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Cardeal Zen expressa preocupação com Sínodo da Sinodalidade em carta vazada

O cardeal Joseph Zen prega durante uma missa na Igreja da Santa Cruz em Hong Kong, China, na China, em 24 de maio de 2022. | Anthony Kwan/Getty Images

Uma carta do cardeal Joseph Zen Ze-kiun, S.D.B., bispo emérito de Hong Kong, foi vazada para a mídia poucos dias antes do Sínodo da Sinodalidade começar a sua primeira sessão de reuniões no Vaticano. A carta expressa sérias preocupações aos cardeais e bispos de todo o mundo sobre a reunião em Roma e defende mudanças no processo sinodal, bem como discussões vigorosas sobre os temas do encontro.

A carta, cuja cópia foi obtida por CNA, agência em inglês do grupo EWTN, ao qual pertence ACI Digital, tem a data de 21 de setembro, festa do apóstolo são Mateus, e acusa os organizadores do Sínodo de manipulação e de buscar uma agenda, em vez de permitir um discurso eclesiástico autêntico. A notícia da existência da carta foi publicada hoje (4) pelo site The Pillar.

O enquadramento da sinodalidade

O cardeal Zen examina o enquadramento teológico da sinodalidade recorrendo a um documento recente da comissão Teológica Internacional, “Sinodalidade na vida e missão da Igreja”, destacando que a sinodalidade, na sua essência, refere-se à “comunhão e participação de todos os membros da Igreja na missão de evangelização”.

O cardeal manifesta reservas sobre a escassa referência a este documento crítico aprovado pela Santa Sé nos materiais preparatórios para o sínodo, implicando um desvio potencial dos princípios eclesiásticos fundamentais.

Um desses princípios é “o ministério colegial dos bispos”, escreve Zen, que se baseia nos fundamentos teológicos do Concílio Vaticano II.

“Fico confuso porque, por um lado, me dizem que a sinodalidade é um elemento constitutivo da Igreja, mas, por outro lado, me dizem que é isso que Deus espera de nós para este século (como uma novidade?)”, continua.

O cardeal, que co-assinou as dubia antes do Sínodo, acrescenta: “Como pode Deus ter se esquecido de fazer com que a sua Igreja viva este elemento constitutivo nos 20 séculos da sua existência?”.

O cardeal Zen partilha “ainda maior confusão e preocupação” sobre “a sugestão feita de que finalmente chegou o dia de derrubar a pirâmide, isto é, a hierarquia superada pelos leigos”.

O papa Francisco usou a imagem de uma pirâmide invertida num grande discurso em 2015, ao celebrar o 50º aniversário da instituição do Sínodo dos Bispos. Descrevendo o papel do apóstolo Pedro como a “rocha” sobre a qual a Igreja está fundada, o papa disse: “Mas nesta Igreja, como numa pirâmide invertida, o topo está localizado abaixo da base”.

Com base nisso, um participante do Sínodo sobre Sinodalidade, o padre Ormond Rush, defendeu mudanças na eclesiologia e na organização da Igreja.

A lição do Caminho Sinodal Alemão

No centro da crítica do cardeal está o caminho sinodal alemão, cujos participantes votaram a favor de documentos que apelam à ordenação sacerdotal de mulheres, bênçãos para pessoas do mesmo sexo e mudanças no ensinamento da Igreja sobre atos homossexuais, provocando acusações de heresia e receios de cisma.

As preocupações foram levantadas publicamente pelo papa Francisco, bem como pelos líderes da Igreja da Polônia, dos países nórdicos e de todo o mundo.

Os organizadores alemães rejeitaram todas as intervenções, pressionando em vez disso a instalação de um conselho sinodal alemão permanente para supervisionar a Igreja na Alemanha e implementar mudanças controversas.

No entanto, o cardeal Zen observa que o papa “nunca ordenou que este processo na Alemanha” tivesse que parar, e que o seu discurso aos bispos alemães durante a sua visita ad limina de 2022 – normalmente publicado no jornal do Vaticano L’Osservatore Romano – permaneceu secreto.

Em vez disso, os bispos alemães anunciaram em março que estavam a avançar com os seus planos.

Tendo em conta os desenvolvimentos cuidadosamente planejados e executados na Alemanha, a carta do cardeal Zen alerta para as tentativas de afastamento da ordem eclesiástica tradicional, sugerindo que qualquer aparente reorientação democrática está associada a propostas de mudanças revolucionárias na constituição da Igreja e nos ensinamentos morais sobre a sexualidade.

Zen também observa o declínio vertiginoso no número de fiéis católicos na Alemanha desde o início do caminho sinodal, afirmando: “A Igreja na Alemanha está morrendo”. Ele compara este colapso ao declínio do catolicismo na Holanda.

Evitando conflitos anglicanos

“Acho que não é fora de lugar mencionar aqui o grande cisma que ameaça a Comunhão Anglicana”, escreve Zen ao traçar outro paralelo.

A Comunhão Anglicana é uma irmandade mundial de 85 milhões de cristãos, unidos por laços históricos com a Igreja Anglicana – e que atualmente enfrentam profundas divisões internas sobre questões como o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a ordenação de pessoas que se identificam como LGBTQ+ ao clero.

O cardeal Zen observa que isto levou alguns anglicanos a exortar seu chefe, o arcebispo anglicano de Canterbury, ao arrependimento . Caso contrário, “não aceitarão mais a sua liderança”, acrescenta a carta.

Zen se refere ao desenvolvimento anglicano como um lembrete claro dos caminhos de divisão que a Igreja Católica poderia trilhar se fosse desviada por interpretações erradas – ou pior, pela manipulação – da sinodalidade na prossecução de uma agenda questionável.

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Uma agenda e conclusões precipitadas?

Neste contexto, a carta do cardeal acusa o secretariado do Sínodo – escritório da Santa Sé responsável pela organização do Sínodo da Sinodalidade – de conduta questionável.

“O Secretariado do Sínodo é muito eficiente na arte da manipulação”, escreve Zen, acrescentando: “Muitas vezes afirmam não ter qualquer agenda. Isto é verdadeiramente uma ofensa à nossa inteligência. Qualquer um pode ver a quais conclusões se pretende chegar”.

Zen se baseia em exemplos bíblicos para destacar que a mudança deve refletir um esquema divino mais amplo, em vez de alterações arbitrárias. Ele enfatiza um desenvolvimento contínuo e harmonioso da doutrina, na linha de são John Henry Newman, em vez de qualquer mudança insidiosa na narrativa, particularmente na moralidade sexual.

Zen escreve que os organizadores, embora enfatizem a necessidade de “ouvir todos”, concentram-se num grupo em particular: “Aos poucos eles nos fazem compreender que entre estes 'todos' há especialmente aqueles que 'excluímos'. Finalmente, entendemos que o que querem dizer são pessoas que optam por uma moral sexual diferente daquela da tradição católica”.

Um Sínodo radicalmente mudado

Sobre a decisão de acrescentar participantes leigos selecionados com direito a voto, o cardeal escreve: “Se eu fosse um dos membros do Sínodo, faria um forte protesto, porque esta decisão muda radicalmente a natureza do Sínodo, que o papa são Paulo VI pretendia ser um instrumento de colegialidade episcopal, mesmo que, no espírito da sinodalidade, os observadores leigos fossem admitidos com a possibilidade de falar”.

“Dar o voto aos leigos pode parecer significar que se demonstra respeito pelo sensus fidelium, mas terão eles a certeza de que estes leigos que foram convidados são fideles? Que esses leigos pelo menos ainda vão à igreja? Na verdade, estes leigos não foram eleitos pelo povo cristão”, escreve Zen.

O cardeal assegura aos cardeais e bispos: “Não proponho um protesto, mas pelo menos um doce lamento com um pedido: que pelo menos os votos dos bispos e os votos dos leigos sejam contados separadamente”.

O bispo também questiona o calendário geral do Sínodo. “Não houve nenhuma explicação para a adição (na metade) de outra sessão sinodal para 2024”, escreve. Ele se pergunta se “os organizadores, não tendo certeza de conseguir atingir seus objetivos durante esta sessão, estão optando por mais tempo para manobrar. Mas, se o que o Espírito Santo quis dizer for esclarecido através da votação dos bispos, qual é a necessidade de outra sessão?”.

A necessidade de um diálogo robusto

O cardeal também acusa os organizadores de tentarem evitar discussões honestas e espirituosas, afirmando que é através de um diálogo tão aberto e robusto – tal como durante o Vaticano II – que o Espírito Santo verdadeiramente opera.

“Parece-me que no Vaticano II, antes de chegar a uma conclusão quase unânime, dedicaram muito tempo a discussões animadas. Foi lá que o Espírito Santo trabalhou. Evitar discussões é evitar a verdade”.

A carta apela aos bispos para que não se limitem a obedecer às diretivas processuais sem questionar, instando-os a acumular orações bem antes do Sínodo, emulando os preparativos espirituais do papa são João XXIII antes do Vaticano II.

“Estou ciente de que no Sínodo da Família o papa rejeitou sugestões apresentadas por vários cardeais e bispos precisamente em relação ao procedimento. Se, no entanto, apresentar respeitosamente uma petição apoiada por numerosos signatários, talvez esta seja aceita. De qualquer forma, você terá cumprido seu dever. Aceitar um procedimento irracional é condenar o Sínodo ao fracasso”.

O cardeal de 91 anos encerra com outro apelo aos seus irmãos bispos e cardeais para que rezem – e uma petição para mudar os procedimentos sinodais. “Esta carta que estou escrevendo pretendo ser confidencial, mas não será fácil mantê-la fora do alcance dos meios de comunicação de massa. Velho como sou, não tenho nada a ganhar e nada a perder. Ficarei feliz por ter feito o que considero ser meu dever fazer”.

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