A madre abadessa Cecilia Snell segurava uma lanterna com luz fraca ao espiar pela primeira vez dentro da tampa rachada do caixão e viu um pé humano dentro de uma meia preta onde se esperaria encontrar apenas ossos e poeira. Ela não disse nada.

Em vez disso, ela deu um passo para trás, se recompôs e se inclinou para dar outra olhada, só para ter certeza. Então ela gritou de alegria.

“Nunca esquecerei aquele grito enquanto eu viver”, recorda a prioresa irmã Scholastica Radel, que estava entre os membros das beneditinas de Maria, Rainha dos Apóstolos presentes na exumação dos restos mortais de sua fundadora, a irmã Wilhelmina Lancaster.

“Foi um grito muito diferente de qualquer outro grito”, concorda a abadessa. “Nada como se visse um rato ou algo assim. Foi um grito de pura alegria. 'Eu consigo ver o pé dela!'”.

O que as freiras descobriram naquele dia chamaria a atenção mundial: cerca de quatro anos após seu enterro em um simples caixão de madeira, o corpo não embalsamado da irmã Wilhelmina parecia estar muito intacto.

Em uma entrevista exclusiva para o programa televisivo EWTN News In Depth, da EWTN, grupo de comunicação ao qual pertence ACI Digital, as duas freiras compartilharam detalhes de sua notável descoberta – revelando, entre outras coisas, que o corpo da irmã Wilhelmina não exibe a rigidez muscular de rigor mortis – e refletiram sobre o significado mais profundo do fenômeno que ocorre na abadia de Nossa Senhora de Éfeso, na zona rural de Gower, no estado americano do Missouri.

Elas também esclareceram que o caixão da irmã Wilhelmina foi exumado em 28 de abril, quase três semanas antes do que a CNA, agência em inglês do grupo EWTN, havia entendido. As irmãs disseram que demorou cerca de duas semanas para remover a sujeira, o mofo e o bolor antes de levarem o corpo para a igreja.

Peregrinos visitam o corpo da irmã Wilhelmina Lancaster, fundadora das irmãs Beneditinas de Maria, Rainha dos Apóstolos, em Gower, Missouri (EUA). - Foto: EWTN News

 

Um fato de particular importância para as irmãs da ordem contemplativa, conhecida por suas gravações populares de cantos gregorianos e sua devoção à missa tradicional em latim, é que o hábito tradicional de sua fundadora afro-americana também está surpreendentemente bem preservado.

“Está em melhores condições do que a maioria dos nossos hábitos”, disse a madre Cecília a Catherine Hadro, da EWTN.

"Isso não é possível. Quatro anos em um caixão molhado, arrombado com muita sujeira, todas as bactérias, todo o mofo, todo o bolor – completamente intacto, cada fio”.

Para as irmãs, o simbolismo é profundo. Nascida em St. Louis, a irmã Wilhelmina passou 50 anos em outra ordem religiosa, mas saiu após a ordem dispensar a exigência de usar o hábito convencional e alterar outras práticas estabelecidas há muito tempo. Ela fundou as Beneditinas de Maria em 1995, aos 70 anos.

“É muito apropriado, porque foi por isso que a irmã Wilhelmina lutou durante toda a sua vida religiosa”, disse a madre Cecília sobre o hábito.

“E agora é isso o que está em destaque. Foi isso que ela assumiu para mostrar ao mundo que pertencia a Cristo, e é isso que ela ainda mostra ao mundo. Mesmo em seu estado, mesmo após a morte, quatro anos após a morte, ela ainda mostra ao mundo quem ela é. Ela é uma noiva de Cristo e nada mais importa”, disse a irmã Scholastica.

“Eu olhei duas vezes”

A comunidade beneditina exumou a irmã Wilhelmina após decidir transferir seus restos mortais para o novo santuário de São José dentro da igreja da abadia, um costume comum para homenagear os fundadores das ordens religiosas, disseram as irmãs.

Os próprios membros da comunidade escavavam, “um pouco a cada dia”, disse a madre Cecília. O processo começou em 26 de abril e culminou com cerca de meia dúzia de irmãs usando correias para tirar o caixão do chão em 28 de abril.

A abadessa revelou que havia um sentimento de expectativa entre as irmãs para ver o que havia dentro do caixão.

“Havia uma sensação de que talvez Deus fizesse algo especial porque ela era tão especial e tão pura de coração”, disse a madre Cecília.

Foi a abadessa quem primeiro olhou pela tampa rachada, apontando sua lanterna para o caixão escuro.

“Então eu olhei e olhei duas vezes e recuei um pouco. 'Acabei de ver o que acho que vi? Porque acho que acabei de ver um pé completamente intacto ainda com uma meia preta'”, ela se lembra de ter dito a si mesma.

Procissão das irmãs Beneditinas de Maria, Rainha dos Apóstolos, com o corpo da irmã Wilhlelmina Lancaster em 29 de maio de 2023. - Foto: Joe Bukuras/CNA

 

As irmãs descobriram que as feições da irmã Wilhelmina eram claramente reconhecíveis e até suas sobrancelhas e cílios ainda estavam lá. Não apenas isso, mas suas meias, seu escapulário marrom, sua medalha milagrosa, seu rosário, sua vela de profissão e a fita em volta da vela – nada disso havia se deteriorado.

A coroa de flores colocada em sua cabeça para seu enterro também havia sobrevivido. Estava seca, mas ainda era visível. No entanto, as irmãs notaram que o forro de tecido do caixão havia se desintegrado, assim como uma tira de linho novo que as irmãs disseram ter usado para manter a boca da irmã Wilhelmina fechada.

“Portanto, acho que tudo o que nos restou foi um sinal de sua vida, enquanto tudo o que pertencia à sua morte se foi”, reflete a irmã Scholastica.

Segundo a irmã Scholastica, ao contrário do que se esperaria no caso de um cadáver de quatro anos, o corpo da irmã Wilhelmina é “muito flexível”.

“Quero dizer, você pode pegar a perna dela e levantá-la”, observou a madre Cecília.

EWTN News In Depth também conversou com Shannen Dee Williams, autora e estudiosa especialista na história do catolicismo negro. Ela disse que a história da irmã Wilhelmina é um lembrete importante da “grande diversidade e beleza da experiência católica negra em todo o espectro”.

 

“Um momento de unificação”

Não houve nenhuma declaração formal das autoridades da Igreja de que o corpo da irmã Wilhelmina esteja incorrupto, nem uma análise independente foi conduzida de seus restos mortais, cuja condição intrigou até mesmo alguns agentes funerários experientes. Também não há em andamento nenhum processo oficial de canonização da freira afro-americana.

Mas isso não impediu que milhares de peregrinos viajassem ao noroeste do Missouri para ver o corpo da irmã Wilhelmina, que foi transferido para uma urna de vidro na igreja da abadia em 29 de maio. E dentro das paredes da abadia, há um sentimento penetrante de alegria, gratidão e admiração.

Peregrinos visitam o corpo da irmã Wilhlemina Lancaster. - Foto: EWTN News

 

Na entrevista, a madre Cecília disse que o que está acontecendo na abadia é “um momento de unificação para todos” em tempos de discórdia.

“Há tanta divisão e é uma loucura. Cada um de nós é filho de Deus Pai. E então você vê que a irmã Wilhelmina está reunindo a todos... Quer dizer, isso é o amor de Deus derramado através de pessoas de todas as raças e cores”, disse.

“Eles vêm e ficam maravilhados, e isso os faz refletir”, disse a abadessa. “Isso os faz pensar em Deus, sobre: ‘por que estamos aqui? Existe mais do que apenas meu telefone, meu trabalho e minhas próximas férias?'”.

Quanto ao que vem a seguir, ninguém pode dizer. “Nós amamos muito a Deus, Seu senso de humor, a ironia. Essa humilde freira negra escondida em um mosteiro é um catalisador para isso. É como uma faísca para lançar fogo ao mundo”, disse a madre Cecília.

"É simplesmente notável", disse. “Mas esse é o tipo de coisa que Deus faz quando precisamos de um alerta”.

 

 

Confira também:
 

Corpo da irmã Wilhelmina é colocado em urna de vidro após procissão solene nos EUA https://t.co/0YfYaZ3VYh

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