27 de set de 2023 às 08:34
Como é costume ao voltar de uma viagem apostólica, o papa Francisco dedicou a catequese da Audiência Geral de hoje (27) a falar sobre a sua visita a Marselha, onde esteve na sexta-feira (22) e no sábado (23).
Abaixo, a catequese do papa Francisco:
Estimados irmãos e irmãs!
No final da semana passada fui a Marselha para participar na conclusão dos Rencontres Méditerranéennes, que contou com a participação de Bispos e Presidentes de câmaras municipais da área do Mediterrâneo, com muitos jovens, a fim de que o olhar se abrisse para o futuro. Com efeito, o evento de Marselha intitulava-se “Mosaico de esperança”. Eis o sonho, eis o desafio: que o Mediterrâneo recupere a sua vocação de ser laboratório de civilização e de paz.
Como sabemos, o Mediterrâneo é berço de civilização, e um berço é para a vida! Não é tolerável que se torne um túmulo, nem um lugar de conflito. O Mar Mediterrâneo é o mais oposto que existe ao conflito de civilizações, à guerra, ao tráfico de seres humanos. É exatamente o contrário, porque o Mediterrâneo põe em comunicação a África, a Ásia e a Europa; o norte e o sul, o oriente e o ocidente; as pessoas e as culturas, os povos e as línguas, as filosofias e as religiões.
Certamente, o mar é sempre, de algum modo, um abismo a superar, e pode tornar-se também perigoso. Mas as suas águas preservam tesouros de vida, as suas ondas e os seus ventos transportam embarcações de todos os tipos. Em resumo: é lugar de encontro e não de confronto, de vida e não de morte.
Da sua margem oriental, há dois mil anos, partiu o Evangelho de Jesus Cristo, para anunciar a todos os povos que somos filhos do único Pai que está nos céus, e que somos chamados a viver como irmãos e irmãs; que o amor de Deus é maior que nossos egoísmos e que nossos fechamentos e, com a ajuda de sua misericórdia, é possível uma convivência humana justa e pacífica.
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Naturalmente, isso não acontece por magia, nem se realiza de uma vez por todas. É o fruto de um caminho em que cada geração é chamada a percorrer um trecho, lendo os sinais dos tempos em que vive.
O encontro de Marselha seguiu-se a outros semelhantes, que tiveram lugar em Bari, em 2020, e em Florença, no ano passado. Não se tratava de um acontecimento isolado, mas de um passo em frente num itinerário que teve o seu início nos “Colóquios do Mediterrâneo”, organizados pelo Presidente da câmara municipal, Giorgio La Pira, em Florença, no final da década de 1950 do século passado. Mais um passo para responder, hoje, ao apelo lançado por São Paulo VI na sua Encíclica Populorum progressio, a fim de promover «um mundo mais humano para todos, um mundo em que todos tenham algo para dar e receber, sem que o progresso de uns constitua um obstáculo para o desenvolvimento de outros» (n. 44).
O que resultou do evento de Marselha? Resultou um olhar sobre o Mediterrâneo, que definiria simplesmente humano, não ideológico, não estratégico, não politicamente correto nem instrumental, humano, isto é, capaz de remeter tudo para o valor primordial da pessoa humana e da sua dignidade inviolável. Depois, ao mesmo tempo, resultou um olhar de esperança. Hoje isto é deveras surpreendente: quando escutamos testemunhas que passaram por situações desumanas ou que as compartilharam, e precisamente delas recebemos uma “profissão de esperança”. E é também um olhar de fraternidade.
Irmãos e irmãs, esta esperança, esta fraternidade, não deve “evaporar-se”, não, pelo contrário, deve organizar-se, concretizar-se em ações a longo, médio e curto prazo. Para que as pessoas, em plena dignidade, possam optar por emigrar ou não emigrar. O Mediterrâneo deve ser uma mensagem de esperança.
Mas há outro aspeto complementar: é preciso restituir esperança às nossas sociedades europeias, especialmente às novas gerações. Com efeito, como podemos acolher os outros, se nós próprios não tivermos um horizonte aberto ao futuro? Como podem jovens sem esperança, fechados na vida particular, preocupados em gerir a sua precariedade, abrir-se ao encontro e à partilha? Muitas vezes as nossas sociedades doentes de individualismo, de consumismo e de evasões vazias precisam de se abrir, de oxigenar a alma e o espírito, e assim poderão ler a crise como oportunidade e enfrentá-la de maneira positiva.
A Europa tem necessidade de reencontrar paixão e entusiasmo, e posso dizer que os encontrei em Marselha: no seu Pastor, Cardeal Aveline, nos sacerdotes e nos consagrados, nos fiéis leigos comprometidos na caridade, na educação, no povo de Deus que demonstrou muito entusiasmo na missa no Estádio Vélodrome. Agradeço a todos eles e ao Presidente da República que, mediante a sua presença, testemunhou a atenção de toda a França para o evento de Marselha.
Possa Nossa Senhora, que os marselheses veneram como Notre-Dame de la Garde, acompanhar o caminho dos povos do Mediterrâneo, para que esta região se torne aquilo que sempre foi chamada a ser: um mosaico de civilização e de esperança!