6 de mai de 2024 às 12:14
Pela primeira vez, uma mulher árabe cristã foi eleita reitora de uma universidade israelense – a Universidade de Haifa. O anúncio da eleição da professora Mouna Maroun foi feito em 11 de abril, em meio a tensões com o Irã e enquanto os protestos anti-Israel aumentavam em universidades ao redor do mundo.
Maroun pertence à minoria árabe em Israel, à minoria cristã entre os árabes e à minoria maronita entre os cristãos. Nenhuma árabe, cristã ou mulher tinha ocupado o cargo de reitora na Universidade de Haifa. No sistema israelense, o reitor é o chefe da universidade.
“Por essa razão, a minha eleição é uma mensagem importante de que tudo é possível na academia israelense. É uma mensagem para a minoria cristã de que estamos enraizados aqui, de que podemos ter sucesso aqui; e é também uma mensagem para as jovens gerações árabes: se você tem um sonho, pode realmente realizá-lo na sociedade israelense e especialmente nas universidades”, disse Maroun em entrevista à CNA, agência em inglês do grupo EWTN, a que pertence ACI Digital.
A Universidade de Haifa fica no monte Carmelo, a cerca de dez quilômetros da pequena vila de Isfiya, onde Maroun nasceu. Seus avós chegaram ao país vindos do Líbano no início do século XX. Os seus pais são semianalfabetos porque não havia escolas para eles naquela época, mas ela conta que “eles acreditavam que só através do ensino superior as suas quatro filhas poderiam ser integradas à sociedade israelense. Por isso, eles nos incentivaram a continuar nossos estudos”.
Maroun também abraçou essa crença. “Minha infância foi muito ativa na igreja e nos estudos, sabendo que somente estudando eu poderia ter sucesso em Israel”, disse.
“Sempre acreditei que a emancipação da minoria árabe em Israel passa pelo ensino superior. Não acredito em política; Eu acredito no ensino superior”, disse ela sobre essa posição acadêmica de prestígio.
Quando Maroun chegou à universidade, ela não sabia uma palavra de hebraico – árabes e judeus têm um sistema educacional separado – e mal falava inglês. Hoje, aos 54 anos, ela é uma renomada neurocientista e especialista em transtorno de estresse pós-traumático. Faz parte do corpo docente da universidade há mais de 20 anos e foi presidente do Departamento de Neurobiologia e membro do senado acadêmico, entre outros cargos. Ela vai assumir oficialmente seu cargo de reitora por quatro anos em outubro deste ano.
“Acho que a falta de expectativas de sucesso da minha parte foi o segredo do meu sucesso”, disse Maroun.
“Ninguém esperava que eu tivesse sucesso – sendo árabe em Israel, cristã e, acima de tudo, sendo mulher. Pude fazer aquilo em que acreditava, tive um sonho e segui esse sonho sem pressão – só a minha família me incentivou a continuar neste caminho”, acrescentou.
Maroun disse que a excelência vai ser um tema de sua gestão como reitora.
Um dos primeiros desafios que ela vai enfrentar é a integração das faculdades de medicina e engenharia na universidade – historicamente composta principalmente por artes e humanidades. O segundo objetivo é fazer com que a Universidade de Haifa seja classificada como uma das melhores universidades de pesquisa, tanto em Israel como internacionalmente.
A Universidade de Haifa é uma das universidades mais diversificadas e inclusivas de Israel: 45% dos 17 mil estudantes vêm da sociedade árabe e 50% do total de estudantes são da primeira geração de suas famílias a fazer educação superior.
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O corpo discente é composto por judeus, muçulmanos, drusos e cristãos (totalizando de 15 a 20 denominações religiosas diferentes). A própria Maroun se orgulha de sua filiação religiosa e usa um crucifixo dourado no pescoço.
O Laboratório de Estudos Religiosos faz parte da Universidade de Haifa, com foco no diálogo inter-religioso.
“Temos o que chamamos de laboratório natural, onde todas as religiões coexistem e vivem sem tensões”, disse.
Tornar-se reitora árabe de uma universidade israelense depois de 7 de outubro de 2023 é uma tarefa desafiadora, continuou.
“Eu trabalho com transtorno de estresse pós-traumático”, disse.
“Normalmente pergunto ao meu público se eles se lembram de onde estavam no 11 de setembro, mas infelizmente [agora] vou perguntar onde estavam no 7 de outubro, onde estavam naquele momento. Estamos aterrorizados como israelenses, como seres humanos, com o que aconteceu em 7 de outubro e, ao mesmo tempo, estamos também aterrorizados com o que está acontecendo em Gaza, onde milhares de crianças inocentes foram mortas”.
Maroun contou sua opinião sobre os protestos anti-Israel que acontecem atualmente em algumas universidades nos EUA.
“A administração das universidades nos EUA deveria ter uma declaração moral e ética dizendo que não podem negar o que aconteceu em 7 de outubro, bem como o que está acontecendo em Gaza, e devem tomar medidas para promover [o] processo de paz sem ter partido, porque a academia não pode tomar partido neste conflito. A academia em todo o mundo deveria ser uma ponte para a paz, para a negociação e para a interação e não ser tendenciosa porque isso é muito diferente do que é a ciência”, disse.
“Academia significa liberdade de expressão, liberdade de ação, liberdade de colaboração, liberdade de crescer e pesquisar, e liberdade de conhecimento. Acho que não se pode realmente colocar ‘academia’ e ‘boicote’ na mesma frase”, continuou.
Maroun disse que a sua experiência em trauma e cérebro, bem como a sua formação cristã, levaram-na a desenvolver uma sensibilidade particular para com os outros e buscar caminhos de diálogo e reconciliação. “Isso vai ser especialmente importante nos próximos dias e meses em Israel”, disse.
“Para superar esse trauma precisamos de tempo, precisamos de reabilitação e precisamos de reconciliação entre os dois lados. Acredito que com o tempo podemos nos reconciliar e começar a estabelecer pontes de empatia, de compreensão e de contenção das emoções uns dos outros. Afinal, somos vizinhos, vivemos lado a lado, e acredito e rezo para que já seja hora de as crianças de ambos os lados crescerem para terem sonhos e talvez realizarem esses sonhos através do ensino superior”, disse Maroun.