4 de set de 2023 às 13:46
No último dia da sua viagem à Mongólia, o papa Francisco abençoou e inaugurou a Casa da Misericórdia destinada a acolher temporariamente desabrigados e vítimas de violência doméstica. O papa Francisco disse que nas palavras que dão nome ao lugar “está a definição da Igreja”.
A Igreja, disse o papa, “é chamada a ser morada acolhedora onde todos podem experimentar um amor superior que toca e que move o coração: o amor terno e providente do pai, que nos quer irmãos, nos quer irmãs”.
A Casa da Misericórdia, que fica na zona central de Ulan Bator, capital da Mongólia, funcionará no que antes era uma escola dirigida pelas Irmãs Hospitaleiras de São Paulo de Chartres, graças ao apoio das Pontifícias Obras Missionárias da Austrália, “Catholic Mission”. Surgiu como uma iniciativa da comunidade católica local, chefiada pelo prefeito apostólico de Ulan Bator, cardeal Giorgio Marengo.
Francisco chegou ao local por volta das 9h30 (hora local), e foi recebido numa cerimônia que incluiu cantos e danças por crianças que participam na estrutura educativa católica da Mongólia.
Em sua mensagem de boas-vindas, o diretor da Casa da Misericórdia, o irmão Andrew Tran Le Phuong, salesiano, disse que o lugar procura "alcançar aqueles que, de alguma forma, se sentem marginalizados da sociedade. Criamos um lar onde todos são bem-vindos".
“A nossa esperança é criar um local de refúgio para pessoas vulneráveis, especialmente mulheres e crianças, para que possam reunir-se num ambiente amoroso e sentir-se valorizados, seguros e em paz”, disse ele.
O papa também ouviu testemunhos como o de irmã Verônica Kim, religiosa das Irmãs Hospitaleiras de São Paulo de Chartres, que há oito anos se dedica ao cuidado gratuito dos indigentes na Clínica Santa Maria da Mongólia.
Lúcia Otgongerel, da paróquia de Santa Maria em Ulan Bator, “sétima numa família de oito”, se disse feliz por “falar aqui em nome de milhares de pessoas com deficiência”: “Faltam-me dois braços e duas pernas, mas quero dizer que sou a pessoa mais sortuda do mundo, porque tomei a decisão de aceitar plenamente o amor de Deus, o amor de Jesus”.
O papa agradeceu “o acolhimento, o canto, a dança, a saudação de boas vindas e os seus testemunhos! Creio que isto se pode resumir nas seguintes palavras de Jesus: “Tive fome e destes me de comer, tive sede e destes me de beber”.
“Essa verdade foi tomada a sério pela Igreja desde a sua origem, demonstrando em atos que a dimensão caritativa está na base da sua identidade. A dimensão caritativa está na base da Igreja”, disse o papa. “É maravilhoso ver que, depois de tantos séculos, o mesmo espírito permeia a Igreja na Mongólia: na sua pequenez, vive de comunhão fraterna, de oração, de serviço desinteressado à humanidade sofredora, e de testemunho da própria fé”, acrescentou.
Francisco falou também que no trabalho de caridade “é indispensável o voluntariado. Ou seja, o serviço gratuito e desinteressado que as pessoas decidem livremente oferecer a quem é necessitado, não na base de uma compensação financeira ou qualquer forma de retribuição individual, mas por puro amor ao próximo”.
“Este é o ‘estilo’ de Jesus nos ensinou dizendo: ‘Recebestes de graça, dai de graça’”.
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“Este modo de servir parece uma aposta perdedora, mas quanto apostamos, descobre-se que aquilo que se dá sem esperar retribuição não é desperdiçado. Pelo contrário, torna-se uma grande riqueza para quem oferece tempo e energias. De fato, a gratuidade torna leve o espírito, cura as feridas do coração, aproxima de Deus”, disse o papa.
“Neste país cheio de jovens, dedicar-se ao voluntariado pode ser uma via decisiva de crescimento pessoal e social”, acrescentou.
Segundo o papa, “o verdadeiro progresso das nações não se mede pela riqueza econômica, e menos ainda pelo valor investido na força ilusória dos armamentos, mas pela capacidade de prover a saúde e a educação, e ao crescimento integral do povo”.
Depois Francisco desmentiu três “mitos” sobre a caridade e a Igreja. “Em primeiro lugar, o mito segundo o qual apenas as pessoas ricas podem se comprometer no voluntariado. A realidade aponta para o contrário. Não é preciso ser rico para fazer o bem; aliás, são quase sempre as pessoas comuns que dedicam tempo, conhecimentos e coração para cuidar dos outros”, disse.
Para o papa, “o segundo mito a se dissipar é o de que a Igreja Católica, que no mundo se distingue pelo seu grande empenho em obras de promoção social, faz tudo isso por proselitismo, como se cuidar do outro fosse uma forma de convencer a outros”.
“Não, os cristãos reconhecem quem está em necessidade e fazem todo o possível para aliviar os seus sofrimentos, porque ali veem Jesus, o Filho de Deus, e n’Ele a dignidade de cada pessoa, chamada a ser filho ou filha de Deus”, disse ele.
Segundo o papa, “um terceiro mito a dissipar: os únicos que contariam seriam os meios econômicos, como se a única forma de cuidar do outro fosse o recurso ao pessoal assalariado e o investimento em grandes estruturas”.
“Claro que a caridade exige profissionalismo, mas as iniciativas de beneficência não devem tornar-se empresas, mas conservar o frescor de obras onde o necessitado encontre pessoas capazes de escuta e capazes de compaixão, independentemente de qualquer compensação”, disse.
“Ou seja, indispensável para fazer verdadeiramente o bem, é um coração bom, decidido a procurar aquilo que é melhor para o outro”, disse.
No final, Francisco recordou um episódio da vida de santa Teresa de Calcutá: “Uma vez um jornalista, vendo-a curvada sobre a ferida mal odorante de um paciente, disse-lhe: ‘’O que faz é belíssimo. Mas eu, pessoalmente, não o faria nem por um milhão de dólares’. E madre Teresa respondeu: ‘Por um milhão de dólares, eu também não faço. Eu faço por amor de Deus’”.
“Eu rezo para que este estilo de gratuidade seja a ‘mais-valia’ da Casa da Misericórdia. Por todo o bem que vocês fizeram, e vocês farão, eu lhes agradeço de coração e lhes abençoo. E, por favor, tenham também a caridade de rezar por mim”, concluiu o papa.
Francisco doou uma pintura do ícone de Nossa Senhora da Ternura, cuja pintura original a tradição atribui ao evangelista são Lucas.