14 de mai de 2024 às 10:23
Dados recentes da Pesquisa Nacional sobre o Crescimento Familiar dos EUA mostram que a grande maioria dos católicos relata usar pelo menos uma forma de contracepção artificial – com mais de 90% usando preservativos e mais de 60% usando a pílula anticoncepcional hormonal.
A doutrina da Igreja diz há séculos que todas as formas de controle artificial da natalidade são ilícitas e proibidas aos casais. Essa doutrina foi formalizada em 1968 pelo papa são Paulo VI, que declarou na sua encíclica Humanae Vitae declarou que “é, ainda, de excluir toda a ação que, ou em previsão do ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento das suas conseqüências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação” como meio lícito de regular o número de filhos num casamento católico.
Embora a doutrina da Igreja sobre o assunto continue a ser inequívoca, um grande número de católicos relatou um elevado uso de contracepção artificial ao longo dos anos. Um estudo do Guttmacher Institute de 2011, por exemplo, mostrou que “entre as mulheres que estão atualmente em risco de uma gravidez indesejada”, 87% das católicas “usam um método diferente do planejamento familiar natural”.
O professor de teologia moral e ética na Universidade Católica da América, John Grabowski, disse à CNA, agência em inglês do grupo EWTN, a que pertence ACI Digital, que os dados sobre o uso de contraceptivos católicos são “conhecidos há tempos”.
“Acho que isso aponta para uma crise de catequese dentro da Igreja”, disse Grabowski. “Tudo o que estamos fazendo atualmente para formar as pessoas na fé não está funcionando bem porque esses dados mostram que elas estão sendo catequizadas pelo evangelho da revolução sexual e não pelo Evangelho proclamado pela Igreja”.
Grabowski argumenta que os católicos que usam contracepção artificial “não percebem que, ao escolherem a contracepção, estão trazendo algo tóxico para os seus casamentos”.
“Em alguns casos, os contraceptivos que utilizam são fisicamente tóxicos, como a contracepção oral, que tem toda uma série de efeitos negativos para a saúde física e psicológica das mulheres”, disse ele.
“Em alguns casos, eles não são genuinamente contraceptivos, mas funcionam como abortivos (como algumas versões do DIU)”, acrescentou Grabowski. “Em quase todos os casos, a fertilidade é tratada como uma doença e não como uma dádiva e uma função saudável do corpo humano.”
A “dádiva” da fertilidade faz parte há muito tempo da ética sexual católica. Na Humanae Vitae, o papa são Paulo VI destacou a necessidade de “usufruir do dom do amor conjugal, respeitando as leis do processo generativo”.
“De fato, assim como o homem não tem um domínio ilimitado sobre o próprio corpo em geral, também o não tem, com particular razão, sobre as suas faculdades geradoras enquanto tais, por motivo da sua ordenação intrínseca para suscitar a vida, da qual Deus é princípio”, escreveu o papa.
Em vez da contracepção artificial, a Igreja promove o planejamento familiar natural (PFN) tanto para evitar como para conseguir a gravidez. Os métodos PFN, que se baseiam todos nos sinais e sintomas naturais das fases férteis e inférteis do ciclo menstrual de uma mulher, podem incluir a utilização de dispositivos e aplicações de monitorização da fertilidade. O PFN respeita o significado unitivo e procriativo do sexo dentro do casamento.
O fundador do Pastoral Solutions Institute (Instituto de Soluções Pastorais, em português), Gregory Popcak, que ajuda os católicos a alinhar os seus casamentos e as suas vidas à fé católica, disse à CNA que “não há muita investigação de qualidade sobre o PFN”.
“Segundo os dados disponíveis, a taxa de utilização do PFN entre os católicos tende a ser bastante estável em torno de 2% a 3%”, disse ele.
“Dito isto, acredito que poderá haver um pequeno salto na utilização de PFN devido à utilização de aplicações sofisticadas que tornam a utilização de PFN mais fácil e mais eficaz”, observou ele.
Popcak argumentou que as doutrinas da Igreja sobre o controle da natalidade eram “mais centrais” sob os papas anteriores, mas que ficaram “amplamente silenciadas” sob o papa Francisco.
Ele disse que os defensores do casamento e os líderes da Igreja precisam “recentrar a conversa sobre o PFN e parar de falar sobre se as pessoas estão seguindo as regras ou não”.
“Essa é a maneira mais superficial de termos uma conversa. Temos que proclamar a noção de que o casamento, juntamente com todos os outros sacramentos, deve ser um instrumento de cura. O matrimônio é a chave do plano de Deus para curar a natureza generativa da pessoa humana”, disse ele.
“Nós particularmente não sabemos, por nós mesmos, como amar outra pessoa da maneira que Deus quer que o façamos. O matrimônio existe para curar os danos que o pecado causa à nossa capacidade de amar corretamente, especialmente através do nosso corpo”, disse Popcak.
O controle da natalidade tem 'uma longa história'
A diretora assistente do Programa de Planejamento Familiar Natural do Secretariado para Leigos, Casamento, Vida Familiar e Juventude da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA (USCCB, na sigla em inglês), Theresa Notare, reconheceu que a contracepção em si não é novidade.
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“Toda a ideia de controle de natalidade, de planejamento familiar, tem uma longa história de explorar o que as pessoas pensam ser bom, o que pensam que precisam e querem, não só para si mesmas, mas para os seus filhos”, disse ela.
Notare destacou que a contracepção tem sido praticada em larga escala há séculos e por diversas razões. Em muitos casos, foi impulsionada pela crença de que os pais “deveriam ser capazes de cuidar dos filhos que têm” e não sobrecarregar os recursos familiares potencialmente escassos.
A Igreja tem reconhecido regularmente a potencial necessidade de adiar a gravidez por essas razões. São João Paulo II disse em 1992 que maridos e suas mulheres são “profundamente afetados pelas circunstâncias sociais e econômicas” e que “condições de pobreza” podem “fazer com que um casal não esteja preparado para o dom de uma nova vida”.
Embora a doutrina da Igreja tenha permitido durante anos o PFN em tais casos, Notare disse que o nosso atual zeitgeist tecnológico criou “uma impaciência por qualquer coisa que exija mudanças lentas”.
A abstinência periódica conforme ditada pelo PFN “significa que você tem que mudar seu comportamento sexual; isso exige disciplina”, disse ela. “Por que se preocupar quando você pode tomar um comprimido, abrir um pacote, usar um dispositivo?”.
Para Notare, os leigos “geralmente não ouviram a boa mensagem da Igreja sobre sexo”.
“Durante anos eles ouviram 'culpa' e não ouviram o lado positivo da doutrinas”, disse ela. Por outro lado, assim que a Humanae Vitae foi promulgada, “muitos padres deixaram de falar sobre a questão do controle de natalidade”.
“Nesse vazio, a cultura se impôs. A maioria dos católicos, neste momento, é vítima da cultura. Eles não sabem disso. Eles são absolutamente ignorantes sobre isso”, disse ela.
O que a Igreja pode fazer?
Os líderes da Igreja e os defensores leigos vêm trabalhando há anos para se contrapor à enorme adesão católica aos contraceptivos. A USCCB promove o planejamento familiar natural através de uma variedade de meios, por exemplo, como o seu diretório de instrutores do PFN, e grupos como a Couple to Couple League (Liga Casal a Casal, em inglês) dão aulas e recursos para casais noivos e casados.
Grabowski disse que a Igreja precisa usar os seus recursos de evangelização para educar melhor os católicos sobre a ética sexual católica.
“Ao mesmo tempo em que a Igreja nos EUA tenta formar melhor as pessoas na crença católica da presença real de Cristo na Eucaristia neste renascimento eucarístico, precisamos de um tipo de esforço semelhante para formar melhor as pessoas numa visão católica da pessoa humana e da sexualidade”, disse ele.
Notare sugeriu que os fiéis deveriam olhar para a Humanae Vitae como um bom começo.
“A linguagem é fácil. É tão lindamente apresentada, falando sobre a natureza do amor conjugal e o dom da procriação. Eu encorajaria as pessoas a lerem ela. É muita clara”, disse Notare.
Popcak, por sua vez, reconheceu “os verdadeiros desafios que o PFN traz à tona em um relacionamento”.
A Igreja “precisa fornecer apoio e orientação pastoral real aos casais” que o utilizam, disse ele.
“Precisamos ajudar os casais a compreender que os desafios que o PFN traz à tona são os mesmos problemas que Deus lhes pede que resolvam para que possam ter relacionamentos mais saudáveis, mais felizes e mais santos”, disse Popcak.
Os casais católicos que lutam com o PFN e não são assistidos pelos seus líderes espirituais podem muitas vezes simplesmente desistir completamente da prática, disse ele, levando a alegações generalizadas de que o planejamento familiar natural simplesmente não funciona.
“Francamente, sempre foi assim, mas é particularmente verdade agora. Os casais católicos merecem coisa melhor”, disse Popcak.