MADRI, 4 de mai de 2023 às 13:52
A arquidiocese de Toledo, Espanha, publicou um documento com orientações sobre a ação dos leigos católicos que exercem uma vocação política.
O documento se baseia no "Instrumento de trabalho da pastoral da pessoa, da família e da sociedade" aprovado pela Conferência Episcopal Espanhola.
1 A Igreja não tem um programa político, pois todo compromisso “deve partir de uma resposta fiel a um chamado pessoal e deve ser guiado pela luz da fé e do Evangelho”.
Como disse são João Paulo II em “Novo millennio ineunte”: “Não se trata de inventar um ‘programa novo’. O programa já existe: é o mesmo de sempre, expresso no Evangelho e na Tradição viva. Concentra-se, em última análise, no próprio Cristo, que temos de conhecer, amar, imitar”.
2 A vocação política inscreve-se na “missão específica dos fiéis leigos: expandir o Reino de Deus”, gerindo as realidades temporais e “reordenando-as”.
Neste sentido, o leigo conta com a Doutrina Social da Igreja (DSI), “que constitui parte essencial da mensagem cristã”, pois “não há solução para a questão social fora do Evangelho”.
3 A Igreja Católica entende que a autoridade política e seu exercício, que se expressa nos poderes públicos, “são uma peça fundamental na construção da sociedade”.
4 Os católicos têm legitimidade para intervir de forma ativa e liderar os processos de mudança social “a partir do diálogo, da razão e da fé, superando o confronto”, sabendo que “Jesus Cristo é o Senhor da história”.
5 A DSI contém uma concepção integral da pessoa, da família e dos elementos que estruturam a sociedade e "aspira a ser uma orientação e um estímulo para a ação".
Os leigos católicos são chamados "ao anúncio dessa 'ordem' em sua verdade, bem e beleza", mas também "a denunciar a desordem" e a formular propostas de raízes cristãs.
6 O documento diz que os cristãos “contamos com plena legitimidade para apresentar as nossas propostas públicas”, que só deveriam ser julgadas pelos seus efeitos potenciais ou reais e não pela sua proveniência.
Para a Igreja Católica “a liberdade política não é e não pode se basear na ideia relativista, segundo a qual todas as concepções sobre o bem do homem são igualmente verdadeiras e têm o mesmo valor”.
7 Do ponto de vista do quadro jurídico-institucional, a Igreja Católica entende que a política “está a serviço da pessoa, da família e da sociedade e não o contrário”. Consequentemente, o estatismo e o totalitarismo são rejeitados.
Considera-se que “o bem comum é o fim da comunidade política” e que “ter um projeto nacional a longo prazo faz parte dele”. Portanto, afirma o documento, "o separatismo não é admissível". Essa orientação é particularmente importante para a Espanha, que convive com movimentos separatistas ativos em regiões como a Catalunha e a região basca.
8 A Igreja valoriza a democracia como fórmula de eleição e substituição de governantes.
No entanto, “é preciso que seja bem fundamentada” para que não se torne “uma forma de totalitarismo encoberta” ou uma “ditadura do relativismo”.
Exorta-se “a discordar de uma concepção de pluralismo baseada no relativismo moral”, uma vez que a vida democrática necessita de princípios éticos que “não são negociáveis”.
9 Há muitos lugares na vida política em que um católico pode se envolver. Neles “são frequentes as tentações do egoísmo, da corrupção, do carreirismo e da idolatria do poder”.
No entanto, isso "não justifica a ausência de cristãos na arena pública ou seu ceticismo sobre esta esfera decisiva da atividade humana".
10 A Igreja exige dos partidos “democracia interna, a maior transparência possível e a prestação de contas em seu funcionamento”.
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Ao mesmo tempo, rejeita a partidocracia "que visa apropriar-se das instituições públicas" e o partidarismo, entendido como "a submissão" de militantes e funcionários públicos "à ideologia do partido e às ordens de sua autoridade máxima".
11 O católico com possibilidade de elaborar políticas públicas deve buscar promover a dignidade da pessoa, defender a vida, cuidar dos pobres, estabelecer uma perspectiva familiar ou alertar sobre a crise demográfica.
Outras áreas de interesse essenciais são o trabalho, a promoção de uma “consideração moral da economia” e a promoção de áreas educativas e culturais que “constituem o melhor investimento público e privado numa sociedade”.
12 A Igreja Católica não se confunde com a comunidade política "nem está ligada a nenhum sistema político". Embora estejam a serviço do homem e da sociedade, ambas são independentes. Este objetivo será alcançado com mais eficácia "quanto mais saudável e melhor seja a cooperação” entre elas.
13 A Igreja Católica não tem a missão de constituir partidos políticos ou sindicatos. A presença dos leigos não é unívoca e “nenhuma proposta política concreta esgota a riqueza do Evangelho”.
14 Quanto à presença do clero nas atividades políticas, a Igreja “vigia para que os seus párocos não assumam uma atividade de representação política pública”, conforme estabelece o “Diretório para o ministério e a vida dos presbíteros”.
O Código de Direito Canônico estabelece que os leigos devem evitar “apresentar seus próprios critérios como doutrina da Igreja”, especialmente em questões de opinião.
Na medida em que os leigos assumem tarefas de representação eclesiástica, devem separá-las do exercício da atividade política; ainda mais aqueles que fazem parte da cúria pastoral.
15 Os católicos na política devem estar cientes de que se trata de um chamado à santidade que requer uma formação adequada e o cultivo do espírito de serviço, humildade, coragem, astúcia ou bondade.
Dentro da variedade de opções legítimas, devem saber entre eles que “o que nos une é mais forte do que o que nos separa”.
O documento diz que é preciso distinguir entre o erro, “que deve ser sempre rejeitado”, e a pessoa que erra, que merece respeito pela sua dignidade.
16 Por fim, o documento propõe uma série de diretrizes para a ação política, como a de que “a caridade não é o começo só das microrrelações”, mas também das relações sociais.
Incentiva a agir a partir do diálogo “criando uma cultura do encontro” e também levando em conta a possibilidade da cruz, da perseguição e do martírio, como aconteceu com são Tomás More, padroeiro dos políticos. More foi condenado à morte e executado por ter se recusado a aderir à decisão do rei Henrique VIII, que, em 1534, declarou-se chefe da Igreja da Inglaterra, separando-a da Igreja Universal.
Os católicos que trabalham na esfera política devem agir com prudência "para discernir o verdadeiro bem em cada circunstância e escolher os meios adequados" de modo a alcançar o maior bem possível ou buscando a maior limitação dos danos.
O último critério de ação é fazer as mudanças “a partir de dentro, por meio de reformas graduais, nunca por meio da revolução que só traz males maiores”.
Confira também:
O que São Tomás More diria ao Caminho Sinodal alemão https://t.co/9QnrfJiKlm
— ACI Digital (@acidigital) May 11, 2021