22 de novembro de 2024 Doar
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Papa Francisco autorizou usar 1 milhão de euros para libertar religiosa, diz cardeal Becciu

Papa Francisco abençoa a irmã Gloria Cecilia Narváez em 10 de outubro de 2021 no Vaticano. Crédito: Vatican Media.

O cardeal Angelo Becciu disse ontem (5) que o papa Francisco autorizou o gasto de um milhão de euros para conseguir a libertação da irmã Gloria Narváez, freira colombiana que havia sido sequestrada no Mali por terroristas muçulmanos ligados à Al Qaeda.

Segundo a agência Associated Press (AP), o cardeal fez esta declaração durante a audiência de quinta-feira, no julgamento por supostos crimes financeiros que teriam sido cometidos enquanto ele era substituto da Secretaria de Estado da Santa Sé, entre maio de 2011 e junho de 2018.

Irmã Narváez foi sequestrada em 7 de fevereiro de 2017 pela Frente de Apoio ao Islã e aos Muçulmanos (SGIM) e libertada em 9 de outubro de 2021. A freira colombiana pertence às irmãs Franciscanas de Maria Imaculada.

O cardeal está sendo julgado com outros funcionários e colaboradores do Vaticano, entre os quais a italiana Cecilia Marogna, acusada de desviar fundos da Secretaria de Estado por supostamente receber centenas de milhares de euros do Vaticano e ter gasto o dinheiro destinado à caridade em artigos de luxo e férias, o que ela nega.

O cardeal foi interrogado ontem depois que o papa Francisco o liberou em março da obrigação do segredo pontifício, uma regra de confidencialidade que protege informações confidenciais sobre o governo da Igreja universal. Ele havia invocado o segredo pontifício para argumentar que não poderia discutir seus negócios com Cecilia Marogna, uma autodenominada "consultora de segurança" acusada de desviar fundos da Secretaria de Estado.

Segundo a Associated Press, em seu depoimento de duas horas e meia, Becciu disse que Morogna fez parte da operação para conseguir a libertação de irmã Gloria Narváez.

O cardeal Becciu disse que a contratou como consultora de segurança externa, impressionado com sua compreensão dos assuntos geopolíticos e a confiança que tinha em dois altos funcionários do serviço secreto italiano, os generais Luciano Carta e Gianni Caravelli, que a acompanharam a uma reunião com o cardeal no Vaticano em outubro de 2017.

Além disso, informou que recebeu pedidos de ajuda do núncio na Colômbia e das freiras para resgatar a irmã Glória. Segundo o cardeal, ele levou o assunto ao papa Francisco e a Marogna. Ele disse que a italiana se ofereceu para trabalhar com a empresa de inteligência britânica The Inkerman Group para garantir a libertação.

Em seu depoimento, o cardeal disse que o papa o autorizou a continuar com a operação, mas o proibiu de contar a qualquer pessoa, inclusive ao chefe de polícia do Vaticano. Segundo a AP, em seu comunicado, o cardeal Becciu disse que Francisco estava preocupado com as implicações de segurança e reputação se a notícia vazasse.

Becciu disse que depois participou com Marogna de uma reunião com membros do Inkerman, em Londres, em janeiro de 2018, onde foram informados de que não havia garantias de sucesso e o custo total poderia chegar a um milhão de euros. Como o Vaticano queria ficar à margem, a italiana se tornou a principal intermediária e recebeu pagamentos periódicos da Secretaria de Estado pela operação, disse o cardeal.

Em sua declaração ao tribunal, Becciu disse que, em 15 de janeiro de 2018, forneceu a Francisco uma leitura oral preliminar da reunião de Londres, enquanto o papa estava a caminho do Peru para uma visita apostólica.

"Ele me ouviu e confirmou minha intenção de prosseguir", disse o cardeal. Acrescentou que "num encontro posterior com o papa, uma vez em Roma, falei mais detalhadamente sobre a conversa que tivemos com Inkerman e sobre a quantia que deveríamos ter estimado aproximadamente: cerca de um milhão de euros, parte para pagar a criação de uma rede de contatos, e parte para a efetiva libertação da religiosa".

"Ressaltei que não deveríamos ter ido além desse número. Ele aprovou. Devo dizer que cada passo desta operação foi feito em acordo com o Santo Padre", disse o ex-prefeito da Congregação para as Causas dos Santos.

O julgamento contra o cardeal Becciu

O cardeal Becciu, que em setembro de 2020 renunciou a seus direitos como membro do Colégio dos Cardeais e à Congregação para as Causas dos Santos, também está sendo julgado pelos investimentos financeiros feitos pela Secretaria de Estado enquanto era o substituto, o segundo cargo mais importante deste importante departamento vaticano.

No julgamento, a Secretaria de Estado é um dos quatro demandantes civis contra o cardeal e outros funcionários e colaboradores do Vaticano.

Os outros demandantes são a Administração do Patrimônio da Sé Apostólica (APSA), o Instituto de Obras de Religião (IOR) – conhecido como Banco do Vaticano – e a Autoridade de Supervisão Financeira e Informação da Santa Sé (ASIF).

Na audiência de ontem, o advogado de monsenhor Alberto Perlasca, ex-chefe de administração da Secretaria de Estado e que passou de suspeito a testemunha chave de acusação, disse que seu cliente também deveria receber uma indenização por danos e prejuízos como demandante civil.

Por sua parte, em uma declaração de 50 páginas, o cardeal Becciu argumentou sua inocência contra acusações de peculato, abuso de autoridade e manipulação de testemunhas.

O cardeal de 73 anos, que desde o início do julgamento reiterou que é inocente, respondeu às acusações e deu detalhes de seu cargo como substituto da Secretaria de Estado. Ele disse que este cargo dependia de sua total confiança em seus colaboradores e ao mesmo tempo total autonomia.

A declaração foi seguida por várias horas de intenso e acalorado interrogatório, durante o qual o cardeal Becciu respondeu aos pedidos de um promotor para obter mais informações sobre os investimentos feitos pela Secretaria de Estado, incluindo a compra de um imóvel em Londres.

Respondendo a perguntas, Becciu negou que a Secretaria tenha usado dinheiro do Óbolo de São Pedro, o fundo de caridade do papa, para investir no prédio de Londres.

Becciu foi questionado se o papa Francisco estava informado dos investimentos da Secretaria de Estado. Ele respondeu que apresentava relatórios ocasionais ao papa, mas que não havia autorizações específicas.

Depois acrescentou que ele é "da velha escola: In odiosis non feci nomen pontifici". Explicou que a frase latina significa que "tenta-se preservar a autoridade moral do papa sem envolvê-lo nas coisas terrenas. Isso não significa não o informar, mas não dar a ele a responsabilidade".

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Durante o interrogatório de ontem, o presidente da Corte, Giuseppe Pignatone, não permitiu algumas perguntas do promotor. A certa altura, o juiz também deu um intervalo de cinco minutos para o advogado e o réu se acalmarem. A próxima audiência será no dia 18 de maio.

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