Embora os terroristas do Estado islâmico (ISIS) tenham sido expulsos da cidade de Mosul (Iraque) no dia 9 de julho, os cristãos não querem voltar porque desconfiam dos seus vizinhos muçulmanos, pois eles os traíram diante dos terroristas, afirmou um sacerdote.

Pe. Luis Montes, sacerdote missionário do Instituto do Verbo Encarnado (IVE) no Iraque, explicou ao Grupo ACI Prensa que, antes da invasão do ISIS em junho de 2014, Mossul “era a cidade mais perigosa do país. Várias igrejas foram bombardeadas e sacerdotes e bispos foram assassinados. Quando os jihadistas chegaram, ficaram muito poucos cristãos, não sei quantos. Alguns dizem que havia cerca de dois mil”.

Este sacerdote afirmou que “atualmente em Mossul não há absolutamente nenhum cristão”.

“Quando nós pensávamos que todos os cristãos tinham fugido, conforme o exército ia tomando os bairros, soube de dois cristãos que foram escondidos por uma família muçulmana, nunca saiam de casa, não os descobriram e assim foram salvos. Eu não sei quantos são, eu só ouvi falar que eram dois. Estes cristãos não estão lá agora, já foram embora”, comentou.

Pe. Montes, que esteve recentemente nesta cidade, indicou: “Conversei com muitos cristãos de Mossul, tanto em Bagdá como em Erbil, e nenhum deles me disse que voltará. Mesmo que permaneçam no país ou vão embora. Ninguém insiste para que eles voltem. É perigoso demais”, sublinhou.

O sacerdote assinalou que, para os cristãos, “foi muito forte o fato de que seus vizinhos muçulmanos, que em teoria eram seus amigos, eram os que advertiam ao Estado Islâmico quais eram as casas cristãs”.

“A maioria dos cristãos conta que os seus vizinhos disseram diretamente: ‘estamos esperando que o Estado Islâmico entre para roubá-los’, e quando os cristãos iam embora, enquanto eles estavam a um metro da casa, entravam para saquear seus pertences”.

O sacerdote indicou que, os cristãos que fugiram das aldeias na Planície de Nínive, como Qaraqosh, querem voltar e inclusive há várias iniciativas da Igreja para reconstruir as casas destruídas.

“Qaraqosh era uma cidade cristã, as pessoas não foram traídas pelos seus vizinhos muçulmanos. Por outro lado, Mossul é uma cidade imensa, de maioria muçulmana, é sunita, com muito fanatismo”, explicou.

O missionário do IVE comentou que depois da libertação de Mossul, alguns sacerdotes vão à cidade para verificar se as casas dos cristãos estão ocupadas pelos muçulmanos e para pedir apoio ao governo a fim de que os proprietários possam recuperar estas propriedades.

O que aconteceu com as igrejas em Mossul?

Pe. Montes comentou que, durante a sua permanência em Mossul, somente pôde entrar na zona oriental, porque a outra zona é insegura. Destacou que a zona leste “não está muito destruída, não dá a impressão de que esta cidade foi bombardeada”.

“Entretanto, foram anos difíceis, cheios de proibições absurdas, cheios de dor, de sangue e crueldade, porque havia execuções públicas”, acrescentou.

O sacerdote do IVE disse que visitou três lugares: a Igreja da Virgem Maria, a Igreja do Espírito Santo e o Mosteiro de São Jorge. Todos foram destruídos pelo ISIS.

Escombros da Igreja da Virgem Maria/ Foto: Pe. Luis Montes

Em relação à Igreja do Espírito Santo, comentou que “um homem disse que a cripta foi usada como prisão e que os terroristas quebraram todas as imagens, as passagens bíblicas, tiraram muita alvenaria. É doloroso vê-la”.

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No caso do Mosteiro de São Jorge, a fachada da igreja foi destruída, as imagens estavam quebradas e “tenho a impressão de que eles também usaram o sótão como uma prisão, porque há nomes de cristãos escritos nas paredes. Podemos reconhecê-los, pois os cristãos são registrados com nomes de santos”.

Escombros do Mosteiro de São Jorge/ Foto: Pe. Luis Montes

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Pe. Montes indicou que os sacerdotes vão pedir a uma família muçulmana de confiança para que cuidem delas. “Por exemplo, há três famílias muçulmanas vivendo na Igreja do Espírito Santo e a Igreja sabe. Não devem viver lá, mas são como guardas”.

“Durante a sua visita, o Cardeal Barbarin levou uma pequena imagem da Virgem e eles a cuidam. São responsáveis de que as pessoas não entrem para saquear, profanar ou fazer coisas piores”, contou.

Solidariedade em meio à traição

Embora maioria dos cristãos em Mossul tenha sido traída pelos muçulmanos, Pe. Montes enfatizou que também houve gestos de caridade.

“Ao lado do Mosteiro de São Jorge, há uma pequena montanha e, depois da libertação, alguns muçulmanos levaram uma cruz como uma forma de solidariedade aos cristãos. É um gesto muito bonito”, expressou.

Cruz erguida pelos muçulmanos em Mosul / Foto: Pe. Luis

“Agora sabemos que alguns muçulmanos arriscaram suas vidas escondendo poucos cristãos que restavam. Certamente é muito valioso e Deus os recompensará”, acrescentou.

“Nós também sabemos que quando os cristãos deixaram Mossul, havia alguns casos nos quais os amigos muçulmanos os acompanhavam até o portão da cidade, em um gesto muito apreciado. Esta é uma manifestação oriental de apoio, de carinho”, destacou.

“O fato de colocarem a cruz na montanha é muito bonito, mas não remedia esta traição e essa grande desconfiança que existe”, afirmou.

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