Cidade do México, 3 de nov de 2021 às 15:56
O núncio apostólico e representante do papa Francisco no México, dom Franco Coppola, revelou que até o momento existem 12 bispos investigados pela Igreja Católica por suposto encobrimento de casos de abuso sexual de menores e adultos vulneráveis no país.
As investigações, realizadas com base nas normas estabelecidas pelo papa Francisco em seus motus proprios "Como uma mãe amorosa" e "Vos estis lux mundi", estão em fases diferentes. Alguns casos ainda estão sendo estudados no México, outros já foram encaminhados à Santa Sé.
O papa Francisco assinou o documento "Como uma mãe amorosa" em 2016, estabelecendo que a negligência dos bispos em lidar com casos de abuso sexual pode justificar sua destituição.
Três anos depois, em 2019, o papa publicou Vos estis lux mundi, que estabelece que, quando as denúncias são dirigidas a bispos católicos, o arcebispo metropolitano da província eclesiástica a que pertence o acusado deve ser o encarregado da investigação.
No México existem atualmente 19 províncias eclesiásticas, chefiadas por 19 arquidioceses, que agrupam 73 dioceses e quatro prelaturas territoriais.
Dom Franco Coppola, de 64 anos, disse à ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, que “como prevê 'Como uma mãe amorosa', e como vimos pelas sentenças que foram emitidas no caso de alguns bispos de outros países, a pena eclesial, caso se constate que houve encobrimento e segundo o tipo de encobrimento, pode ir desde a advertência até a remoção do ofício”.
“O que acho importante destacar é que todas as denúncias recebidas estão sendo acompanhadas”, afirmou.
O núncio apostólico no México destacou que na Igreja do país “passos importantes foram dados” na luta para prevenir e combater o abuso sexual do clero, “mas devemos continuar nesta direção com ainda maior clareza e transparência na atitude de tolerância zero”.
“Devemos também começar a nos responsabilizar por uma justa reparação dos danos em favor das vítimas”, disse. “O caminho a percorrer para recuperar a confiança, especialmente das vítimas, de seu ambiente e dos não católicos ainda é longo”.
Nomeado núncio apostólico no México em 9 de julho de 2016, Coppola destacou que “a sensibilidade, a atenção e o cuidado cresceram muito para evitar que esses crimes se repitam”.
“Em quase todas as dioceses foi criada uma comissão para a proteção dos menores que, por um lado, recebe denúncias e cuida das vítimas e, por outro, se encarrega de difundir a cultura da prevenção nas instituições e estruturas eclesiásticas", disse ele.
“Também no nível dos seminários há uma atenção maior para cuidar da seleção das admissões e depois da preparação dos seminaristas, para que os novos sacerdotes sejam verdadeiros pastores segundo o coração de Jesus e não pessoas com problemas psicoafetivos não-resolvidos", destacou.
Dom Coppola especificou que “não posso dizer que não haja mais nenhum problema, mas reconheço que um grande esforço foi feito para alcançar o que o papa Francisco pede de toda a Igreja”.
Isso, disse ele, ocorreu "graças à sensibilidade de muitos bispos e à coragem das vítimas que, ao denunciar, nos permitiram perceber a necessidade de purificar nossos presbitérios e nosso modo de agir".
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Sobre o que leva clérigos a cometer abusos sexuais, o núncio apostólico respondeu que, sem ser um “especialista” no assunto, sua impressão “é que, quando se trata de abuso de menores ou adultos vulneráveis, existe um grave problema de desenvolvimento da personalidade do agressor, que busca relações assimétricas, que por isso não são de amor, mas de poder”.
Esse problema, destacou, não acabará “apenas com a boa vontade ou a intenção de mudar: viu-se que, embora o abusador prometa de boa fé mudar, acaba repetindo a ofensa”.
Para dom Coppola, é “um problema psicológico profundo que deve ser curado e por isso é incompatível com o exercício do ministério sacerdotal”.
“Por outro lado, isso também denota um problema afetivo não resolvido: se nosso coração não está cheio e transbordando do amor do Senhor, ele tenta se preencher de outra forma”.
“O mais normal e natural é através de outra pessoa, um adulto como eu, mas também existem formas doentias de afogar o problema no álcool ou exercendo o poder de forma anti-evangélica”, disse.
O núncio apostólico no México, que desde 2019 colocou o seu contato pessoal à disposição daqueles que queiram denunciar casos de abusos na Igreja, disse que “fiquei impressionado ao ouvir, de especialistas, relatos sobre os danos cerebrais e psicológicos informados pelas vítimas, às vezes até por muitos anos ou até por toda a vida”.
Depois de lamentar que, “sobretudo nos anos anteriores, existia uma certa superficialidade e desconhecimento das graves e duradouras consequências destes abusos”, disse dom Coppola que “a primeira coisa a fazer é formar e informar o nosso povo, os agentes pastorais e todas as pessoas comprometidas com a Igreja no cuidado especial que as crianças merecem, também sob este ponto de vista”.
“Por outro lado, temos que cuidar muito mais e melhor da formação humana e espiritual, que é a formação do coração”, destacou.
Para o núncio, os verdadeiros pastores devem ter “um coração que se sinta cheio, transbordando da parte do Senhor e que por isso não sinta a necessidade de ‘roubar’ a atenção, o afeto ou o prazer dos demais”.
Pelo contrário, disse ele, um verdadeiro pastor deve sentir “a necessidade de compartilhar o que recebeu, dando atenção e carinho e fazendo-se presente com o nosso pobre, como é a nossa vocação”. Compartilhar “o próprio Jesus, na sua forma de olhar, de agir, de estar presente com os demais, dando vida e não a roubando”.
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— ACI Digital (@acidigital) October 8, 2021