A Star +, serviço da Disney exclusivo para a América Latina, lançou hoje o documentário "Amém: Perguntando ao Papa”, que apresenta uma conversa de mais de uma hora entre o papa Francisco e dez pessoas de diferentes partes do mundo, que o questionam sobre temas como o aborto, sexualidade, os abusos na Igreja e o papel da mulher.

O documentário de 83 minutos é dirigido pelos jornalistas espanhóis Jordi Évole e Màrius Sánchez. Foi gravado em junho de 2022 em um prédio no bairro de Pigneto, em Roma.

Os jovens que conversam com o papa são da Espanha, Senegal, Argentina, EUA, Peru, Equador e Colômbia.

O papa Francisco tem salário?

Segundo o Vatican News, a primeira pergunta dos jovens é se o papa recebe um salário.

“Não, não me pagam! E quando preciso de dinheiro para comprar sapatos ou outra coisa, vou e peço. Eu não tenho um salário, mas isso não me preocupa, porque sei que me dão de comer de graça", diz o papa Francisco, acrescentando que seu estilo de vida é bastante simples, "como aquele de um trabalhador de escritório", e que para uma despesa maior prefere pedir ajuda a outros e não à Santa Sé.

Com certa dose de ironia, o papa conta aos jovens o que faz quando uma organização precisa de ajuda financeira: “Você pede, digo a eles, que de qualquer maneira aqui dentro todos roubam! Então, eu sei onde se pode roubar e eu lhe envio o dinheiro. Com isso quero dizer que quando vejo que alguém precisa ser ajudado, então, sim, eu vou e peço ajuda à pessoa encarregada”.

O papa diz então que por vezes a Igreja “se oxida” porque se transforma “em um clube de boas pessoas, que realizam seus gestos religiosos”.

Quando isso acontece, continua, “falta a coragem de sair em direção às periferias. Para mim, isso é fundamental. Quando você olha a realidade do centro, sem querer você ergue barreiras de proteção, que o afastam da realidade e perde o sentido de realidade. Se você quer ver qual é a realidade, vá para a periferia. Você quer saber o que é a injustiça social? Vá para a periferia. E quando eu digo periferia, não estou falando apenas de pobreza, mas de periferias culturais, existenciais”.

Migração e racismo

Medha, uma menina de origem indiana nascida nos EUA, oferece seu testemunho sobre migração e racismo, ao qual o papa Francisco responde denunciando a exploração das pessoas.

“Isto acontece hoje, acontece nas fronteiras da Europa, e às vezes com a cumplicidade de algumas autoridades que os enviam de volta. Há países na Europa, não quero nomeá-los para não criar um caso diplomático, que têm pequenas cidades ou aldeias quase vazias, países onde há apenas vinte pessoas idosas e campos não cultivados. E estes países, que estão passando por um inverno demográfico, nem sequer recebem migrantes”, diz Francisco.

Os jovens questionam o papa sobre o papel da Igreja na época da colônia, ao que o papa diz que tenta limpar a mundanidade espiritual que encontrou no Vaticano.

“A reforma da Igreja deve começar de dentro, e a Igreja deve ser sempre reformada, sempre, porque à medida que as culturas progridem, as exigências mudam”, diz.

Dora, uma evangélica equatoriana, narra sua experiência com o bullying, que a levou até a pensar em tirar a própria vida; e o papa a ouve e a consola.

Aborto: É lícito eliminar uma vida humana para resolver um problema?

O diálogo sobre o aborto começa com uma argentina que se diz catequista católica colocando um lenço verde nas mãos do papa, com a frase "aborto livre, seguro e gratuito". Depois disso começa um diálogo entre as mulheres do grupo. Só uma se diz a favor da vida.

O papa disse: “Sempre digo aos padres que quando se aproximam de uma pessoa nesta situação, com um peso na consciência, porque a marca que um aborto deixa numa mulher é profunda, que por favor não lhe façam muitas perguntas e sejam misericordiosos, como Jesus é”.

“Mas o problema do aborto deve ser visto cientificamente e com uma certa frieza. Qualquer livro sobre embriologia nos ensina que no mês da concepção o DNA já está delineado e os órgãos já estão definidos. Portanto, não é um aglomerado de células que se unem, mas uma vida humana”, continua.

O papa Francisco então faz duas perguntas: “É lícito eliminar uma vida humana para resolver o problema? Ou se recorrer a um médico, é lícito contratar um assassino para eliminar uma vida humana para resolver um problema?"

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Referindo-se ao drama das mulheres que enfrentam uma gravidez indesejada, o papa disse que “é bom chamar as coisas pelo seu nome. Uma coisa é acompanhar a pessoa que o fez, outra bem diferente é justificar o ato”.

Abusos na Igreja

Juan, um espanhol, conta a Francisco que quando ele tinha onze anos foi abusado em várias ocasiões por um numerário da Opus Dei que trabalhava como professor em sua escola. Ele mostra ao papa uma carta escrita pelo próprio papa, na qual Francisco diz que a Congregação – hoje Dicastério – para a Doutrina da Fé havia decidido que a um professor de uma escola da Opus Dei na Espanha, acusado de abuso, deveria ser restituído o bom nome, exonerando-o da responsabilidade.

Francisco se comprometeu a rever o caso, mas outros o contestam pela resposta geralmente negligente da Igreja ao abuso de menores por parte de seus ministros. 

“Estes casos de abuso de menores não caiam em prescrição. E se com os anos caem em prescrição, eu levanto automaticamente tal prescrição. Não quero que isto jamais caia em prescrição”, diz o papa Francisco.

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Toda pessoa é um filho de Deus

Celia, uma espanhola que se diz não-binária e cristã, pergunta ao papa se ele sabe o que significa ser não-binário, ao que o papa Francisco responde que sim, mas ela também comenta que "uma pessoa não-binária é alguém que não é homem nem mulher, ou, pelo menos, não é o tempo todo”.

Então ela quer saber se há espaço na Igreja para a diversidade sexual e de gênero, e o papa responde: “cada pessoa é filho de Deus, cada pessoa. Deus não rejeita ninguém, Deus é Pai. E eu não tenho o direito de expulsar ninguém da Igreja. Não só isso, meu dever é sempre o de acolher. A Igreja não pode fechar a porta a ninguém. A ninguém".

O papa critica aqueles que rejeitam essas pessoas e diz que “estas pessoas são infiltradas que se aproveitam da Igreja para suas paixões pessoais, para a sua estreiteza pessoal. É uma das corrupções da Igreja”.

Sacerdócio para as mulheres?

Ao falar sobre se o sacerdócio pode ser aberto às mulheres, o papa diz que "não é melhor ser sacerdote do que não ser", e recorda que a teologia ensina que este é um ministério reservado aos homens.

O papa fala da importância da maternidade feminina e recorda que a Igreja é mãe. “É a Igreja e não o Igreja”, diz.

A beleza da sexualidade humana diante da pornografia

Uma colombiana chamada Alejandra conta ao papa que cria conteúdo de pornografia e depois o distribui nas redes sociais, um trabalho que, segundo ela, lhe permitiu valorizar-se mais e passar mais tempo com sua filha.

O papa escuta com atenção, avalia a importância das redes e responde: “Se você através da rede vende drogas, por exemplo, você está intoxicando os jovens, está causando danos, está fomentando um crime. Se você, através da rede, estabelece contatos mafiosos para criar situações sociais, é imoral. A moralidade da mídia depende do uso que você faz dela”

“Aqueles que são viciados em pornografia são como ser viciados em uma droga que os mantém em um nível que não os deixa crescer”, acrescenta.

O papa Francisco diz então que “o sexo é uma das coisas belas que Deus deu à pessoa humana. Expressar-se sexualmente é uma riqueza. Portanto, qualquer coisa que menospreze a real expressão sexual também menospreza você, e empobrece essa riqueza em você”

“O sexo tem sua própria dinâmica; tem sua própria razão de ser. A expressão do amor é provavelmente o ponto central da atividade sexual. Portanto, qualquer coisa que o arraste para longe de você e o afaste dessa direção diminui a atividade sexual".

Francisco disse que a catequese sobre o sexo ainda é muito fraca e que os fiéis devem se concentrar em um ensinamento cada vez mais sólido.

O testemunho cristão

Maria, uma católica, conta que a fé dá sentido à sua vida e o papa recorda-lhe que não é fácil dar testemunho.

“O testemunho de fé que você dá toca meu coração, porque é preciso coragem para dizer o que você está dizendo neste encontro. Obrigado por seu testemunho”, diz o papa.

“Não quero assustá-la, mas reúna suas forças e prepare-se para as provas. Continue a fazer bem estas coisas, mas quando a prova chegar, não tenha medo, porque mesmo no momento de escuridão há o Senhor, que está ali escondido”, acrescenta o papa.

Lucía, uma jovem peruana que sofreu abuso psicológico em uma comunidade religiosa e que aparece no documentário abraçada a outra menina, diz que está mais feliz agora que não é crente.

Francisco não tenta convencê-la do contrário. Na verdade, ele lhe diz que muitas vezes a verdadeira coragem consiste em abandonar o que nos prejudica, em nos distanciarmos: "Este lugar mau, este lugar de corrupção, este convento me desumaniza, vou voltar para onde comecei, para buscar a humanidade de minhas raízes. Isto não me escandaliza', diz-lhe o papa.

Para concluir o diálogo, o papa recorda que o caminho da Igreja é o da fraternidade, e isso não deve ser negociado.

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