Ortega "está em guerra" contra a liberdade religiosa na Nicarágua, diz congressista dos EUA

Daniel-Ortega-guerra-libertad-religiosa-Nicaragua-Flickr-Cancilleria-Ecuador-23032023.jpg Daniel Ortega | Flickr Ministério das Relações Exteriores do Equador (CC BY-SA 2.0)

Um congressista dos EUA denunciou que o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, está em guerra contra a liberdade religiosa e por isso tem como alvo a Igreja Católica.

"Ortega está travando uma guerra contra a liberdade religiosa e tem como alvo a Igreja Católica como a mais importante instituição independente remanescente na Nicarágua", alertou o deputado republicano de Nova Jersey, Christopher H. Smith, durante uma audiência no Congresso dos EUA na quarta-feira (22).

A audiência pública teve como título "A guerra do regime de Ortega-Murillo contra a Igreja Católica e a sociedade civil na Nicarágua: Dom Álvarez, os presos políticos e os presos de consciência".

Rosario Murillo é a vice-presidente do país e mulher do presidente Daniel Ortega, no poder desde 2007 e reeleito duas vezes em eleições questionadas pela oposição, a Igreja na Nicarágua e a comunidade internacional.

Em seu discurso, Smith exortou o governo dos EUA a "trabalhar para garantir que o presidente Ortega e seus cúmplices sejam responsabilizados por seus crimes hediondos".

"A extrema repressão que o regime de Ortega-Murillo está praticando contra o povo da Nicarágua merece uma atenção ainda maior dos EUA e de nossos aliados", disse.

"Sob a presidência de Daniel Ortega, a Nicarágua se tornou uma ditadura pária, aliada a outros violadores dos direitos humanos, como Cuba, Venezuela, Rússia, Irã, Coreia do Norte e República Popular da China", denunciou Smith.

A audiência sobre a Nicarágua, organizada pela Subcomissão Conjunta de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes, aconteceu um dia depois de o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, John Kirby, ter admitido em entrevista coletiva que "não estava acompanhando" a grave situação do bispo Rolando Álvarez.

Dom Álvarez, bispo de Matagalpa, foi condenado no dia 10 de fevereiro a 26 anos e 4 meses de prisão, acusado de ser um "traidor da pátria".

Álvarez se recusou a ser deportado junto com outros 222 presos políticos para os EUA, preferindo ficar com outros 37 presos que estão nas prisões da Nicarágua. No entanto, não está claro qual é o seu paradeiro exato e as autoridades ainda não informaram sobre sua situação atual.

Dom Rolando Álvarez e a perseguição religiosa

Christopher Smith disse que "o bispo Álvarez se tornou um símbolo da luta do povo nicaraguense pela liberdade, mas em troca de sua coragem foi injustamente condenado a 26 anos em uma das prisões mais brutais da América Latina, La Modelo".

O centro penitenciário Jorge Navarro ou prisão "La Modelo" tem sido destino frequente de presos políticos na Nicarágua, lugar onde sofreram uma série de violações de direitos humanos.

Em outubro de 2022, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) descreveu algumas violações mais comuns cometidas neste presídio, como a superlotação das celas, a falta de atendimento médico, as agressões de agentes penitenciários contra os presos, a retenção de familiares que visitam e a ingestão de alimentos misturados com detergente.

"Continuaremos defendendo a libertação incondicional de dom Álvarez e dos outros presos políticos e de consciência que permanecem na Nicarágua", disse Smith.

Félix Maradiaga, ex-preso político e ex-candidato presidencial na Nicarágua, deu o seu testemunho na audiência.

Maradiaga lamentou que "a nova face da repressão de Ortega se concentrou na perseguição à Igreja Católica. Deve ser dito claramente: hoje na Nicarágua há uma perseguição religiosa".

Além da prisão de dom Rolando Álvarez, o governo de Ortega fechou recentemente a Universidade Católica João Paulo II. Em 2022, expulsou do país 22 freiras Missionárias da Caridade e o núncio apostólico.

Ortega encarna "um legado de opressão"

O ex-preso político descreveu posteriormente que, há alguns anos, "Ortega é um claro perigo para o povo da Nicarágua, mas também para o hemisfério. Ortega é uma relíquia da Guerra Fria e personifica um legado de opressão contra a dignidade humana".

O ex-preso político lembrou que esteve 611 dias detido na prisão de tortura conhecida como "El Chipote", onde "em algum momento inclusive me colocaram numa cela de castigo simplesmente por minha decisão de jejuar e rezar em voz alta".

"El Chipote" é a principal prisão para onde o governo envia seus opositores, incluindo vários padres católicos. Segundo alguns, a prisão e as suas condições estão feitas para que os presos e suas famílias entrem em colapso.

"Eu não tinha permissão para ler ou escrever. Nem mesmo uma Bíblia, que é, insisti, fundamental para minha fé católica. Quase 4 anos se passaram desde meu testemunho anterior aqui e também no Conselho de Segurança das Nações Unidas. E apesar de todos os esforços da comunidade internacional, a ditadura de Ortega só se tornou mais implacável", lamentou.

Maradiaga também disse que Ortega "não teve nenhum escrúpulo em expressar seu ódio aos EUA. É hora de passar para um novo estado de maior pressão, onde se utilizam todas as ferramentas da diplomacia, inclusive o fechamento dos canais de financiamento direto à ditadura".

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"Mais sanções são necessárias"

Félix Maradiaga também disse que "as ditaduras não se desfazem com métodos tímidos. Há pessoas na Nicarágua dispostas a lutar pacificamente pela liberdade, mas não podemos fazer isso sozinhos".

Juan Sebastián Chamorro, ex-candidato presidencial que foi preso em sua casa na frente de sua esposa e filha, falou a importância de "manter a pressão contra os responsáveis ​​por crimes, mortes e abusos".

"Desta cidade brilha a luz da liberdade, iluminando milhões de pessoas em todo o mundo que continuam sofrendo as cadeias da injustiça", disse ele durante a audiência de quarta-feira (22).

A defensora dos direitos humanos Bianca Jagger pediu a libertação de dom Rolando Álvarez e advertiu que "não devemos nos deixar enganar pela suposta 'libertação' dos presos políticos, apesar de ser a primeira boa notícia que tivemos em muito tempo".

"São necessárias mais sanções. Não é hora de fazer concessões", acrescentou.

A audiência de quarta-feira aconteceu dias depois que, a pedido do governo de Ortega, o último funcionário da nunciatura apostólica, a embaixada da Santa Sé, deixou a Nicarágua, o que pode ser seguido pela ruptura formal das relações diplomáticas entre o país centro-americano e a Santa Sé.

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