WASHINGTON DC, 21 de fev de 2022 às 15:21
Quando a irmã Deirdre “Dede” Byrne atendeu o telefone em dezembro de 2021, um homem do outro lado da linha disse a ela algo perturbador e difícil de acreditar.
"Minha mãe é médica. Você trabalhou com ela há mais de uma década no Afeganistão, em um acampamento americano perto do Paquistão. E agora a vida dela corre um grave perigo", disse ele à irmã.
Algumas pessoas poderiam ter desligado pensando que fosse trote, mas os detalhes chamaram a atenção da irmã Byrne. Como veterana militar, a freira viveu em Camp Salerno, a cerca de 10 km da fronteira com o Paquistão, por volta de 2008. Foi lá que ela se cruzou com a doutora M (seu nome completo é omitido por razões de segurança).
O homem do telefone prometeu que sua mãe enviaria um e-mail à irmã Byrne, com a confirmação de sua identidade. E no início de janeiro de 2022, um e-mail escrito em inglês ruim da médica afegã chegou à caixa de entrada da irmã Byrne dando mais detalhes e pedindo ajuda.
“Enfrentei uma situação mortal”, escreveu M, explicando que em 4 de outubro os radicais islâmicos do Talibã invadiram a casa dela e a prenderam por três dias. Ela está escondida desde a sua libertação.
O Talibã tomou o poder no Afeganistão depois da retirada dos militares dos EUA em 31 de agosto de 2021. A pequena comunidade de cristãos do Afeganistão, muitos dos quais arriscaram a própria vida ao se converter do Islã, está particularmente em risco. M e sua família são muçulmanos, mas tornaram-se alvos dos talibãs porque ela trabalhou com os americanos. O jornal The New York Times informou que cerca de 60 mil afegãos que trabalharam com as forças americanas e pediram vistos para ir para os EUA continuam no Afeganistão.
Em seu e-mail, a médica anexou capturas de tela de documentos de identificação, como seu passaporte, bem como uma digitalização de um Certificado de reconhecimento do Exército dos EUA, assinado pela própria irmã Byrne.
“Por favor, faça algo por mim e por minha família e nos tire do Afeganistão. Preciso de uma retirada urgente”, escreveu a médica.
No início de fevereiro, a M e sua família conseguiram sair do país, graças a uma organização sem fins lucrativos chamada Vulnerable People Project. Depois de uma fuga tensa, agora estão em uma casa segura em um país não revelado.
“É uma história milagrosa, honestamente”, disse a irmã Byrne à CNA, agência em inglês do grupo ACI. A freira disse ter agradecido ao Espírito Santo por usá-la para iniciar o resgate.
Irmã Byrne é membro das Pequenas Irmãs Operárias dos Sagrados Corações de Jesus e Maria, uma ordem religiosa dedicada ao serviço, oração e adoração eucarística, com sede em Washington, DC.
Ela serviu como médica do exército por quase 30 anos, chegando a ser coronel antes de se aposentar. Como cirurgiã missionária, ela fez inúmeras viagens para ajudar os doentes no Quênia, Haiti, Sudão e Iraque.
A irmã Byrne disse que se lembra de ter um ótimo relacionamento com os médicos afegãos com quem trabalhou durante seu serviço no Afeganistão, muitos dos quais falavam um bom inglês.
A freira disse que, quando o pedido da M chegou em sua caixa de entrada, ficou com o coração apertado: não tinha ideia de como facilitar uma retirada.
"Eu não sou ninguém, na verdade. Eu não sabia como poderíamos ajudar”, disse a irmã Byrne.
Então, ela consultou algumas pessoas. Pouco depois, um assessor do deputadao republicano de Nova Jersey, Chris Smith, a pôs em contato com Jason Jones, diretor do Vulnerable Persons Project (VPP). Desde a retirada dos EUA, o grupo vem fazendo campanha de arrecadação de doações para enviar carvão aos afegãos, onde milhares de crianças correm o risco de morrer de frio.
Jones disse à CNA que o VPP ajudava principalmente na entrega de alimentos e carvão aos afegãos necessitados, mas com um recente aumento de incidentes violentos contra cristãos e outras minorias, eles concentraram seus esforços em tirar pessoas vulneráveis do país.
Usando a rede de afegãos de confiança que eles criaram para entregar comida e suprimentos, o grupo conseguiu coordenar uma série de evacuações por terra.
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"É uma confiança que construímos com as pessoas ao longo do tempo, e acho que nosso programa de alimentos criou muita boa vontade para conosco em terreno afegão”, disse Jones, “as pessoas confiam em nós".
Por razões de segurança, o grupo mantém sigilo sobre os detalhes de como faz as retiradas, mas Jones disse que a sua equipe é formada em grande parte por afegãos resgatados. Um dos principais é Prince Wafa, um cidadão afegão-americano que trabalhou como tradutor para o exército dos EUA entre 2010 e 2014.
Wafa disse à CNA que, apesar de morar nos EUA desde 2014, teve que viajar para o Afeganistão no final de 2021 para ajudar a mulher a fugir. Com isso, começou uma terrível experiência de meses nos quais ficou preso no Afeganistão até outubro.
Mais tarde, os dois fugiram para um campo de refugiados no Catar, onde passaram 40 dias antes de retornar a San Diego em dezembro de 2021 com a ajuda do VPP.
Wafa agora coordena todas as evacuações do VPP do Afeganistão, usando conexões familiares porque "essas são as únicas pessoas em quem posso confiar".
“Lutamos contra isso há muito tempo. Só tentamos fazer o que podemos”, disse.
Quando o VPP aceitou o pedido da irmã Byrne, a equipe de Wafa conseguiu entregar um pacote de alimentos e carvão para M, seus filhos e netos em questão de horas.
“Podemos conseguir comida e carvão em qualquer lugar do Afeganistão em 24 horas, na maioria dos lugares. Então, em cerca de quatro horas, conseguimos entregar comida para eles”, disse Jones.
Depois, os contatos de Wafa se ofereceram para conseguir passaportes e vistos para M e sua família, o que levou algumas semanas, mas em 3 de fevereiro, tudo estava pronto para que pudessem fugir. Finalmente, em 8 de fevereiro, o grupo de 13 pessoas conseguiu sair do Afeganistão por uma rota terrestre, cruzando a fronteira em três carros.
“Já trabalhei com pessoas onde há muita conversa e nenhuma ação. Este grupo é muito pouca conversa, e muita ação. Fiquei tão impressionada”, disse a irmã Byrne.
Wafa e Jones destacaram que suas operações dependem das doações e pediram a todas as pessoas de boa vontade que possam doar.
O Afeganistão é mais de 99% muçulmano. Há cristãos, incluindo cerca de 200 católicos, budistas, hindus e outros.
Irmã Byrne disse que, durante seu tempo no exército, encontrou muitos afegãos que nunca haviam visto um cristão e nunca tinham ouvido falar de cristãos famosos como santa Teresa de Calcutá. Quando afegãos curiosos comentavam sobre seu comportamento gentil, ela explicava que era freira católica.
Confira também:
Esta freira aposentada, cirurgiã e militar aposentada falou na convenção republicana nos Estados Unidos https://t.co/F5fEqutRYt
— ACI Digital (@acidigital) August 27, 2020