SANTIAGO, 24 de mar de 2015 às 15:05
No fim de semana a imprensa internacional divulgou a posse do Bispo de Osorno no sul do Chile, Dom Juan Barros Madrid, afetada pelo protesto de um grupo que o acusa de ter encoberto os abusos sexuais do sacerdote Fernando Karadima, algo que o Prelado negou em diversas ocasiões.
Estas são algumas chaves para compreender o que aconteceu desde o dia 10 de janeiro quando o Papa Francisco designou Dom Juan Barros como novo Bispo de Osorno.
1.- Quem é Fernando Karadima Fariña?
No final de 2010, a justiça chilena fechou por falta de provas uma investigação sobre abusos sexuais que o sacerdote Fernando Karadima Fariña teria cometido nos anos 80. Entretanto, em fevereiro de 2011, a Congregação para a Doutrina da Fé no Vaticano terminou a sua própria investigação e declarou Karadima culpado, hoje de 84 anos. Este sacerdote era conhecido como pároco de Sagrado Coração de Jesus na conhecida comuna da Providência na capital chilena.
A notícia da sentença surpreendeu os bispos, sacerdotes e leigos que viam o sacerdote como um modelo a ser seguido, e que consideraram as primeiras acusações como um ataque contra a Igreja.
Karadima acompanhou o caminho vocacional de 40 sacerdotes, um deles é o Bispo Juan Barros, que décadas atrás pertenceu ao seu círculo de amigos mais próximos e quando estourou o escândalo não acreditava nas acusações contra ele, como vários outros prelados.
2.- Juan Carlos Cruz e os acusadores
Três vítimas de Karadima acusam Dom Barros de encobrir os abusos do sacerdote. Entretanto, estas acusações não correspondem à investigação realizada pelo Vaticano. Dos acusadores, Juan Carlos Cruz é o mais conhecido, mora nos Estados Unidos e é o mais procurado pelos meios nacionais e internacionais para comentar o que acontece na Igreja no Chile.
Após a posse de Juan Barros como Bispo de Osorno, Cruz disse à CNN Chile que o Episcopado e o Papa Francisco “esbofeteiam” às vítimas de Karadima. Nas acusações contra Dom Barros, Cruz encontrou eco na imprensa e em polêmicas figuras da Igreja no Chile como o sacerdote jesuíta Felipe Berríos, conhecido por ser a favor do matrimônio homossexual, o aborto e criticar a canonização de João Paulo II.
3.- A defesa de Dom Juan Barros
Dom Juan Barros e outros três bispos próximos a Karadima se aderiram à decisão da Santa Sé em abril de 2011 e negaram ter conhecido a sua vida dupla. Em um comunicado, manifestaram que “com grande dor assumimos a sentença que declara a sua culpabilidade em graves faltas sancionadas pela Igreja. Como tantos, conhecemos com profundo assombro e pena esta situação e seus diversos e múltiplos efeitos”.
Em uma carta dirigida aos fiéis de Osorno poucos dias antes de tomar posse da diocese, Dom Barros reiterou que “jamais tive conhecimento de alguma denuncia em relação ao sacerdote Karadima sendo Secretário do Cardeal Juan Francisco Fresno, e jamais tive conhecimento nem imaginei nunca daqueles graves abusos que este sacerdote cometia com suas vítimas. Não aprovei nem participei desses fatos".
"Dói-me profundamente a imensa dor que por longos anos continua afetando as vítimas. E reitero junto a toda a Igreja que não há lugar no sacerdócio para quem comete estes abusos", adicionou.
Depois de assumir o cargo de Bispo de Osorno, no sábado, 21 de março de 2015, o Prelado reiterou que não esteve vinculado aos abusos do sacerdote.
"Digo-lhes, diante de Deus que nos está escutando, nunca me passou pela mente que ocorriam essas coisas. Não teria aceitado por nenhum motivo, eu não sou amigo de Fernando Karadima", indicou.
Adicionou que antes da condenação do Vaticano de 2011 "já estava afastado dele. É obvio que fui próximo, mas já havia me distanciado, não porque soubesse destas questões das denúncias, mas porque ele começou a ficar muito mal-humorado. Jamais soube dessas coisas tão trágicas. Dói-me enormemente a dor das vítimas, rezo por eles que levam esta dor até hoje".
Antes de ser Bispo de Osorno, Dom Juan Barros Madrid foi Bispo Militar durante quase 11 anos, Bispo de Iquique durante quatro anos e Bispo Auxiliar de Valparaíso durante cinco anos. Em todo este tempo, seu ministério não tinha sido questionado.
4.- Os protestos em Osorno
A mídia assinala que a maioria dos católicos em Osorno e muitos membros do clero não aceitam a designação de Dom Juan Barros. No dia da posse, dezenas de pessoas -incluindo não católicos- ingressaram na Catedral de Osorno com bandeiras e balões pretos para protestar contra o Prelado, enquanto a maioria dos que estavam dentro da igreja estavam com balões e bandeiras brancas em apoio a Dom Barros.
A imprensa, que fez uma ampla cobertura daqueles que se opuseram à nomeação, divulgou uma carta assinada por sacerdotes e diáconos, assim como uma carta da congregação dos Sagrados Corações, cujo provincial Pe. Alex Vigueras, na qual exigem a renúncia do Prelado.
Nesta situação, o Comitê Permanente da Conferência Episcopal Chilena, emitiu um comunicado em 18 de março no qual expressa a sua “adesão, em espírito de fé e obediência, ao Papa Francisco que nomeou Dom Barros como Bispo da diocese de Osorno”.
5.- Outros interesses?
A cobertura que a mídia fez da designação de Dom Juan Barros como Bispo de Osorno se dá no contexto do debate sobre a despenalização do aborto, assim como projetos de lei de eutanásia e de uniões homossexuais no Chile, onde a Igreja é uma das poucas vozes que defende a vida e a família.
Neste contexto, 51 deputados enviaram uma carta ao Vaticano questionando a nomeação, alguns dos quais são próximos a Cruz. É possível que os grupos que promovem estas mudanças legais, o lobby gay e os promotores do aborto, usem o caso Karadima e sua antiga amizade com Dom Barros para desacreditar a Igreja neste debate?