ROMA, 2 de dez de 2014 às 13:35
A política de controle populacional da Índia mostrou a sua fragilidade depois da morte de pelo menos 14 mulheres que se submeteram às operações de esterilizações promovidas pelo governo da Índia em Chhattisgarh, um dos estados mais pobres do país.
O fato ocorreu entre os dias 14 e 15 de novembro e segundo os relatórios foram usados medicamentos que estavam fora do prazo de validade e o hospital tinha estado fechado por quatro meses. Entretanto, reabriu-se repentinamente, aumentando os riscos de infecção.
Um porta-voz da Arquidiocese de Raipur, que inclui Chhattisgarh, indicou que as mulheres foram operadas, receberam seus remédios e depois foram para casa.
“O descuido da administração do doutor foi uma dor para nós”, assinalou o porta-voz identificado como Sebastián. Indicou que a Arquidiocese só promove educação sobre métodos naturais de planejamento familiar.
As esterilizações fazem parte do plano do governo para frear o aumento da população. Normalmente estes procedimentos requerem anestesia, mas as mulheres de Chhattisgarh não receberam tal procedimento. Além disso, faleceram por infecção e perda de sangue.
Segundo a BBC, foram realizadas laqueaduras em 83 mulheres em apenas seis horas e só tinha um médico e um assistente fazendo as cirurgias. O governo assinala que um cirurgião pode realizar 35 operações em um dia.
Período de emergência
Esta política não é nova na Índia. Mara Hvistendahl, uma jornalista renomada, recordou os casos de negligência nas esterilizações realizadas durante o “período de emergência” de junho de 1975 e março de 1977 estabelecido pela primeiro-ministro Indira Gandhi e que teve como alvo milhões de “dalits” (os intocáveis), e muçulmanos.
Segundo o Population Research Institute, documentos revelaram as políticas coercitivas desses dois anos, parecido com o que ocorreu há algumas semanas. “Mais de onze milhões de homens e mulheres foram esterilizados à força”, com muitas mortes pelas más condições sanitárias.
Cotas mensais
Danielle Sisk, diretora de uma instituição de defesa dos dalits, denunciou que as mulheres mais pobres são vistas como um objetivo fácil para as esterilizações, sobretudo, pela sua falta de educação.
Na Índia se supõe que as esterilizações são voluntárias, mas há muitos relatos de coerção de mulheres, que recebem cerca de 20 dólares, que equivale a uma semana de trabalho em Chhattisgarh.
“Quando há um doutor na comunidade ele precisa cumprir certa cota por mês, então eles tentam realizar esta campanha incrível, entre 80 a 100 por dia”, muitas vezes com pouca ou nenhuma supervisão.
Denunciou também que muitas vezes dizem para as mulheres que a esterilização é para o seu bem, e elas aceitam já que carecem de educação.
Tráfico sexual
Do mesmo modo, advertiu Sisk, outra consequência das esterilizações de mulheres pobres é que elas se tornam um alvo dos traficantes que fazem comércio com a exploração sexual.
“Trabalhamos muito próximos às prostitutas do templo (templo prostitutes), garotas vendidas muito jovens para o templo… basicamente são usadas ou sexualmente exploradas”, assinalou, sem risco de que saiam grávidas “ou tenham que pagar por um aborto”.
Nesse sentido, assinalou que enquanto muitas vezes se veem as esterilizações como um meio de controle populacional, o maior problema na Índia –e em outros países da Ásia-, é a desvalorização das mulheres. “Todos estamos feitos à imagem de Deus”, recordou Sisk.