REDAÇÃO CENTRAL, Sep 6, 2019 / 09:31 am
Diante de 60 mil fiéis que lotaram o Estádio Zimpeto de Maputo para participar da Santa Missa presidida pelo Papa Francisco, último evento em Moçambique antes de continuar sua viagem apostólica pela África, o Santo Padre fez um chamado à reconciliação dos moçambicanos e à superação das feridas da guerra civil que se desenvolveu entre 1977 e 1992 e cujas consequências ainda são sentidas no país.
O Papa lembrou a mensagem de Jesus no evangelho: "Amai os vossos inimigos". Isso é "uma palavra dirigida hoje também a nós, que O escutamos neste Estádio".
As palavras de Francisco, pronunciadas debaixo de forte chuva, que não parecia incomodar os milhares de fiéis que escutavam em silêncio as palavras do Pontífice e que cantavam com entusiasmo os cânticos litúrgicos de forte identidade africana, pareciam proféticas para uma população que sofreu uma das guerras civis mais longas da África, despois das independências.
Francisco destacou que a reconciliação é mais necessária, pois muitos moçambicanos sofreram a violência da guerra em primeira pessoa.
"Muitos de vós podem ainda contar, em primeira pessoa, histórias de violência, ódio e discórdias; alguns, em sua própria carne; outros, de alguém conhecido que já cá não está; e outros ainda pelo temor de que feridas do passado se repitam e tentem apagar o caminho de paz já percorrido".
Por isso, reconheceu que "é difícil falar de reconciliação, quando ainda estão vivas as feridas causadas durante tantos anos de discórdia, ou convidar a dar um passo de perdão que não signifique ignorar o sofrimento nem pedir que se cancele a memória ou os ideais".
Mesmo assim, "Jesus convida a amar e a fazer o bem. E isto é muito mais do que ignorar a pessoa que nos prejudicou ou esforçar-se por que não se cruzem as nossas vidas: é um mandato que visa uma benevolência ativa, desinteressada e extraordinária para com aqueles que nos feriram".
Além disso, lembrou que Jesus também nos pede que abençoemos e rezemos pelos inimigos, "isto é, que o nosso falar deles seja um bendizer, gerador de vida e não de morte, que pronunciemos os seus nomes não para insulto ou vingança, mas para inaugurar um novo vínculo que leve à paz".
"Com tal convite, Jesus quer encerrar para sempre a prática tão usual – ontem como hoje – de ser cristão e viver sob a lei de talião. Não se pode pensar o futuro, construir uma nação, uma sociedade sustentada na 'equidade' da violência. Não posso seguir Jesus, se a ordem que promovo e vivo é 'olho por olho, dente por dente'".
Em sua homilia, o Papa Francisco enfatizou que "nenhuma família, nenhum grupo de vizinhos ou uma etnia e menos ainda um país tem futuro, se o motor que os une, congrega e cobre as diferenças é a vingança e o ódio".
"Não podemos pôr-nos de acordo e unir-nos para nos vingarmos, para fazermos àquele que foi violento o mesmo que ele nos fez, para planearmos ocasiões de retaliação sob formatos aparentemente legais".
"A 'equidade' da violência é sempre uma espiral sem saída; e o seu custo, muito alto", insistiu. "Há outro caminho possível, porque é crucial não esquecer que os nossos povos têm direito à paz. Vós tendes direito à paz".
O Pontífice fez um chamado a "superar os tempos de divisão e violência", que "supõe não só um ato de reconciliação ou a paz entendida como ausência de conflito, implica também o compromisso diário de cada um de nós ter um olhar atento e ativo que nos leva a tratar os outros com aquela misericórdia e bondade com que queremos ser tratados; misericórdia e bondade sobretudo com aqueles que, pela sua condição, rapidamente acabam rejeitados e excluídos".
"Trata-se de uma atitude, não de débeis, mas de fortes, uma atitude de homens e mulheres que descobrem que não é necessário maltratar, denegrir ou esmagar para se sentirem importantes; antes pelo contrário".
O Papa Francisco finalizou sua homilia com uma crítica à corrupção e lembrou que, enquanto em Moçambique muitas pessoas vivem abaixo da linha da pobreza, "por vezes parece que aqueles que se aproximam com o suposto desejo de ajudar, têm outros interesses. E é triste quando isto se verifica entre irmãos da mesma terra, que se deixam corromper; é muito perigoso aceitar que a corrupção seja o preço que temos de pagar pela ajuda externa".
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