VATICANO, 7 de jan de 2013 às 16:01
Em seu discurso nesta manhã ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé, feito habitualmente no começo do ano como uma revisão geral do "estado do mundo", o Papa Bento XVI exortou a trabalhar pela paz e precisou que o esquecimento de Deus, em lugar de sua glorificação, engendra a violência.
Ante os diplomáticos reunidos na Sala Régia do Palácio Apostólico no Vaticano, o Pontífice indicou que "hoje, por vezes, é-se levado a pensar que a verdade, a justiça e a paz sejam uma utopia e que se excluem mutuamente. Conhecer a verdade parece ser impossível e os esforços para afirmá-la parece que desembocam com frequência na violência".
"Por outro lado, de acordo com uma generalizada concepção, o compromisso pela paz reduz-se a fazer cedências que garantam a convivência entre os povos ou então entre os cidadãos da mesma nação. Diversamente, na perspectiva cristã, há uma ligação íntima entre a glorificação de Deus e a paz dos homens na terra, de tal modo que a paz não resulta meramente de um esforço humano, mas deriva do próprio amor de Deus".
Bento XVI afirmou que "o que gera a violência não é a glorificação de Deus, mas o seu esquecimento. De fato, como se pode efetuar um autêntico diálogo, quando deixa de haver por referência uma verdade objetiva e transcendente? Em tal caso, como se pode evitar que a violência, aberta ou disfarçada, se torne a derradeira norma das relações humanas??"
Em realidade, prosseguiu o Santo Padre, "sem uma abertura ao transcendente, o homem cai como presa fácil do relativismo e, consequentemente, torna-se-lhe difícil agir de acordo com a justiça e comprometer-se pela paz. A estas manifestações contemporâneas do esquecimento de Deus, podem-se associar as manifestações devidas à ignorância do seu verdadeiro rosto, que é a causa de um pernicioso fanatismo de matriz religiosa, que ceifou vítimas em alguns dos países aqui representados também no ano de 2012.".
"Como já tive ocasião de dizer, trata-se de uma falsificação da própria religião, uma vez que esta visa reconciliar o homem com Deus, iluminar e purificar as consciências e tornar claro que cada homem é imagem do Criador".
Assim, adicionou, "se a glorificação de Deus e a paz na terra estão intimamente ligadas entre si, é evidente que a paz constitui, ao mesmo tempo, dom de Deus e tarefa do homem, porque exige a sua resposta livre e consciente. Por esta razão quis dar como título à Mensagem anual para o Dia Mundial da Paz: Bem-aventurados os obreiros da paz. Compete acima de tudo às autoridades civis e políticas a grave responsabilidade de trabalhar pela paz".
O Papa recordou logo suas viagens ao México, Cuba e Líbano que "foram uma ocasião privilegiada para fortalecer o compromisso cívico dos cristãos nesses países, assim como para promover a dignidade da pessoa humana e os fundamentos da paz".
Oriente Médio e África
O Papa fez logo um chamado à comunidade internacional para colaborar em obter a paz no Oriente Médio, "acima de tudo na Síria dilacerada por contínuos massacres e palco de imensos sofrimentos para a população civil. Renovo o meu apelo para que se deponham as armas e possa, o mais rápido possível, prevalecer um diálogo construtivo para acabar com um conflito que, se perdurar, não conhecerá vencedores mas apenas derrotados, deixando em campo atrás de si apenas ruínas".
Sobre a Palestina e seu recente reconhecimento como Estado Observador não membro das Nações Unidas, o Papa renovou seu desejo "de que israelitas e palestinianos, com o apoio da comunidade internacional, se empenhem por chegar a uma convivência pacífica no contexto de dois Estados soberanos, onde o respeito pela justiça e as legítimas aspirações de ambos os povos seja tutelado e garantido. Jerusalém, torna-te aquilo que o teu nome significa: cidade da paz e não da divisão, profecia do Reino de Deus e não mensagem de instabilidade e conflito!".
O Santo Padre também fez um chamado para que o Iraque possa chegar à reconciliação e Líbano siga sendo um exemplo para a região onde os cristãos "ofereçam um testemunho eficaz para a construção de um futuro de paz com todos os homens de boa vontade".
O Papa alentou logo a trabalhar pela paz no Congo e recordou aos falecidos na Nigéria depois de um atentado terrorista em uma igreja no dia do Natal, onde foram assassinados dezenas de católicos. "Mali se vê dilacerado pela violência e sofre uma profunda crise institucional e social, que deve merecer um eficaz empenho da comunidade internacional".
Educação e caridade para a paz
"Continuando a nossa reflexão, vale a pena sublinhar a educação como sendo outro caminho privilegiado para a construção da paz. Assim no-lo ensina, para além do mais, a crise econômica e financeira atual. Esta desenvolveu-se porque, com muita frequência, foi absolutizado o lucro em detrimento do trabalho, e se aventuraram desenfreadamente pelos trilhos da economia financeira em vez da real".
O Santo Padre disse também que "a União Europeia?precisa de Representantes clarividentes e qualificados para realizar as opções difíceis que são necessárias a fim de sanar a sua economia e colocar bases sólidas para o seu progresso. Sozinhos, alguns países talvez caminhassem mais rápido; mas, juntos, todos chegarão certamente mais longe!".
O Papa destacou que "investir em educação nos países em vias de desenvolvimento da África, Ásia e América Latina significa ajudá-los a vencer a pobreza e as doenças, bem como a realizar sistemas legais equitativos e respeitadores da dignidade humana. É claro que, para implementar a justiça, não bastam bons modelos econômicos, embora sejam necessários. A justiça só se realiza, se houver pessoas justas!?".
"Construir a paz significa educar os indivíduos para combaterem a corrupção, a criminalidade, a produção e o tráfico da droga, bem como para evitar divisões e tensões, que põem em risco o tecido da sociedade, dificultando o seu desenvolvimento e a convivência pacífica", acrescentou.
Liberdade religiosa
O Papa referiu-se logo à defesa da liberdade religiosa, ameaçada pela violência e intolerância, chegando em alguns casos ao extremo de "impedir aos crentes, especialmente aos cristãos, contribuir ao bem comum através de suas instituições educativas e assistenciais".
"Para salvaguardar efetivamente o exercício da liberdade religiosa, é essencial respeitar o direito à objecção de consciência. Esta «fronteira» da liberdade toca princípios de grande importância, de caráter ético e religioso, radicados na própria dignidade da pessoa humana".
O Papa explicou que "são como ‘as paredes mestras’ de qualquer sociedade que queira ser verdadeiramente livre e democrática. Por isso, proibir a objecção de consciência individual e institucional, em nome da liberdade e do pluralismo, abriria, ao invés e paradoxalmente, as portas precisamente à intolerância e ao nivelamento forçado".
O Papa referiu-se também ao grande trabalho de caridade que realiza a Igreja Católica em todo mundo, através de seus orfanatos, escolas, colégios e universidades, assim como na ajuda às pessoas diante dos desastres naturais como os ocorridos na Ásia, na costa oriental dos Estados Unidos e na Itália.
Para concluir, Bento XVI recordou umas palavras do Papa Paulo VI aos governantes ao final do Concílio Vaticano II, datadas em 8 de dezembro de 1965, quando disse que "a vós corresponde ser na terra os promotores da ordem e da paz entre os homens. Mas não esqueçais: é Deus (...) o grande artífice da ordem e da paz na terra".