REDAÇÃO CENTRAL, 17 de set de 2019 às 14:30
Na semana passada, foi realizada nos Estados Unidos a Semana Nacional de Prevenção ao Suicídio, uma semana na qual os promotores de saúde pública e mental compartilham dicas para a prevenção do suicídio e para detectar sinais para alertar sobre essa situação.
Na segunda-feira, 9 de setembro, o popular pastor evangélico e promotor da saúde mental Jarrid Wilson, de 30 anos, cometeu suicídio. Poucas horas antes de sua morte, Wilson postou uma mensagem no Twitter sobre a compaixão de Jesus pelos deprimidos e suicidas.
“Amar Jesus nem sempre cura os pensamentos suicidas. Amar Jesus nem sempre cura a depressão. Amar Jesus nem sempre cura o transtorno de estresse pós-traumático. Amar Jesus nem sempre cura a ansiedade. Mas isso não significa que Jesus não nos ofereça companhia e consolo. Sempre faz isso”, escreveu.
Wilson foi um promotor da saúde mental durante muito tempo e fundou com sua esposa "Anthem of Hope" (Hino da Esperança), uma abordagem cristã para deprimidos e suicidas. Sua morte ocorreu após a de Andrew Stoecklein, outro jovem pastor evangélico e promotor da saúde mental, que se suicidou no ano passado.
As taxas de suicídio entre norte-americanos em idade ativa (entre 16 e 64 anos) aumentaram 34% entre 2000 e 2016, de acordo com dados dos Centros para o Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês). Entre os norte-americanos entre 10 e 24 anos, o aumento foi ainda mais dramático: os dados do CDC mostram um aumento de 50% nos suicídios nesse grupo entre 2000 e 2017.
Os suicídios desses dois pastores destacam essa tendência em alta, especialmente entre os jovens, mesmo entre os que fazem parte de uma comunidade cristã.
CNA – agência em inglês do Grupo ACI – conversou com alguns profissionais de saúde mental sobre o motivo do aumento das taxas de suicídio, principalmente entre os jovens, e o que a Igreja Católica pode fazer para ajudar.
O diácono Basil Ryan Balke, um terapeuta licenciado no Mount Tabor Counseling, na área de Denver (Estados Unidos), disse à CNA que acredita que um dos fatores determinantes no aumento do suicídio entre adolescentes e adultos jovens é sua constante conexão com o mundo através de dispositivos móveis, junto com a falta de maior significado em suas vidas.
“Agora, com a saturação do iPhone, é possível ter a comunicação que está constantemente lá e em constante movimento, por isso, a pessoa nunca pode se desconectar e nunca pode continuar com a vida fora da imagem que precisa mostrar ao mundo (através das redes sociais)”, disse.
“Sempre estão distraídos. Também fui ministro de jovens durante muitos anos e, simplesmente, essas crianças nunca tiveram um momento de paz”, acrescentou.
Tommy Tighe, terapeuta matrimonial e familiar na região da Bahia na Califórnia, disse que, apesar de ter mais conexões, os jovens de hoje estão mais isolados do que nunca.
"Há muito mais pressão, há muito mais impulso para ser popular", disse Tighe, acrescentando que se comunicar nas redes sociais geralmente não equivale a "uma comunidade muito unida de amigos íntimos".
De acordo com um artigo de 2015 da revista de pesquisa ‘Cyberpsychology, Behavior and Social Networking’, o uso frequente de redes sociais em crianças e adolescentes está associado a um mau funcionamento psicológico, uma vez que limita suas interações diárias face a face, o que afeta sua capacidade de manter relacionamentos significativos.
O estudo constatou que os estudantes que utilizaram redes sociais por duas ou mais horas por dia tinham maior probabilidade de qualificar mal sua própria saúde mental e experimentaram altos níveis de angústia psicológica e ideação suicida.
“Há uma tendência aos relacionamentos superficiais. É claro que a pessoa não publica no Instagram ‘estou deprimido’ ou algo assim, então, acho que as pessoas não sabem com quem entrar em contato”, disse Tighe.
Por sua parte, Balke disse: “Acho que o que também está acontecendo é que as pessoas mais jovens também perderam o sentido em suas vidas diárias. Acho que todos perdemos o significado como uma força em nossas vidas”.
Balke também declarou que, especialmente para os jovens, há uma pressão cada vez mais intensa para o desempenho acadêmico ou atlético, que substituiu as coisas que costumavam dar às pessoas um sentido de maior propósito, como fé, virtude ou conexões familiares próximas.
“Estão se esforçando tão agressivamente até o ponto no qual não há sentido por trás de tudo, porque não há um propósito geral. Estas coisas são substitutas disso”, expressou.
O estigma persistente nos cuidados da saúde mental
Outro fator impulsionador do aumento de suicídios entre jovens e outras populações é o estigma persistente de buscar terapia ou outras intervenções para a saúde mental, disse Tighe.
Além disso, afirmou que hoje não apenas os jovens acham mais difícil estabelecer relacionamentos significativos com seus colegas, mas os pais também têm medo de abordar o tema do suicídio e da saúde mental com seus filhos.
“Espero que a geração mais jovem de pais esteja um pouco mais disposta, mas dá medo, né? É muito assustador falar disso, mas devem falar sobre isso e, quanto mais específicos forem, melhor”, disse Balke.
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O que a Igreja pode fazer para prevenir o suicídio
Michelle Snyder é o atual diretor da Soul Shop, uma organização que capacita clérigos e congregações sobre como falar sobre suicídio, como evitá-lo e quais são os sinais de alerta.
"Costumo dizer a um grupo de líderes da comunidade de fé que se eles fazem a pergunta 'há alguém na minha paróquia pensando em suicídio?', estão fazendo a pergunta errada. Porque a pergunta correta é: sabia que seis de cada cem pessoas estão pensando em suicidar-se neste momento?”, disse Snyder.
Parte da capacitação consiste em criar consciência entre o clero e os líderes da igreja de que há pessoas desesperadas dentro de suas próprias congregações que correm o perigo de se suicidar e precisam de ajuda. Snyder disse que também capacitam as congregações sobre como apoiar as pessoas que foram afetadas pelo suicídio de um familiar ou amigo.
Além disso, estudam histórias sobre suicídio ou ideias suicidas, que se encontram em passagens bíblicas.
“Há bastantes. Temos Judas, a história de Judas, e isso é um suicídio. Mas também tem histórias como Elias (que estava) rezando para morrer. Tem Saul, que caiu sobre sua própria espada e cometeu suicídio. Tem Jó, que disse que a morte seria melhor do que o que estou experimentando. Tem muitos heróis na Bíblia que pensaram ou simplesmente disseram: ‘Sinto muita dor. A morte seria melhor’”, disse.
Também capacitam líderes da igreja para detectar alguns dos sinais de alerta de uma pessoa em risco de suicídio.
Tighe disse que alguns desses sinais de alerta incluem pessoas que estão notavelmente deprimidas por longos períodos de tempo, retraimento social, que falam sobre suicídio ou autolesões, entre outras coisas.
Durante os treinamentos de Soul Shop, disse Snyder, o grupo adota uma abordagem de saúde pública ao suicídio, o que significa que capacitam as comunidades religiosas para que assumam uma responsabilidade coletiva pela saúde de seus membros.
Uma das maiores ferramentas de prevenção ao suicídio que as comunidades de fé podem oferecer, explicou Snyder, é ser comunidades de fé plenas, onde as pessoas se sentem conectadas e valorizadas como pessoas inteiras, e não apenas por um aspecto de sua identidade.
O que mais pode ser feito?
Balke disse que incentivaria todos os pastores da Igreja a se reunirem com sua equipe e a se familiarizarem com os recursos de saúde mental disponíveis localmente. Devem saber a localização das clínicas, seus horários e para quais números telefonar, disse.
"Precisam ter acesso rápido a eles, para que, quando alguém chegue ao seu escritório, ou depois de um estudo bíblico ou quando surja este tipo de conversas, tenham rápido acesso ao telefone e ganhem tempo”, assegurou.
Tighe recomendou que as paróquias publiquem cartazes em seus quadros de avisos com informações sobre recursos de saúde mental locais, assim como também telefones de ajuda ou mensagens instantâneas.
Balke pediu aos sacerdotes e outros líderes da Igreja que tratem os problemas de suicídio e de saúde mental com a seriedade que merecem, e não como algo que não é um problema grave ou que possa ser resolvido unicamente através da oração ou direção espiritual.
“A saúde mental na Igreja é um problema real e não é tratado necessariamente com a seriedade que merece em nível institucional. As pessoas se suicidam em nossas paróquias e em nossas igrejas locais”, afirmou.
Snyder está confiante de que, se adequadamente capacitadas, igrejas e paróquias terão um papel fundamental a desempenhar na prevenção de suicídios em suas comunidades.
“Falamos muito sobre colocar o cinto de segurança antes que o acidente ocorra. E é isso que estamos descrevendo aqui, é o que fazemos nas comunidades religiosas muito antes da crise ocorrer”, concluiu.
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— ACI Digital (@acidigital) December 6, 2018