10 de out de 2023 às 12:23
O ex-frade franciscano Leonardo Boff, de 84 anos, marcou presença virtual ontem (9) em Roma falando de ecologia em um evento paralelo ao Sínodo da Sinodalidade convocado pelo papa Francisco. Desde a queda do Muro de Berlim, em 1989, que marcou o fim da experiência socialista na Europa, Boff se afastou da Teologia da Libertação de cunho marxista da qual foi o mais proeminente praticante no Brasil, e começou a se dedicar ao ambientalismo.
Ontem, Boff reciclou a discussão online sobre Laudato sì, a encíclica de 2015 do papa Francisco, que gravou com o professor universitário canadense Mark Hathaway em 2020 para o evento Direitos Humanos na Igreja Católica Emergente.
O evento da organização internacional Spirit Unbounded se apresenta como uma “assembleia sinodal liderada por leigos” que, parcialmente ao vivo, mostrará 150 palestrantes de 8 a 14 de outubro. Entre os palestrantes estão o teólogo leigo venezuelano Rafael Luciani, que também participa do Sínodo da Sinodalidade oficial como especialista/facilitador escolhido pelo papa, a ex-presidente da Irlanda Mary McAleese, Cherie Blair, mulher do ex-primeiro-ministro do Reino Unido Tony Blair, Jamie Manson, presidente da organização americana Catholics for Choice de defesa do aborto, e muitos outros.
O encontro paralelo de dissidentes católicos usa como seu próprio instrumento de trabalho o Texto de Bristol pela Reforma, que se descreve como “produzido pelos 16 meses de ampla jornada sinodal liderada por leigos entre outubro de 2020 e fevereiro de 2022”.
O texto diz que seus autores querem “assegurar aos católicos comuns que há mudanças que podemos fazer em nossa prática que estão em linha com a melhor tradição católica e tem o endosso de pensadores e teólogos profundos, pastoralmente sensíveis e bem informados, incluindo alguns que são clérigos”.
O Texto de Bristol se resume em quatro pontos, o primeiro dos quais, sobre teologia moral diz que “a Igreja deve aceitar a liberdade indisciplinada da palavra”.
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Para eles, “a doutrina da Igreja não deve consistir em regras, mas em formas de pensar, formadas em diálogo com todos os que buscam a verdade em cada época e lugar”.
Sobre autoridade na Igreja, o texto reclama “estruturas democráticas em todos os níveis, uma reafirmação de que o magistério pertence a todos os fiéis e uma liderança responsável e baseada no consentimento”. O direito canônico “requer urgentemente a transformação num modelo útil e acessível, utilizando a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas como referência”.
“O apelo de Jesus para celebrar a sua presença na Eucaristia não requer nenhuma casta sacerdotal. Todos os ministérios estão abertos a todos, como estavam na igreja primitiva”, diz o texto sobre o ministério litúrgico.
Sobre diversidade, diz: “A hierarquia, e especialmente uma liderança exclusivamente masculina, impede a igreja de afirmar a bondade na diversidade da criação e a dignidade e santidade de todos. A Igreja efetivamente não tem nenhum ensinamento coerente sobre gênero, mas sim declarações contraditórias e cientificamente desatualizadas”.
No vídeo de 2020 mostrado ontem (9), Boff e Hathaway debateram o que enxergam como uma “mudança de paradigma” trazida por Laudato si. Em sua “encíclica verde”, como a define Boff, o papa “não restringe a ecologia ao ambiente, mas define uma ecologia integral que envolve o ambiente, a sociedade, a política, a cultura, o cotidiano das vidas e a dimensão espiritual”.
O assunto vem sendo debatido pelos dois há anos. Boff e Hathaway publicaram em 2009 O Tao da libertação: Explorando a Ecologia da Transformação. Segundo Hathaway, o livro “integra pontos de vista da economia, ecologia, justiça social, espiritualidade, e cosmologia pós-moderna”. A versão em português foi editada em 2012 pela editora Vozes, ligada aos franciscanos de Petrópolis (RJ), a que Boff pertenceu até deixar a Igreja em 1992 para se casar. A edição da Vozes traz um prefácio de Fritjof Capra, físico austríaco autor do best-seller mundial O Tao da Física: Uma Análise dos Paralelos entre a Física Moderna e Misticismo Oriental, de 1975.