22 de dezembro de 2024 Doar
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Coletiva de imprensa do Papa Francisco no voo de volta do Iraque a Roma

Coletiva de imprensa do Papa Francisco no voo de volta do Iraque a Roma.

Seguindo o costume de seus predecessores de conversar com os jornalistas durante o voo de regresso das viagens internacionais, o Papa Francisco respondeu algumas perguntas dos profissionais de imprensa que o acompanharam a Roma após sua visita ao Iraque.

Abaixo apresentamos o texto na íntegra:

Papa Francisco: "Em primeiro lugar, obrigado pelo trabalho, pela companhia, e pela fadiga de vocês. Hoje é o Dia da Mulher, parabéns às mulheres: a festa da mulher. No encontro com a esposa do Presidente do Iraque, estavam falando sobre o porquê de não haver um dia do homem. Eu disse: por que nós homens estamos sempre em festa! A esposa do Presidente me falou sobre as mulheres, disse coisas bonitas hoje, a força que as mulheres têm para levar a vida adiante, a história, a família, muitas coisas. Parabéns a todos. E terceiro: ontem foi o aniversário da jornalista da ( Rede espanhola) Cope: parabéns e devemos festejá-lo, depois veremos como se pode fazer isso aqui. Muito bem. Agora a palavra é de vocês".

Abdul Karim Atrach - Sky news Arabia: Santidade, há dois anos em Abu Dhabi houve o encontro com o Imã de Al Azhar e a assinatura do Documento sobre a Fraternidade Humana. Três dias atrás o senhor se encontrou com (o aiatolá) Al Sistani. É possível pensar em algo semelhante também com o lado xiita do Islã? E depois uma segunda pergunta sobre o Líbano: São João Paulo II dizia sobre o Líbano que ele é mais do que um país, O Líbano é uma mensagem. Hoje, infelizmente, como libanês, lhe digo que esta mensagem está agora desaparecendo. Pensamos em uma eminente visita sua ao Líbano no futuro?

Papa Francisco: O documento de Abu Dhabi de 4 de fevereiro foi preparado com o Grão-Imã em segredo, durante seis meses: orando, refletindo e corrigindo o texto. Diria que foi um pouco presunçoso, mas o tomem como uma presunção, um primeiro passo disso que você me pergunta. Podemos dizer que este seria o segundo e que haverá outros. O caminho da fraternidade é importante. Depois os dois documentos, o de Abu Dhabi deixou em mim a inquietação da fraternidade, e depois veio a "Fratelli tutti". Ambos os documentos devem ser estudados porque vão na mesma direção, no caminho da fraternidade.

O aiatolá Al Sistani tem uma frase que espero recordar bem: 'Os homens ou são irmãos pela religião ou iguais pela criação'. A fraternidade e a igualdade, mas sob a igualdade não podemos caminhar. Acredito que este é também um caminho cultural. Pensemos em nós cristãos, na Guerra dos Trinta Anos, na Noite de São Bartolomeu, para dar um exemplo, pensemos nisso. Como a mentalidade muda entre nós: porque nossa fé nos faz descobrir que é isso a revelação de Jesus... o amor, a caridade e nos leva a isso, mas quantos séculos para coloca-los em prática! Isto é uma coisa importante: a fraternidade humana, que como homens somos todos irmãos, e devemos seguir adiante com as outras religiões.

O Concílio Vaticano II deu um importante passo nesse sentido com a instituição depois do Conselho para a Unidade dos Cristãos e o Conselho para o Diálogo Inter-religioso. O cardeal Ayuso nos acompanha hoje. Você é humano, é um filho de Deus e é meu irmão, ponto final!

Esta seria a maior indicação, e muitas vezes é preciso arriscar para dar este passo. Você sabe que há algumas críticas: que 'o Papa não é corajoso, é um inconsciente que está dando passos contra a doutrina católica, que está a um passo da heresia', há riscos. Mas estas decisões são sempre tomadas em oração, em diálogo, pedindo conselho, em reflexão. Não são um capricho e também são a linha que o Concílio ensinou, isso sobre a primeira pergunta.

Passo à segunda pergunta: o Líbano é uma mensagem, o Líbano sofre, o Líbano é mais que um equilíbrio. Tem a fraqueza das diversidades, algumas ainda não reconciliadas, mas tem a fortaleza do grande povo reconciliado, como a fortaleza dos cedros.

O Patriarca Rai me pediu por favor, durante esta viagem, para fazer uma parada em Beirute, mas pareceu-me um pouco.... Seria uma migalha em face aos problemas de um país que sofre como o Líbano. Escrevi-lhe uma carta, assumi o compromisso de fazer uma viagem ao Líbano, mas o Líbano, neste momento, está em crise, mas em crise - não quero ofender - em crise de vida. O Líbano é tão generoso no acolhimento dos refugiados. Em relação à viagem isto é tudo.

Johannes Neudecker - DPA: Até que ponto o encontro com Al Sistani foi também uma mensagem para os líderes religiosos do Irã?

Papa Francisco: Creio que tenha sido uma mensagem universal. Senti o dever de fazer esta peregrinação de fé e de penitência, e de ir encontrar um grande, um homem sábio, um homem de Deus: só escutando-o é que se pode perceber isto. Falando em mensagens, diria que é uma mensagem para todos, e ele é uma pessoa que tem essa sabedoria e também essa prudência. Ele me disse: "Há 10 anos -acho que me disse- não recebo pessoas que venham me visitar com outros propósitos políticos ou culturais... apenas religiosos". E ele foi muito respeitoso, muito respeitoso no encontro. Senti-me honrado. Mesmo no momento da saudação, ele jamais se levanta... Ele se levantou para me saudar, duas vezes.

Um homem humilde e sábio, este encontro me fez bem à alma. Ele é uma luz. Estes sábios estão em toda parte porque a sabedoria de Deus foi espalhada pelo mundo inteiro.

A mesma coisa acontece com os santos que não são apenas os que estão nos altares. Acontece todos os dias, aqueles que eu chamo de santos da porta ao lado. Os santos, homens e mulheres que vivem sua fé, seja ela qual for, com coerência. Aqueles que vivem os valores humanos com coerência. A fraternidade com coerência. Acho que devemos descobrir essas pessoas, colocá-las em evidência, porque há tantos exemplos... Quando há escândalos também na Igreja, tantos, e isso não ajuda, mas mostremos os santos da porta ao lado às pessoas que buscam o caminho da fraternidade, e certamente encontraremos pessoas de nossa família, alguma avó, algum avô.

Eva Fernández - Radio COPE: Durante estes dias, sua viagem teve uma enorme repercussão no mundo inteiro, o senhor acha que poderia ser "a viagem" do seu Pontificado? Inclusive foi dito que era a mais arriscada. O senhor teve medo em algum momento de sua viagem? Está prestes a completar o oitavo ano de seu pontificado, o senhor ainda acha que será curto? Por fim, a grande pergunta de sempre: Santo Padre voltará alguma vez à Argentina? A Espanha ainda terá esperança de que o Papa vá algum dia?

Papa Francisco: Começo pela última, que é uma pergunta, e a entendo porque naquele livro do meu amigo jornalista Nelson Castro, um médico, ele tinha feito um livro sobre as doenças dos presidentes e eu lhe disse uma vez: mas se você vem a Roma, deve fazer um sobre as doenças dos Papas, porque será interessante conhecer as doenças dos Papas, pelo menos de alguns dos últimos tempos. Ele começou a fazê-lo. Ele me fez uma entrevista, e o livro saiu: disseram-me que é bom, eu não o li. Ele me fez uma pergunta: "Se o senhor renunciar, voltará para a Argentina ou vai ficar aqui (em Roma)?" Eu disse: não voltarei para a Argentina, mas ficarei aqui na minha diocese. Mas, sob essa hipótese.

A resposta deve estar unida à pergunta. Quando vou à Argentina ou porque não vou, eu respondo sempre um pouco ironicamente: estive 76 anos na Argentina, é suficiente não? Mas, há uma coisa que, não sei por que, não é dita: uma viagem à Argentina foi programada para novembro de 2017. Estava começando a se trabalhar, se faria Chile, Argentina e Uruguai. Era para o final de novembro, mas naquela época, o Chile estava em campanha eleitoral, naqueles dias, em dezembro, foi eleito o sucessor de Michelle Bachelet, e eu deveria ir antes que mudasse o governo. Eu não podia ir. Tínhamos pensado em fazer isso: vamos ao Chile em janeiro e depois à Argentina e ao Uruguai... Mas não era possível, porque janeiro é como julho-agosto europeu para os dois países.

Pensando nisso novamente, foi feita a sugestão: por que não associar o Peru? Porque o Peru havia sido deixado de lado na viagem ao Equador, Bolívia, Paraguai. Tinha sido deixado à parte. E dali nasceu a viagem em janeiro de 2018 ao Chile e ao Peru. Mas quero dizer isto para que não haja fantasias de "patriafobia": quando houver oportunidade, isto pode ser feito, porque está a Argentina, o Uruguai e o sul do Brasil, que são um complexo cultural bastante grande.

Depois, sobre as viagens. Eu, para tomar uma decisão sobre as viagens, escuto. Os convites são muitos e escuto o conselho dos assessores e às vezes alguém vem e diz: o que acha a esse propósito, devo ir até aquele lugar? É bom para mim ouvir, isto me ajuda a tomar decisões mais tarde. Escuto os conselheiros e, no final, rezo, reflito muito, sobre algumas viagens, reflito muito. Depois a decisão vem de dentro, quase espontaneamente, mas como fruto maduro. É um longo caminho. Alguns são mais difíceis, outros mais fáceis.

A decisão sobre esta viagem vem de antes, daquele primeiro convite da embaixadora, uma pediatra que foi embaixadora do Iraque, insistiu. Depois, veio a embaixadora junto à Itália que é uma mulher de luta. Depois veio o novo embaixador junto ao Vaticano, e lutou. Antes disso, tinha vindo o presidente. Todas essas coisas ficaram comigo.

Mas há algo por trás da decisão que eu gostaria de mencionar: uma de vocês me deu a última edição espanhola do livro "A última garota" de Nadia Mourad. Eu li em italiano e depois entreguei a Elisabetta Piqué para que o lesse. Leu? Mais ou menos. É a história dos Yazidis. E Nadia Mourad conta coisas espantosas, espantosas. Eu os aconselho a ler, em alguns pontos como é biográfico pode parecer pesado, mas para mim esta é a razão básica da minha decisão. Esse livro trabalhou-me por dentro. Primeiro quando escutei Nadia que veio me contar coisas terríveis, depois com o livro. Todas essas coisas juntas levaram à decisão, pensando em todos, em todos os problemas, muitos. Mas no final a decisão veio e eu a tomei.

Em seguida, sobre o oitavo ano do pontificado. Devo fazer desta maneira? -o Papa cruza os dedos-. Não sei se as viagens se tornarão realidade ou não, só confesso que nesta viagem fiquei muito mais cansado do que nas outras. Os 84 [anos de idade] não vêm sozinhos, têm uma consequência... mas veremos.

Agora devo ir à Hungria para a Missa final do Congresso Eucarístico Internacional, não para uma visita ao país, mas somente para a Missa. Mas, Budapeste fica a duas horas de carro de Bratislava, por que não fazer uma visita aos eslovacos? É assim que as coisas saem...

Chico Harlan - Washington Post: Pessoas sem vacinar estiveram cantando juntas. O senhor fica preocupado que possam adoecer e morrer por querer vê-lo? Pode explicar esta reflexão e este cálculo?

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Papa Francisco: Como eu disse recentemente, com o tempo as viagens "ficam cozinhando" na minha consciência, e esta é uma das coisas que me faziam [dizer]: Talvez, talvez. Pensei muito, rezei muito sobre isso e finalmente tomei a decisão que realmente veio de dentro. E eu disse: Aquele que me leva a decidir assim, que cuide das pessoas. Mas isto depois da oração e da consciência dos riscos. Depois de tudo isso.

DesantPierre - KTO: Santidade, vimos a coragem, o dinamismo dos cristãos iraquianos, vimos também os desafios que enfrentam, a ameaça da violência islamista, o êxodo e o testemunho de fé no seu ambiente. Estes são os desafios dos cristãos em toda a região. Falamos do Líbano, mas também da Síria, e da Terra Santa. Há dez anos, foi realizado um Sínodo para o Oriente Médio, mas seu desenvolvimento foi interrompido pelo ataque à Catedral de Bagdá. O senhor está pensando em fazer algo para todo o Oriente Médio, um sínodo regional ou qualquer outra iniciativa?

Papa Francisco: Não estou pensando em um Sínodo. Iniciativas, sim, estou aberto a muitas iniciativas. Mas não me ocorreu uma. Você acaba de lançar a primeira semente. Vamos ver o que vai acontecer. A vida dos cristãos no Iraque é uma vida dura, mas não só a dos cristãos. Falamos [nestes dias] com yazidis e [com membros] de outras religiões que não se submeteram ao poder do Daesh [Estado Islâmico]. E isto, não sei porque, deu-me uma força muito grande, mas há o problema que você diz da migração. Ontem, quando estávamos voltando de carro de Qaraqosh para Erbil, vi muita gente, jovens, a faixa etária é muito baixa. Muita gente jovem. E a pergunta que alguém me fez é a pergunta destes jovens: Qual será o futuro deles? Para onde eles irão? Muitos terão que deixar o país, muitos. Antes de sair de viagem, no dia seguinte, doze refugiados iraquianos vieram se despedir de mim. Um deles tinha uma prótese na perna porque tinha escapado debaixo de um caminhão e sofreu um acidente, muitos escaparam.

A migração é um direito duplo: está o direito de não migrar e o direito de migrar. Mas, estas pessoas não têm nenhum dos dois, porque não podem não migrar, não sabem como fazê-lo. E não podem migrar porque o mundo ainda não se deu conta de que a migração é um direito humano. Da outra vez, um sociólogo italiano me disse, falando da queda demográfica na Itália: dentro de quarenta anos teremos que "importar" estrangeiros para trabalhar e pagar impostos para nossas pensões. Vocês franceses foram mais espertos, avançaram dez anos com a lei em prol da família, o seu nível de crescimento é muito grande. Mas a migração é vivida como uma invasão. Ontem eu quis receber após a missa, porque ele pediu, o pai de Alan Kurdi, esta criança que é um símbolo, Alan Kurdi é um símbolo: por isso eu dei a escultura para a FAO. É um símbolo que vai além de uma criança que morreu na migração, um símbolo de civilizações que morrem que não podem sobreviver, um símbolo de humanidade. São necessárias medidas urgentes para que as pessoas tenham trabalho em seus próprios países e não tenham que migrar. E também medidas para proteger o direito de migrar.

É verdade que cada país deve estudar bem a capacidade de receber porque não é apenas a capacidade de recebê-los e deixá-los na praia. Trata-se de recebê-los, acompanhá-los, fazê-los progredir e que se integrem. A integração do migrante é a chave.

Dois casos: em Zaventem, na Bélgica, os terroristas eram belgas. Nascidos na Bélgica, mas migrantes islâmicos fechados em guetos, não integrados. O outro exemplo, quando fui à Suécia, a ministra que participou da minha despedida era muito jovem e tinha uma fisionomia peculiar, não típica dos suecos. Era filha de um migrante e de uma sueca, estava tão integrada que se tornou ministra... Pensemos nestes dois casos, nos farão pensar muito: integrar. Sobre as migrações, que eu acho que é o drama da região. Gostaria de agradecer aos países generosos que recebem migrantes: o Líbano que tem, creio, dois milhões de sírios; a Jordânia - infelizmente não sobrevoaremos o país, o rei queria nos homenagear com aviões quando passássemos - foi muito generosa de sua parte: ali há mais de um milhão e meio de migrantes. Agradeço a esses países generosos! Muito obrigado!

Stefania Falasca, Avvenire: Bom dia Santo Padre. Em três dias, neste país-chave do Oriente Médio, o senhor fez o que os poderosos da Terra vêm discutindo há trinta anos. O senhor já explicou qual é o interesse original de suas viagens, como surgem as escolhas de suas viagens, mas agora nesta contingência, olhando para o Oriente Médio, pode ser colocada em conta uma viagem à Síria? Quais poderiam ser os objetivos daqui a um ano de outros lugares onde sua presença é solicitada?

Papa Francisco: Obrigado. No Oriente Médio, a única hipótese, e também a promessa, é o Líbano. Não pensei em uma viagem à Síria, e não o pensei porque não tive esta inspiração, mas estou muito próximo da martirizada e amada Síria, como eu a chamo. Lembro-me, no início do pontificado, naquela tarde de oração na Praça de São Pedro, havia o terço, adoração do Santíssimo. Mas quantos muçulmanos com tapetes no chão estavam rezando conosco. Todos pela paz na Síria, para parar o bombardeio, no momento em que foi dito que haveria um bombardeio feroz. Levo a Síria no meu coração. Mas pensar em uma viagem, ainda não me veio à mente neste momento. Obrigado".

Sylvia Wysocka, imprensa polonesa: Santidade, nestes doze meses muito difíceis a sua atividade também esteve muito limitada. Ontem o senhor teve o primeiro contato direto muito próximo com as pessoas em Qaraqosh: o que o senhor sentiu? Em sua opinião, agora com todo o atual regime de saúde, poderão ser retomadas as audiências gerais com a presença das pessoas, com os fiéis, como antes?

Papa Francisco: Eu me sinto diferente quando estou longe das pessoas nas audiências. Gostaria de recomeçar as audiências gerais o mais rápido possível. Esperamos que existam condições. Nisto eu sigo as normas das autoridades, eles são os responsáveis e têm a graça de Deus para nos ajudar nisto. Eles são responsáveis por dar as normas. Quer queiramos ou não. Os responsáveis são eles e têm que fazer isso. Agora comecei novamente com o Ângelus na praça, com distanciamento é possível fazê-lo.

Há a proposta de pequenas audiências gerais, mas ainda não decidi porque o desenvolvimento da situação não estava claro. Depois destes meses de "prisão", eu realmente me sentia um pouco aprisionado, esta viagem para mim foi um reviver. Reviver porque é tocar a Igreja, tocar o povo santo de Deus, tocar todos os povos. Um padre torna-se padre para servir, a serviço do povo de Deus, não para fazer carreira, não por dinheiro.

Esta manhã, na Missa, havia a leitura bíblica sobre a cura de Naamã, o sírio, e dizia que este Naamã queria dar presentes depois de ter obtido a cura. Mas o profeta Eliseu os recusou. A Bíblia continua: o assistente do profeta Eliseu, quando eles partiram, acomodou bem o profeta e apressadamente seguiu Naamã e pediu os presentes para ele. E Deus disse: "a lepra que Naamã tinha será para ti".

Temo que nós, homens e mulheres da Igreja, especialmente nós sacerdotes, não tenhamos essa proximidade gratuita com o povo de Deus que é quem nos salva. E fazer como o servo de Naamã: sim, ajudar, mas depois ir atrás para os presentes. Dessa lepra eu tenho medo. E o único que nos salva da lepra da ganância, do orgulho, é o povo santo de Deus. Aquele sobre o qual Deus falou a Davi: "Eu te tirei do rebanho, não te esqueças do rebanho". Aquilo que Paulo falou a Timóteo: "Lembra-te de tua mãe e de tua avó que te amamentaram na fé".

Não perder a pertença ao povo de Deus para se tornar uma casta privilegiada de consagrados, clérigos, ou que quer que seja. O contato com as pessoas nos salva, nos ajuda, nós damos a Eucaristia, a pregação, cumprimos nossa função. Mas elas nos dão a pertença. Não esqueçamos essa pertença ao povo de Deus.

Depois, você começava assim, o que eu encontrei no Iraque, em Qaraqosh? Eu não imaginava a ruínas de Mossul e Qaraqosh, não imaginava realmente... Sim, posso ter visto coisas, eu li livros, mas isso toca, é comovente.

Depois, o que mais me tocou foi o testemunho de uma mãe em Qaraqosh. Deu o seu testemunho um padre que realmente conhece a pobreza, o serviço, a penitência, e uma mulher que perdeu seu filho nos primeiros bombardeios do Daesh. Ela disse uma palavra: perdão. Eu fiquei comovido. Uma mãe que diz: eu perdoo, eu peço perdão por eles. Veio-me a memória a minha viagem à Colômbia, o encontro em Villavicencio onde tantas pessoas, sobretudo mulheres, mães e esposas, falaram de sua experiência com o assassinato de seus filhos e maridos. Elas disseram: "Eu perdoo, eu perdoo". Perdemos esta palavra, sabemos muito bem como insultar, sabemos muito bem como condenar, eu por primeiro. Mas perdoar... perdoar nossos inimigos, isto é puro Evangelho. Isto é o que mais me impressionou em Qaraqosh.

Papa Francisco: Estamos falando há quase uma hora e eu continuo, mas com esforço... façamos a última antes de festejar o aniversário.  

Catherine Marciano - AFP: Santidade, eu queria saber o que o senhor sentiu vendo do helicóptero a cidade destruída de Mossul e depois rezando nas ruínas de uma igreja. Se me permite, já que é Dia da Mulher, gostaria de fazer uma pequena pergunta também sobre as mulheres. O senhor apoiou as mulheres em Qaraqosh com palavras muito bonitas, mas o que o senhor acha do fato de que uma mulher muçulmana apaixonada não pode se casar com um cristão sem ser descartada pela sua família ou algo pior? A primeira pergunta era sobre Mossul, obrigado Santidade.

Papa Francisco: "De Mosul eu disse um pouco "en passant" o que eu senti. Quando estive diante da igreja destruída, não tive palavras. Inacreditável, inacreditável... Não apenas aquela igreja, mas também outras igrejas, também uma mesquita destruída. Pode-se dizer que não estavam de acordo com essas pessoas. Inacreditável a nossa crueldade humana. Neste momento, não quero dizer a palavra "recomeçar", mas olhemos para a África. E com a nossa experiência de Mossul, essas igrejas destruídas e tudo mais, cria-se inimizade, a guerra e também recomeça a agir o chamado Estado islâmico. Isto é ruim, muito ruim.

E, antes de passar à outra pergunta, uma pergunta que me veio à mente na igreja foi esta: mas quem vende as armas para esses destruidores? Porque as armas eles não fabricam. Sim, eles produzem algumas armas... Mas quem vende as armas? Quem é o responsável? Ao menos eu pediria àqueles que vendem as armas a sinceridade de dizer: nós vendemos as armas. Eles não dizem isso. É horrível.

Agora as mulheres. As mulheres são mais corajosas do que os homens, mas isso sempre foi assim. Mas a mulher ainda hoje é humilhada, vamos a esse extremo. Não sei quem, uma de vocês me mostrou, não sei se foi você Eva, a lista de preços das mulheres (preparada pelo Isis que comprava as mulheres cristãs e yazidis). Não podia acreditar... se a mulher possuía tais características então custava tanto. As mulheres são vendidas, as mulheres são escravizadas.

Também no centro de Roma, o trabalho contra o tráfico de seres humanos é um trabalho cotidiano. Durante o Jubileu, fui visitar uma das muitas casas da Obra Don Benzi. Garotas resgatadas, uma com a orelha cortada porque não tinha trazido dinheiro naquele dia, a outra trazida de Bratislava no porta mala do carro, escrava, sequestrada. Isso acontece entre nós! O tráfico de pessoas.

Nesses países, especialmente na parte da África, há a mutilação com um ritual que deve ser feito. Mas as mulheres ainda são escravas e devemos lutar, lutar, pela dignidade da mulher. São elas que continuam a história, isto não é um exagero, as mulheres continuam a história e isto não é um elogio porque hoje é o dia da mulher.

Também a escravidão é assim, a rejeição à mulher... Pensar que em um lugar houve uma discussão se o repúdio à esposa deveria ser dado por escrito ou apenas oralmente. Nem mesmo o direito de ter o ato de repúdio! Mas isto está acontecendo hoje.

Mas, para não nos distanciarmos, pensemos no centro de Roma, nas jovens que são sequestradas e exploradas. Acho que já disse tudo sobre este assunto. Desejo-lhes um bom fim de viagem e peço-lhes que rezem por mim, pois o necessito".

Ao chegar a Roma, o Santo Padre foi à Basílica de Santa Maria Maior levar um buquê de flores e agradecer à Virgem, invocada com o nome de Salus Populi Romani, pela sua 33ª viagem internacional.

O Papa Francisco se converteu assim no primeiro Papa a visitar o Iraque.

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