implica isto, antes de mais, que as mulheres estejam presentes, activamente e até com firmeza, na família, que é «sociedade primordial e, em certo sentido, “soberana”»,20 porque é nesta que, em primeiro lugar, se plasma o rosto de um povo; é nesta onde os seus membros adquirem os ensinamentos fundamentais. Nela aprendem a amar, enquanto são amados gratuitamente; aprendem o respeito por toda a outra pessoa, enquanto são respeitados; aprendem a conhecer o rosto de Deus, enquanto recebem a sua primeira revelação de um pai e de uma mãe cheios de atenção. Todas as vezes que venham a faltar estas experiências fundantes, é a sociedade no seu conjunto que sofre violência e se torna, por sua vez, geradora de múltiplas violências. Isso implica também que as mulheres estejam presentes no mundo do trabalho e da organização social e que tenham acesso a lugares de responsabilidade, que lhes dêem a possibilidade de inspirar as políticas das nações e promover soluções inovadoras para os problemas económicos e sociais.
A este respeito, não se pode, porém, esquecer que a interligação das duas actividades — família e trabalho — assume, no caso da mulher, características diferentes das do homem. Põe-se, portanto, o problema de harmonizar a legislação e a organização do trabalho com as exigências da missão da mulher no seio da família. O problema não é só jurídico, económico e organizativo; é antes de mais um problema de mentalidade, de cultura e de respeito. Exige-se, de facto, uma justa valorização do trabalho realizado pela mulher na família. Assim, as mulheres que livremente o desejam poderão dedicar a totalidade do seu tempo ao trabalho doméstico, sem ser socialmente estigmatizadas e economicamente penalizadas. As que, por usa vez, desejarem realizar também outros trabalhos poderão fazê-lo com horários adequados, sem serem confrontadas com a alternativa de mortificar a sua vida familiar ou então arcar com uma situação habitual de stress que não favorece nem o equilíbrio pessoal nem a harmonia familiar. Como escreve João PauloII, «reverterá em honra para a sociedade o tornar possível à mãe — sem pôr obstáculos à sua liberdade, sem discriminação psicológica ou prática e sem que ela fique numa situação de desdouro em relação às outras mulheres — cuidar dos seus filhos e dedicar-se à educação deles, segundo as diferentes necessidades da sua idade».21
14. É, em todo o caso, oportuno lembrar que os valores femininos, a que se acenou, são antes de mais valores humanos: a condição humana, do homem e da mulher, criados à imagem de Deus, é una e indivisível. É só por estarem em sintonia mais imediata com estes valores que as mulheres podem ajudar a lembrá-los ou ser o seu sinal privilegiado. Mas, em última análise, todo o ser humano, homem e mulher, é destinado a ser «para o outro». Nessa perspectiva, o que se chama «feminilidade» é mais do que um simples atributo do sexo feminino. A palavra designa, com efeito, a capacidade fundamentalmente humana de viver para o outro e graças ao outro.
Portanto, a promoção da mulher no seio da sociedade deve ser compreendida e querida como uma humanização, realizada através daqueles valores que foram redescobertos graças às mulheres. Qualquer perspectiva que pretenda propor-se como luta dos sexos não passa de uma ilusão e perigo: desembocaria em situações de segregação e de competição entre homens e mulheres e promoveria um solipsismo que se nutre de uma falsa concepção da liberdade.
Sem prejuízo dos esforços que são feitos na promoção dos direitos que as mulheres podem aspirar na sociedade e na família, estas observações querem, ao invés, corrigir a perspectiva que considera os homens inimigos a vencer. A relação homem-mulher não pode pretender encontrar a sua justa condição numa espécie de contraposição, desconfiada e defensiva. Tal relação tem de ser vivida na paz e na felicidade do amor partilhado.
A um nível mais concreto, as políticas sociais —educativas, familiares, laborais, de acesso aos serviços, de participação cívica, — se, por um lado, devem combater toda a discriminação sexual injusta, por outro, devem saber escutar as aspirações e assinalar as necessidades de cada um. A defesa e promoção da igual dignidade e dos comuns valores pessoais devem harmonizar-se com o atento reconhecimento da diferença e da reciprocidade, onde a realização da própria humanidade masculina e feminina o exija.
IV. A ACTUALIDADE DOS VALORES FEMININOS NA VIDA DA IGREJA
15. No que diz respeito à Igreja, o sinal da mulher é eminentemente central e fecundo. Depende da própria centralidade da Igreja, que o recebe de Deus e acolhe na fé. É esta identidade «mística», profunda, essencial, que se deve ter presente na reflexão sobre os papéis próprios do homem e da mulher na Igreja.
Desde as primeiras gerações cristãs, a Igreja considerou-se uma comunidade, gerada por Cristo e a Ele ligada por uma relação de amor, de que a experiência nupcial é a melhor expressão. Daí deriva que o primeiro dever da Igreja é permanecer na presença desse mistério do amor de Deus, manifestado em Jesus Cristo, contemplá-lo e celebrá-lo. Nesta matéria, a figura de Maria constitui na Igreja a referência fundamental. Poderia dizer-se, com uma metáfora, que Maria oferece à Igreja o espelho em que esta é convidada a descobrir a sua identidade, bem como as disposições do coração, as atitudes e os gestos que Deus dela espera.
A existência de Maria é um convite à Igreja para basear o seu ser na escuta e no acolhimento da Palavra de Deus, porque a fé não é tanto a procura de Deus por parte do ser humano, mas é sobretudo a aceitação por parte do homem de que Deus vem até ele, visita-o e fala-lhe. Esta fé, para a qual «nada é impossível a Deus» (cfr Jo 18,14; Lc 1,37), vive e aprofunda-se na obediência humilde e amorosa com que a Igreja sabe dizer ao Pai: «Faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc 1,38). A fé leva constantemente a Jesus — «Fazei tudo o que Ele vos disser» (Jo 2,5) — e acompanha-O no seu caminho até aos pés da cruz. Maria, na hora das trevas mais profundas, persiste corajosamente na fidelidade, com a única certeza da confiança na Palavra de Deus.
Sempre em Maria, a Igreja aprende a conhecer a intimidade de Cristo. Maria, que trouxe nas suas mãos a pequena criança de Belém, ensina a descobrir a infinita humildade de Deus. Ela, que recebeu nos seus braços o corpo dilacerado de Jesus deposto da cruz, mostra à Igreja como pegar em todas as vidas desfiguradas neste mundo pela violência e pelo pecado. De Maria, a Igreja aprende o sentido do poder do amor, como Deus o exerce e revela na própria vida do Filho predilecto: «dispersou os soberbos... exaltou os humildes» (Lc 1,51-52). Sempre de Maria, os discípulos de Cristo recebem o sentido e o gosto do louvor perante a obra das mãos de Deus: «o Todo-poderoso fez em mim maravilhas» (Lc 1,49). Aprendem que estão no mundo para conservar a memória dessas «maravilhas» e vigiar, enquanto aguardam o dia do Senhor.
16. Olhar para Maria e imitá-la não significa, todavia, votar a Igreja a uma passividade inspirada numa concepção superada da feminilidade, e condená-la a uma vulnerabilidade perigosa, num mundo em que o que conta é sobretudo o domínio e o poder. Na verdade, o caminho de Cristo não é nem o do domínio (cfr Fil 2,6), nem o do poder como o entende o mundo (cfr Jo 18,36). Do Filho de Deus pode aprender-se que esta «passividade» é, na realidade, o caminho do amor; é um poder régio que derrota toda a violência; é «paixão» que salva o mundo do pecado e da morte e recria a humanidade. Confiando ao apóstolo João a sua Mãe, o Crucificado convida a sua Igreja a aprender de Maria o segredo do amor que triunfa.
Muito longe de conferir à Igreja uma identidade fundada sobre um modelo contingente de feminilidade, a referência a Maria, com as suas disposições de escuta e acolhimento, de humildade, de fidelidade, de louvor e espera, coloca a Igreja na continuidade da história espiritual de Israel. Estas atitudes tornam-se, em Jesus e por meio d'Ele, a vocação de todo o baptizado. Prescindindo das condições, dos estados de vida, das diferentes vocações, com ou sem responsabilidades públicas, são elas que determinam um aspecto essencial da identidade da vida cristã. Embora sejam atitudes que deveriam ser típicas de todo o baptizado, na realidade é típico da mulher vivê-las com especial intensidade e naturalidade. Assim, as mulheres desempenham um papel de máxima importância na vida eclesial, lembrando essas disposições a todos os baptizados e contribuindo de maneira ímpar para manifestar o verdadeiro rosto da Igreja, esposa de Cristo e mãe dos crentes.
Numa tal perspectiva, também se compreende porque o facto de a ordenação sacerdotal ser exclusivamente reservada aos homens 22 não impede às mulheres de terem acesso ao coração da vida cristã. Elas são chamadas a ser modelos e testemunhas insubstituíveis para todos os cristãos de como a Esposa deve responder com amor ao amor do Esposo.
CONCLUSÃO
17. Em Jesus Cristo todas as coisas se tornaram novas (cfr Ap 21,5). A renovação na graça porém não é possível sem a conversão dos corações. Trata-se, olhando para Jesus e confessando-O como Senhor, de reconhecer o caminho do amor vitorioso sobre o pecado que Ele propõe aos seus discípulos.
Assim sendo, a relação do homem com a mulher transforma-se, e a tríplice concupiscência, de que fala a primeira Carta de João (cfr 1 Jo 16), deixa de ter o predomínio. Deve acolher-se o testemunho da vida das mulheres como revelação de valores, sem os quais a humanidade se fecharia na auto-suficiência, nos sonhos de poder e no drama da violência. Também a mulher, por seu lado, deve deixar-se converter e reconhecer os singulares valores, fortemente eficazes, do amor pelo outro, de que a sua feminilidade é portadora. Em ambos os casos, trata-se da conversão da humanidade a Deus, de modo que, tanto o homem como a mulher, vejam em Deus o seu «auxílio», o Criador cheio de ternura, o Redentor que «amou tanto o mundo a ponto de entregar o seu Filho unigénito» (Jo 3,16).
Uma tal conversão não pode realizar-se sem a oração humilde para receber de Deus a transparência de olhar que reconhece o próprio pecado e, ao mesmo tempo, a graça que o cura. De modo especial deve implorar-se a Virgem Maria, mulher segundo o coração de Deus, «bendita entre as mulheres» (cfr Lc 1,42), escolhida para revelar à humanidade, homens e mulheres, qual o caminho do amor. Só assim poderá sobressair em cada homem e em cada mulher, em cada um segundo a sua própria graça, a «imagem de Deus», que é a santa efígie com que são assinalados (cfr Gen 1,27). Só assim se poderá reencontrar o caminho da paz e da maravilha, de que dá testemunho a tradição bíblica através dos versículos do Cântico dos Cânticos, em que corpos e corações celebram o mesmo júbilo.
A Igreja certamente conhece a força do pecado que opera nos indivíduos e nas sociedades e que por vezes leva a perder a esperança na bondade do casal. Ela, porém, pela sua fé em Cristo crucificado e ressuscitado, conhece ainda mais a força do perdão e do dom de si. Apesar de toda a ferida e toda a injustiça, a paz e a maravilha que ela com confiança aponta aos homens e mulheres de hoje são a paz e a maravilha do jardim da ressurreição, que iluminou o nosso mundo e toda a sua história com a revelação de que «Deus é amor» (1Jo 4,8.16).
O Sumo Pontífice João Paulo II, no decurso da Audiência concedida ao abaixo-assinado Cardeal Prefeito, aprovou a presente Carta, decidida na reunião ordinária desta Congregação, e mandou que fosse publicada.
Roma, Sede da Congregação para a Doutrina da Fé, 31 de Maio de 2004, Festa da Visitação de Nossa Senhora.
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Joseph Card. Ratzinger
Prefeito
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Angelo Amato, SDB
Arcebispo titular de Sila
Secretário
1Cfr João Paulo II, Exort. apost. post-sinodal Familiaris consortio (22 de Novembro de 1981): AAS 74 (1982), 81-191; Carta apost. Mulieris dignitatem (15 de Agosto de 1988): AAS 80 (1988), 1653-1729; Carta às famílias (2 de Fevereiro de 1994): AAS 86 (1994), 868-925; Carta às mulheres (29 de Junho de 1995): AAS 87 (1995), 803-812; Catequese sobre o amor humano (1979-1984): Insegnamenti II (1979) - VII (1984); Congregação para a Educação Católica, Orientações educativas sobre o amor humano. Lineamentos de educação sexual (1 de Novembro de 1983): Ench. Vat. 9, 420-456; Pontifício Conselho para a Família, Sexualidade humana: verdade e significado. Orientações educativas em família (8 de Dezembro de 1995): Ench. Vat. 14, 2008-2077.
2Sobre a complexa questão do gender, cfr ainda Pontifício Conselho para a Família, Família, matrimónio e «união de facto» (26 de Julho de 2000), 8: Suplemento a L'Osservatore Romano (22 de Novembro de 2000), 4.
3Cfr João Paulo II, Carta enc. Fides et ratio (14 de Setembro de 1998), 21: AAS 91 (1999), 22: «Esta abertura ao mistério, que provinha da Revelação, acabou por ser para ele [o homem bíblico] a fonte de um verdadeiro conhecimento, que permitiu à sua razão aventurar-se em espaços infinitos, recebendo possibilidades de compreensão, até então impensáveis».
4João Paulo II, Carta apost. Mulieris dignitatem (15 de Agosto de 1988), 6: AAS 80 (1988), 1662; cfr S. Ireneu, Adversus haereses, 5, 6, 1; 5, 16, 2-3: SC 153, 72-81; 216-221; S. Gregório de Nissa, De hominis opificio, 16: PG 44, 180; In Canticum homilia, 2: PG 44, 805-808; S. Agostinho, Enarratio in Psalmum, 4, 8: CCL 38,17.
5A palavra ebraica ezer, traduzida com ajuda, indica o socorro que só uma pessoa dá a uma outra pessoa. O termo não comporta nenhuma conotação de inferioridade ou instrumentalização, se se tem presente que também Deus é por vezes chamado ezer em relação ao homem (cfr Ex 18,4; Sal 9-10, 35).
6João Paulo II, Carta apost. Mulieris dignitatem (15 de Agosto de 1988), 6: AAS 80 (1988), 1664.
7João Paulo II, Catequese O homem-pessoa torna-se dom na liberdade do amor (16 de Janeiro de 1980), 1: Insegnamenti III, 1 (1980), 148.
8João Paulo II, Catequese a concupiscência do corpo deforma as relações homem-mulher (23 de Julho de 1980), 1: Insegnamenti III, 2 (1980), 288.
9João Paulo II, Carta apost. Mulieris dignitatem (15 de Agosto de 1988), 7: AAS 80 (1988), 1666.
10Ibid., 6: l.c., 1663.
11Congregação para a Educação Católica, Orientações educativas sobre o amor humano. Lineamentos de educação sexual (1 de Novembro de 1983), 4: Ench. Vat. 9, 423.
12Ibid.
13Adversus haereses, 4, 34, 1: SC 100, 846: «Omnem novitatem attulit semetipsum afferens».
14A Tradição exegética antiga vê Maria em Caná como a «figura Synagogae» e a «inchoatio Ecclesiae».
15O quarto evangelho aprofunda aqui um dado já presente nos Sinópticos (cfr Mt 9,15 e par.). Sobre o tema de Jesus Esposo, cfr João Paulo II, Carta às famílias (2 de Fevereiro de 1994), 18: AAS 86 (1994), 906-910.
16João Paulo II, Carta às famílias (2 de Fevereiro de 1994), 19: AAS 86 (1994), 911; cfr Carta apost. Mulieris dignitatem (15 de Agosto de 1988), 23-25: AAS 80 (1988), 1708-1715.
17Cfr João Paulo II, Exort. apost. post-sinodal Familiaris consortio (22 de Novembro de 1981), 16: AAS 74 (1982), 98-99.
18Ibid., 41: l.c., 132-133; Congregação para a Doutrina da Fé, Instr. Donum vitae (22 de Fevereiro de 1987), II, 8: AAS 80 (1988), 96-97.
19Cfr João Paulo II, Carta às mulheres (29 de Junho de 1995), 9-10: AAS 87 (1995), 809-810.
20João Paulo II, Carta às famílias (2 de Fevereiro de 1994), 17: AAS 86 (1994), 906.
21Carta enc. Laborem exercens (14 de Setembro de 1981), 19: AAS 73 (1981), 627.
22Cfr João Paulo II, Carta apost. Ordinatio sacerdotalis (22 de Maio de 1994): AAS 86 (1994), 545-548; Congregação para a Doutrina da Fé, Resposta à dúvida sobre a doutrina da Carta apostólica Ordinatio sacerdotalis (28 de Outubro de 1995): AAS 87 (1995), 1114.