O Ministério Público Federal (MPF) cobrou explicações do Ministério da Saúde sobre a suspensão da Nota Técnica nº 2/2024, que autorizava a “realização do aborto nas condições previstas em lei” em qualquer momento da gravidez. 

A nota técnica derrubava nota emitida no governo de Jair Bolsonaro em 2022 que estipulava que os casos não-puníveis de aborto não poderiam ser realizados “em gestações que ultrapassem 21 semanas e 6 dias”, porque depois deste tempo “o abortamento toca a prematuridade e, portanto, alcança o limite da viabilidade fetal”, isto é, crianças nascidas com 21 semanas e seis dias podem sobreviver.

A legislação brasileira não pune abortos contra crianças geradas por estupro, nos casos em que o parto põe em risco a vida da mãe e, por decisão do Supremo Tribunal Federal de 2012, no caso de bebês portadores de anencefalia.

Para o MPF, a nota do governo Bolsonaro que estabelecia o limite de idade gestacional para a realização do aborto “trouxe transtornos a mulheres em estágio de gravidez mais avançado que buscavam o serviço, mas tinham seu direito negado”.

A nota técnica que suspendeu a decisão do governo Bolsonaro foi publicada no dia 28 de fevereiro e suspensa no dia seguinte depois de ter causado protestos de lideranças pró-vida. Segundo o Ministério da Saúde, a nota foi suspensa porque não tinha passado “por todas as esferas necessárias” nem “pela consultoria jurídica da Pasta”.

O pedido de esclarecimentos do MPF foi enviado à Secretaria de Atenção Primária à Saúde, que tem dez dias úteis para responder.

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“A legislação brasileira autoriza a realização de aborto em unidades de saúde em casos de gravidez por estupro, anencefalia do feto ou risco à vida da gestante. Não há nenhuma determinação legal que imponha prazo de gestação para o procedimento”, diz o Ministério Público.

A Nota Técnica 2/2024, que foi suspensa, dizia que, se o Código Penal “não prevê qualquer limite de tempo gestacional” para o aborto, “não cabe aos serviços de saúde limitar a interpretação desse direito”. Dizia ainda que na votação que autorizou o aborto em casos de bebês anencéfalos, o STF não impôs “qualquer limite temporal”.

Por isso, defendia que os serviços de saúde devem garantir o aborto “sem imposição de qualquer limitação e/ou discriminação, senão as impostas pela Constituição, pela lei, por decisões judiciais e orientações científicas internacionalmente reconhecidas”.

Ao comunicar a suspensão da nota técnica, o Ministério da Saúde disse que o tema se referia à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 989, protocolada em 2022, que pede que o STF adote providências para garantir o aborto conforme os casos não puníveis pelo Código Penal e nos casos de bebês com anencefalia.

Segundo o Ministério da Saúde, este assunto “será tratado pela ministra”, a socióloga Nísia Trindade, “junto à Advocacia-Geral da União (AGU) e ao STF”.