Islamabad, Nov 24, 2020 / 10:04 am
O caso da católica Arzoo Raja, menor de idade casada à força com um muçulmano, tomou um novo rumo depois que a Suprema Corte de Sindh, Karachi (Paquistão), sentenciou que permaneça em uma casa de acolhida do governo até que ela decida, em vez de voltar para sua família.
No dia 13 de outubro deste ano, Ali Azhar, um muçulmano de 44 anos vizinho da família Raja, sequestrou Arzoo quando estava a caminho da loja. Nesse mesmo dia, a menina foi forçada a se converter ao islã e se casar e conviver com seu sequestrador.
Em 23 de novembro, o Tribunal Superior de Sindh realizou a última audiência sobre o caso de Arzoo Raja e ordenou que a menina continue morando no "Lar Refúgio Panah", casa de acolhida dos serviços sociais do governo, até que ela decida, em vez de retornar imediatamente para sua família, como se costumava proceder em casos semelhantes no passado, assinalou a agência vaticana Fides.
Com a decisão, o Tribunal separa definitivamente a menina do muçulmano que a sequestrou e, além disso, valida "as denúncias de estupro de menor de 16 anos, crime que pode ser punido com prisão perpétua ou pena de morte", sob o "artigo 375, parágrafo 5 do Código Penal do Paquistão", disse Jibran Nazir, advogado da família Raja.
Nazir explicou que "o Supremo Tribunal de Sindh rejeitou os recursos" documentados interpostos pelo sequestrador, nos quais afirmava que o "casamento era legal", que a guarda da menina pertencia a ele como marido e que todas as acusações contra ele "deveriam ser canceladas".
Assinalou que o Tribunal "não tomou nenhuma decisão a favor do sequestrador" e lembrou que na audiência anterior, em 5 de novembro, o Tribunal manteve em aberto as acusações contra Azhar Ali no First Information Report.
Além de permanecer na casa de acolhida, "o Tribunal ordenou ao Ministério do Interior de Sindh que nomeasse uma pessoa do Departamento de Assistência Social que examinará Arzoo para que receba atenção psicológica e para que retome seus estudos", disse Nazir.
Embora para o advogado a decisão do Tribunal "seja um passo adiante, porque Arzoo está a salvo", a família Raja e a comunidade católica confiam que a menina poderá retornar com a sua família, visto que os advogados irão recorrer ao Tribunal Supremo do Paquistão, instância máxima do país, para obter sua custódia.
"Agora faremos todo o possível e apresentaremos um recurso ao Tribunal Supremo para que a menina volte a morar com seus entes queridos", disse Nasir.
Para o Pe. Saleh Diego, vigário geral e diretor da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Karachi, a comunidade católica esperava que a menina "fosse confiada à família", pois foi assim que procederam em casos anteriores semelhantes.
"O Tribunal deve considerar que é uma menor de idade que sofreu um trauma violento e está sob pressão após seu sequestro, conversão forçada e casamento com o homem que a estuprou", disse. "Seguimos pedindo ao Poder Judiciário que confie a guarda da menina aos pais. Pedimos o pleno respeito aos nossos direitos como cidadãos paquistaneses ", concluiu.
A decisão final do Tribunal de Sindh foi o resultado de uma série de audiências que foram possíveis graças à insistência e exigências da família, com o apoio da Igreja Católica e protestos locais. A princípio, o Tribunal favoreceu o sequestrador em sua sentença, mas posteriormente retificou e solicitou que fosse realizada a investigação correspondente para apurar a verdade.
Em 27 de outubro, o Tribunal Superior de Sindh emitiu uma ordem judicial que respaldava a alegação do sequestrador sem realizar investigações preliminares, apesar do pedido da família Arzoo, e ordenava que a polícia não prendesse Azhar. O sequestrador, com documentos falsos, garantiu que a menina tinha 18 anos e que sua conversão e casamento forçados foram atos livres e voluntários.
Em resposta, o Arcebispo de Karachi, Cardeal Joseph Coutts, o Bispo de Islamabad-Rawalpindi e o presidente da Conferência Episcopal do Paquistão, Dom Joseph Arshad, o Bispo Kaleem John da igreja anglicana do Paquistão e líderes de outras religiões pediram justiça para o caso Arzoo e exigiram medidas severas para evitar que esses ataques contra as minorias religiosas continuem a ocorrer no país.
Além disso, no dia 28 de outubro, Pe. Saleh Diego liderou um protesto a favor da libertação de Arzoo na entrada da Catedral de São Patrício, do qual participaram mais de 300 pessoas, entre cristãos, hindus e muçulmanos, assinalou Fides .
Mais tarde, o Tribunal se retificou, deteve o criminoso e ordenou que Arzoo vivesse temporariamente no centro de acolhida do governo. Em 5 de novembro, ordenou que uma comissão médica determine a real idade da menina e, em 9 de novembro, após a confirmação com o resultado médico e as certidões de nascimento e escolar que Arzoo era menor de idade, declarou a ilegalidade do casamento.
Então, o Tribunal Superior de Sindh classificou o ato como "casamento precoce" e ordenou que Arzoo não voltasse com seu sequestrador nem com sua família, mas sim permanecesse no na casa de acolhida, pois a menina se recusava a voltar para sua casa de origem e pediu para regressar com Azhar.
O advogado Nazir explicou que "a menina continua traumatizada, a forma como foi sequestrada, forçada a se casar e abusada diz que Arzoo sofreu violentos traumas físicos e psicológicos e precisa de tempo para se recuperar".
Além disso, o Tribunal ordenou que a polícia investigue "as pessoas envolvidas neste casamento precoce, em particular aquelas que apresentaram documentos falsos para declarar a menor de idade como tendo 18 anos e aqueles que realizaram concretamente o casamento", disse Nazir.
Explicou que a "Lei de casamento de Sindh de 2013 proíbe o casamento de crianças menores de 18 anos e estabelece uma punição para os envolvidos no casamento infantil, incluindo a pessoa que organiza o casamento e o tutor da criança".
Publicado originalmente em ACI Prensa. Traduzido e adaptado por Natalia Zimbrão.
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