Roma, 20 de set de 2018 às 18:00
Em duas cartas privadas reveladas neste dia 20 de setembro por meios internacionais, Bento XVI defendeu sua decisão de renunciar ao pontificado, assim como o título de Papa Emérito que assumiu desde então.
Segunda as cartas, Bento XVI assinalou que entende “a profunda dor” que o fim de seu pontificado provocou nos cardeais e em outros católicos. Mas também advertiu que em alguns a dor “se tornou uma ira que já não só se dirige a mim, mas a minha pessoa e meu pontificado como um todo”.
Segundo indica o jornal alemão Bild, as cartas foram enviadas em novembro de 2017. Embora este meio não identifique o “cardeal alemão” que as recebeu, o jornal norte-americano The New York Times afirma que se trata do Cardeal Walter Brandmüller.
Em suas missivas, Beto XVI se referiu às críticas que recebeu por usar o título de “Papa Emérito”. Advertiu que, “desta maneira, o próprio pontificado está sendo desvalorizado em combinação com a tristeza pela situação da Igreja hoje”.
Segundo Bild, Bento XVI defendeu sua decisão escrevendo que se um cardeal conhecia “uma forma melhor” para suas ações, “e portanto acredita que pode julgar o que eu decidi, então por favor me diga”.
Em entrevista concedida a um jornal alemão em outubro de 2017, o Cardeal Brandmüller expressou sua preocupação a respeito da ideia de um “Papa emérito”, algo que “não existe em toda a história da Igreja”. “O fato de que o Papa tenha chegado e derrubado uma tradição de 2.000 anos de antiguidade não só deixou boquiabertos os cardeais”, acrescentou.
As duas cartas privadas de Bento XVI seriam uma resposta a esses comentários. Na primeira, de 9 de novembro de 2017, Joseph Ratzinger escreveu: “O senhor disse que com ‘Papa Emérito’ criei uma figura que nunca existiu em toda a história da Igreja. O senhor sabe muito bem, é claro, que os Papa abdicaram, embora muito raramente. O que foram depois? Papas Eméritos ou que outra coisa?”.
Bento XVI também propôs o exemplo do Papa Pio XII, que pensou em renunciar em 1944 diante da possibilidade de que os nazistas o prendessem quando ocupavam a Itália. Eugenio Pacelli tinha considerado voltar ao posto de cardeal se fosse capturado.
Bento XVI escreveu que, ao contrário da situação de Pio XII, “certamente não teria sido sensato” que voltasse a ser cardeal, pois “teria estado constantemente exposto na mídia como um deles, inclusive mais porque as pessoas me veriam como o ex-Papa”.
“Se de propósito ou não, isso poderia ter tido difíceis consequências, especialmente no contexto da situação atual”, acrescentou.
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Bento XVI também explicou que o preocupava que, com seus comentários sobre o ministério e decisões de seu eventual sucessor, desse a impressão de que há dois Papas, quando não é assim.
“Com ‘Papa Emérito’ tentei criar uma situação na qual eu não sou acessível para nada aos meios de comunicação e na qual fica completamente claro quem é o único Papa”, precisou.
Na segunda carta, de 23 de novembro de 2017, Bento XVI escreveu que estava preocupado com a entrevista que o Cardeal Brandmüller deu em outubro daquele ano ao Frankfurter Allgemeine Zeitug.
Bento XVI disse que as palavras do Cardeal Brandmüller poderiam promover o tipo de agitação que inspirou “The abdication” (A abdicação), livro de Fabrizio Grasso no qual se afirma que ter papas eméritos pode destruir a autoridade papal.
O Cardeal Brandmüller é um dos quatro cardeais que assinaram as dubbia, um documento de setembro de 2016 que solicita ao Papa Francisco que esclareça algumas questões sobre a comunhão para os divorciados em nova união, a partir da exortação apostólica Amoris Laetitia.
Os outros três são os cardeais Burke, Caffarra e Meisner. Estes dois últimos faleceram em 2017.
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— ACI Digital (@acidigital) 9 de fevereiro de 2018