A assessora legislativa da ONG Comunidad y Justicia, Daniela Constantino, criticou o veto do presidente do Chile, Sebastián Piñera, ao projeto de lei de Garantias da Infância, “por ser muito fraco”, apesar de não ser “mau em si mesmo”.

Piñera alterou a lei “Sistema de Garantias dos Direitos da Infância” aprovada no Congresso dia 22 de junho. O projeto vem sendo criticado por diminuir o pátrio poder em favor do Estado.

“Embora reconheçamos que o conteúdo do veto em si não é ruim, também enfatizamos que o veto é muito fraco e deixou muito a desejar. Não se tratou, realmente, da proteção da família, do real interesse superior das crianças e do direito dos pais de educar os seus filhos, como foi prometido. De qualquer forma, ´a criança não foi colocada em primeiro lugar´”, declarou Constantino em 22 de julho à ACI Prensa.

A perita comentou que “a maior parte do veto consiste em propor modificações técnicas que adequam o texto do projeto, mas as mudanças que permitiriam melhorar substancialmente esse projeto não foram propostas”.

“O veto deixa muito a desejar. Foram deixados de fora os artigos mais problemáticos do projeto de lei”, reiterou.

Artigos que do projeto que “deveriam ter sido vetados”

Entre os exemplos dados por Constantino, está o artigo 3º. A perita disse que ele “estabelece que o critério único de interpretação do projeto de lei são os direitos das crianças, excluindo assim, dentro das regras de interpretação, as normas contidas no Código Civil sobre o direito preferencial e o dever dos pais de educar os seus filhos e o dever dos filhos de obedecer aos pais”.

Outro artigo problemático, afirmou, é o artigo 7º, “que define o interesse superior da criança como o máximo gozo dos princípios, direitos e garantias reconhecidos em virtude do artigo 1º deste projeto de lei”.

Sobre este último artigo, Constantino explicou que ele “contraria o que está estabelecido no Código Civil, segundo o qual os pais devem preocupar-se fundamentalmente com o interesse superior do filho, para o qual buscarão a sua maior realização espiritual e material possível e o guiarão no exercício dos direitos essenciais que emanam da natureza humana conforme a evolução de suas faculdades”.

“Este projeto de lei concebe o interesse superior da criança como se a realização da pessoa humana se resumisse em ter muitos direitos, em seu reconhecimento e garantia. A realidade é diferente: a realização existe por e em relação aos outros e no cumprimento dos deveres”, acrescentou a especialista em Ciências Jurídicas, Política e Direitos Humanos.

Um terceiro artigo que deveria ter sido vetado, disse Constantino, é “o artigo 13º que, incorpora a perspectiva de gênero no desenvolvimento, implementação e avaliação das medidas que sejam adotadas em relação às crianças e adolescentes, ou seja, todas as políticas públicas, serviços e programas orientados às crianças devem considerar a variável ´gênero´”.

“Além disso”, continuou, “a perspectiva de gênero, na forma como é definida por diversos organismos internacionais, entre eles a UNICEF, pretende eliminar as diferenças naturais entre homens e mulheres para defender uma igualdade mal-entendida, ao invés de defender uma ´equidade´, pois naturalmente homens e mulheres são diferentes. Além disso, ´a perspectiva de gênero´ é usada hoje para promover a desconstrução cultural do homem e da mulher”.

O artigo 74.º do projeto legislativo é também motivo de preocupação para Daniela Constantino. Segundo ela, o artigo “estabelece o procedimento de proteção administrativa e que, se bem ele menciona a sua voluntariedade, estabelece também que, caso os citados não compareçam à sessão ou a instância fracasse na busca de acordos e compromissos concretos para a superação da ameaça ou vulneração, o Escritório Local da Infância tomará uma medida de proteção administrativa”.

“Isto significa que o escritório adotará a proteção administrativa se os pais não comparecerem, pondo em questão se essa proteção seria voluntária ou não, o que eventualmente processaria a família”, explicou.

Enfatizou também que, “no que diz respeito aos princípios do processo de proteção administrativa, é fundamental a voluntariedade da atenção, o que é característico do processo de proteção administrativa em relação à proteção judicial, que é obrigatória para as partes”.

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Finalmente, a assessora legislativa da ONG Comunidad y Justicia criticou o artigo 76º, “que consagra a ação de reclamação por ilegalidade, o que não faz muito sentido se a proteção administrativa for voluntária, embora possam ocorrer outros casos de ilegalidade”.

“Era importante esclarecer este ponto, já que durante a tramitação deste projeto de lei, não ficou claro se a proteção administrativa é voluntária ou não”, acrescentou.

A fundação Cuide Chile publicou, em 22 de julho, um comunicado no qual expressou sua “gravíssima preocupação pela integridade da infância e adolescentes, dada a desproteção a que ficam expostos, inclusive após o veto do governo do senhor Piñera”.

“É absurdo o teor do veto apresentado. Ao referir-se apenas a poucos artigos, esta intervenção do Governo demonstra a falta absoluta de compreensão dos danos que causará às gerações futuras e a inconsciência social que implica para a família a aprovação do texto deste projeto”, afirmou.

O comunicado também enfatizou que “não existe verdadeiramente nenhum elemento contido no veto que permita evitar que os pais sejam considerados como meros executores das diretrizes e orientações que o Estado fixe”.

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“Persiste a polícia familiar instituída para perseguir o descumprimento das diretrizes da Lei. Portanto, os pais deverão sê-lo segundo o que manda esta lei e não segundo os pareceres da razão e o amor que guiam os pais no cuidado e na proteção de seus filhos”, explicou.

A fundação enfatizou que o veto “não contém nenhuma diretriz que reconheça de forma concreta a autoridade e o direito preferencial dos pais a educar seus filhos”. Além disso, “deixa subsistentes e reafirma princípios nefastos como a perspectiva de gênero”.

No final do comunicado, a organização afirmou que “o Estado jamais poderá entregar o cuidado, a formação nem o afeto e contenção que uma família generosamente outorga”.

“Exigimos, portanto, o veto supressivo total, porque o espírito deste projeto é essencialmente contrário à natureza humana, atenta contra a integridade das pessoas e resulta gravemente prejudicial para a família”.

O veto formulado pelo presidente Piñera

Daniela Constantino afirmou, durante a entrevista, que o veto formulado pelo presidente ao projeto de lei sobre Garantias da Infância consiste em propor diversas modificações ao projeto de lei. Segundo ela, de forma resumida, o governo propõe:

  1. Incluir um novo inciso final no artigo 5º, que estabeleça expressamente que o Estado deve cumprir as obrigações decorrentes desta lei de forma progressiva e em conformidade com as suas atribuições e meios.
  2. Substituir o segundo inciso do artigo 34º, relativo ao direito das crianças à proteção da privacidade e da própria imagem, por um novo parágrafo, no qual, em vez de se estabelecer que o exercício da proteção à própria imagem e à privacidade cabe às crianças, se estabeleça que cabe aos pais a proteção da privacidade e da própria imagem dos seus filhos, evitando assim que o papel fundamental que os pais desempenham na proteção, cuidados e formação dos seus filhos seja relegado a um papel secundário. Além disso, estabelece-se explicitamente que cabe ao Estado respeitar este papel.
  3. Acrescentar uma nova frase ao artigo 38º sobre o direito à saúde, unicamente com o objetivo de reconhecer expressamente o programa do Ministério da Saúde sobre imunizações, que permitiu diminuir a morbidade e mortalidade das doenças imunopreveníveis.
  4. Suprimir o nº 3 do artigo 49º sobre o direito das crianças à liberdade pessoal e ambulatória, com o objetivo de evitar que se gere uma nova ação de amparo e que com isso se gerem futuras confusões na sua aplicação em relação às crianças.
  5. Suprimir duas expressões contidas no artigo 50º sobre o devido processo, tutela judicial, efetiva e especialização, com o objetivo de reforçar a ´desjudicialização´ do sistema de garantias e, assim, evitar a judicialização da família.
  6. Acrescentar uma nova frase ao nº 5 do artigo 72º sobre o procedimento de proteção administrativa, com o objetivo de harmonizar o que está disposto neste número com o disposto no artigo 50º sobre o direito à representação judiciária das crianças.
  7. Suprimir o artigo 88ª, que prevê diversas alterações à Lei dos Tribunais de Família (Lei nº 19.968), uma vez que esta lei já está sendo revisada por ministros designados pelo Tribunal, pelo Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos e pelo Ministério do Desenvolvimento Social e da Família. Além disso, o presente projeto de lei já ordena que o Executivo apresente, no prazo de 18 meses a partir da publicação desta Lei, um projeto de lei para a adaptação das normas da Lei nº 19.968.

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