NÁPOLES, 14 de jul de 2020 às 13:00
O Bispo de Caserta (Itália), Dom Giovanni D'Alise, denunciou que a agiotagem da máfia, com os juros abusivos que cobram quando fazem empréstimos, converteu-se na “nova escravidão” para as famílias, especialmente agora diante da pandemia do coronavírus.
"Eu digo às minhas comunidades e sacerdotes e a todos aqueles que têm negócios em Caserta, e a todos os batizados que trabalham mais ativamente pelo bem comum, que mantenham os olhos abertos", disse o prelado ao jornal dos bispos italianos Avvenire, diante dos casos dos pais que se viram obrigados a enviar seus filhos para trabalhar com mafiosos locais para pagar dívidas familiares.
O crime organizado, especialmente os empréstimos com agiotas, tem aumentado diante da grave crise causada pela pandemia de coronavírus. Com muitas empresas e indústrias fechadas por semanas ou meses em algumas áreas, os mafiosos locais se tornam os emprestadores que são o último recurso para as famílias necessitadas.
O bispo, cuja diocese está no interior da região de Nápoles, disse que "coisas impensáveis estão acontecendo diante de nossos olhos".
Dom D'Alise fez essas afirmações após o relatório da Câmara de Comércio de Caserta que denuncia a situação dos filhos das famílias que pagam as suas dívidas trabalhando para os mafiosos.
"Se há filhos e filhas em idade em que já podem trabalhar legalmente, adultos ou menores, o credor pede ao pai para colocá-los para trabalhar perto dele, em uma posição que, além disso, não permita chegar a ele", disse ao Avvenire, Tommaso De Simone, Presidente da Câmara de Comércio Caserta.
A agiotagem, uma prática condenada pela Igreja, cresceu "exponencialmente" nos últimos meses no norte da Itália, devido à quarentena no país, acrescentou.
“É um pecado grave, porque o dinheiro é obtido aproveitando as necessidades das pessoas. Isso é anti-humano e anticristão", disse o Prelado.
Os meios italianos explicam que os agiotas nesta zona do país estão vinculados com a Camorra, a máfia que tem a sua sede em Nápoles.
"Agora tenho a impressão de que uma nova escravidão está surgindo, assim como a Camorra se espalhou e se escondeu entre nós", disse o Bispo.
"Muitos trabalhadores são cada vez mais explorados e agora vemos seus filhos e filhas: meninos que são enviados para trabalhar em vez dos adultos, para pagar as dívidas de seus pais", acrescentou.
O Arcebispo de Nápoles, Cardeal Crescenzio Sepe, disse em uma homilia em maio que a Camorra é "outra possível epidemia".
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“Há quem é bom em fazer fortuna em tempos de epidemia. Vamos fazer alguma coisa, intervir imediatamente, porque o submundo é mais rápido que a nossa burocracia. A Camorra não espera. Temos que nos livrar de todas as organizações [criminosas]. Temos que vencê-las e afirmar o direito à esperança", afirmou o Purpurado em uma homilia, em 2 de maio.
Outro problema dos agiotas é que eles aparecem “com o rosto de um amigo, de um benfeitor que ajuda quando todos os outros o abandonam. Isso faz com que você tenha dinheiro instantaneamente, quando precisa".
"Enquanto tiver propriedades, o agiota te emprestará dinheiro e os empréstimos são muito difíceis de pagar: não apenas por causa das altas taxas de juros, mas também porque quando, como na quarentena, não há renda e falta dinheiro para comer e para pagar empréstimos
“Os filhos com frequência pagam por suas famílias. Não tenho nomes para dar, mas pelas histórias que ouvi dos operadores, sinto muito pelo que está acontecendo", acrescentou.
Para o bispo, a raiz do problema da agiotagem é o fracasso em defender a dignidade humana. Assim, os bispos italianos o vincularam à questão do racismo nos Estados Unidos.
"Nos dois casos, a pessoa não tem dignidade. Ainda tenho diante de mim a imagem do policial segurando George Floyd com o joelho. Ele o esmagou não apenas fisicamente. A resposta da Igreja deve ser "solidariedade efetiva" que possa reconhecer essa dignidade e apoiar os mais necessitados".
"O que se requer da Igreja é um amplo exercício da solidariedade, cada um com o que puder, mas que seja uma solidariedade sensível e eficiente. Com frequência não nos damos conta de quanta bondade, e também de quanta maldade, há entre nós e as crianças não podem ser o preço”, concluiu o Prelado.
Publicado originalmente em CNA. Traduzido e adaptado por Nathália Queiroz.
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