25 de jan de 2024 às 10:10
O Tribunal de Apelação do Estado da Cidade do Vaticano condenou um padre italiano a prisão, na terça-feira (23), pelo "crime de corrupção de menor" com relação ao abuso sexual de um estudante em uma escola para acólitos papais.
O caso foi considerado histórico, pois é a primeira vez que é proferida uma sentença desse tipo por violência sexual perpetrada em território soberano do Vaticano.
O padre Gabriele Martinelli foi acusado de forçar o ex-acólito, identificado como L.G., a manter relações sexuais com ele entre 2007 e 2012, quando eram estudantes no pré-seminário São Pio X.
Martinelli foi condenado a dois anos e meio de prisão, sendo-lhe ordenado a pagar uma multa de mil euros para cobrir os custos legais, informou Vatican News, serviço de informação da Santa Sé.
Martinelli, de 31 anos, foi ordenado padre em 2017 e é membro da diocese de Como, no norte da Itália, e da Opera don Folci, uma associação religiosa voltada para a formação de padres.
O pré-seminário São Pio X, onde Martinelli estava matriculado, oferece treinamento nas funções litúrgicas da basílica de São Pedro, incluindo missas papais, para meninos do ensino médio que estão considerando uma vocação sacerdotal.
Antes, o instituto estava localizado no Palazzo San Carlo, na Praça Santa Marta, no Vaticano, a poucos passos da residência oficial do papa Francisco, a Casa Santa Marta. No entanto, devido à controvérsia em torno do encobrimento de abusos e do julgamento de Martinelli, o papa Francisco anunciou a decisão de transferir o pré-seminário para um novo local fora da Cidade do Vaticano em 2021.
As alegações contra o padre foram relatadas pela primeira vez por jornalistas italianos em 2017 e pela Associated Press em 2018. Na época, o Vaticano não pôde prosseguir com o processo contra Martinelli, pois as acusações foram feitas fora do prazo de prescrição de um ano.
Em 29 de junho de 2019, o papa Francisco interveio para permitir que o caso continuasse, retirando a causa de inadmissibilidade.
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Em 8 de dezembro de 2021, como parte de seus esforços para maior transparência no tratamento de casos de abuso sexual, o papa introduziu uma revisão completa do direito canônico. As revisões introduziram novas penalidades para encobrimento de abuso sexual, exigiram que as denúncias de abuso fossem informadas imediatamente e reclassificaram as ofensas sexuais de "Crimes contra Deveres Especiais" a "Ofensas contra a Vida, a Dignidade e a Liberdade Humanas".
O julgamento de Martinelli começou em outubro de 2020; no entanto, em 6 de outubro de 2021, um tribunal de instância inferior do Vaticano absolveu Martinelli, citando provas insuficientes.
As acusações de "cumplicidade" também foram retiradas contra o padre Enrico Radice, o ex-reitor do pré-seminário.
A decisão do Tribunal de Apelações do Vaticano em 23 de janeiro reverteu parcialmente a decisão do tribunal inferior de 2021, encontrando evidências de que Martinelli era culpado de "corrupção de menor".
A decisão do tribunal de apelação, segundo informou a agência de notícias italiana ANSA, observou que Martinelli não é punível "limitado aos fatos imputados até 2 de agosto de 2008, já que é menor de dezesseis anos de idade" e o absolve "dos crimes imputados a ele em relação ao período depois de 9 de agosto de 2008 devido à insuficiência de provas", mas confirma "a reclassificação dos fatos contestados como complementares ao crime de corrupção de menores previsto e punido pelo art. 335 do Código Penal, limitado ao período de 9 de agosto de 2008 e 19 de março de 2009".
Ainda é possível apelar da condenação a mais alta corte do Vaticano, o Tribunal Supremo da Signatura Apostólica.
A vítima do abuso de Martinelli falou ao jornal americano The Washington Post sob condição de anonimato depois da condenação.
"O primeiro sentimento que tive foi o seguinte: durante anos me disseram que eu era um pervertido, um falsificador, um mentiroso, um louco, que estava explorando isso para seus próprios fins", revelou a vítima. "Mas todos esses anos de dor e cansaço agora têm significado", disse.