11 de jun de 2024 às 12:02
O Instituto Ecumênico Tantur, em Jerusalém, organizou uma coletiva de imprensa em 4 de junho para apresentar um relatório que analisou o aumento perturbador das hostilidades contra os cristãos em Israel e Jerusalém Oriental em 2023. Os dados foram coletados como parte de uma iniciativa lançada pelo Rossing Center for Education and Dialogue para documentar o assédio sofrido por cristãos.
O Rossing Center é uma organização inter-religiosa e de construção da paz com sede em Jerusalém.
O monitoramento e rastreamento de ataques contra cristãos (coleta de dados, coleta de evidências etc.) foi possível através da colaboração com igrejas cristãs e outros parceiros ou associações da sociedade civil, em particular o Centro de Dados de Liberdade Religiosa fundado por Yisca Harani, conferencista, conselheiro e pesquisador israelense de história cristã e questões inter-religiosas.
Apesar do contexto ter mudado completamente, dentro e fora de Israel, com a eclosão da guerra, "acreditamos que é crucial - e talvez ainda mais crucial - trazer esta questão à atenção do mundo neste momento", disse Federica Sasso, editora do relatório, na conferência de imprensa.
Segundo o relatório, houve 90 ataques conhecidos em 2023. Os dados mostraram um aumento notável nos casos de cuspe (30 queixas), assédio físico e verbal (11), bem como ataques a propriedades cristãs (32).
Recentemente, o ataque sofrido pelo abade da Abadia Beneditina da Dormição, padre Nikodemus Schnabel, que foi filmado ao vivo, provocou uma forte reação, segundo informações publicadas por CNA, agência em inglês do grupo EWTN, a que pertence ACI Digital, em 8 de fevereiro.
Uma série de atos de violência contra cristãos ganhou as manchetes em 2023, como a profanação do cemitério protestante no monte Sião e a vandalização de uma estátua de Jesus dentro do santuário franciscano da Flagelação, na Via Dolorosa.
Um exemplo notável de cobertura impactante da mídia que ilustra a gravidade da situação foi uma reportagem da emissora de TV israelense Canal 13 em que um jornalista assumiu o papel de um monge franciscano para documentar ataques na Cidade Velha, apenas para ser cuspido por um soldado.
Repetidas cuspidas foram flagradas por câmeras de segurança tanto na Via Dolorosa quanto em frente à catedral armênia de São Tiago.
"É apenas a ponta do iceberg", disse Sasso à CNA em uma conversa privada na coletiva de imprensa. "Por exemplo, só temos registro de 30 casos conhecidos de cuspe, mas a partir de entrevistas que realizamos especialmente com membros do clero, sabemos que a maioria deles sofre ataques regulares de cuspe várias vezes por semana."
"O problema é, por um lado, o desconhecimento do fenômeno por parte das autoridades responsáveis pela ordem pública; por outro lado, a não notificação por parte das vítimas, que muitas vezes tendem a minimizar. Em vez disso, a denúncia é muito importante, porque é a única maneira de trazer à tona as reais dimensões do problema – mesmo aos olhos das próprias autoridades", disse Sasso.
O padre Enrico Maiorano, frade capuchinho que participou da conferência, disse à CNA que tem sido alvo de tais ataques, especialmente na Cidade Velha de Jerusalém.
Receba as principais de ACI Digital por WhatsApp e Telegram
Está cada vez mais difícil ver notícias católicas nas redes sociais. Inscreva-se hoje mesmo em nossos canais gratuitos:
"Já me aconteceu várias vezes que judeus cuspiram em mim. A última [foi] há poucos dias. Até agora nunca tinha pensado em denunciar, mas agora, quando vou à Cidade Velha, mantenho sempre a câmara do telefone celular ligada para poder documentar quaisquer agressões."
Em seu discurso, a diretora de programa do Centro de Jerusalém para as Relações Judaico-Cristãs (JCJCR, na sigla em inglês), Hana Bendcowsky, pediu aos cristãos, especialmente ao clero, que tomem medidas.
“O desafio é convencer o clero a relatar tanto os graves quanto os pequenos incidentes e coletar o máximo de evidências e dados possíveis", disse. "O acúmulo de dados nos ajudaria a pressionar as autoridades."
Bendcowsky também fez um quadro do contexto mais amplo em que esses incidentes ocorrem.
"Esses ataques não são novos, mas parece que a frequência e a gravidade estão crescendo. As autoridades não têm ideia do que os cristãos estão passando, e isso porque eles não são relatados. Além disso, os judeus não estão familiarizados com o cristianismo e tendem a projetar seus próprios medos como uma minoria perseguida nos cristãos, vendo-os como uma presença hostil ou indesejada", disse Bendcowsky. "Finalmente, temos um clima político polarizado, onde figuras políticas se permitem expressar visões extremistas, sem que ninguém coloque limites, e isso legitima os agressores."
Em termos de identidade dos agressores, o relatório disse que "a maioria dos perpetradores são indivíduos judeus - principalmente jovens que se identificam com o campo sionista religioso e posições ultranacionalistas". O relatório enfatizou que eles são "extremos da sociedade judaica" e que "comportamentos de assédio não são normativos, e a maioria dos indivíduos não participa de tais ações".
John Munayer, cristão palestino e diretor do Departamento de Engajamento Internacional do Rossing Center, ressaltou que "a maioria dos ataques e casos de assédio no relatório são [aqueles] direcionados a cristãos internacionais, incluindo peregrinos".
Além disso, para os cristãos que vivem em Jerusalém Oriental, "as realidades diárias de postos de controle, assédio policial/militar, movimento restrito e dificuldades econômicas ofuscam esses casos específicos de assédio, relegando-os a uma prioridade inferior".
Segundo Munayer, "a comunidade cristã internacional em todo o mundo deve assumir um papel mais ativo ao abordar e pressionar os indivíduos, autoridades e órgãos relevantes para ver a segurança e a liberdade de culto dos cristãos que vivem na Terra Santa".
Suas palavras foram ecoadas pelo bispo luterano Sani Ibrahim Azar, que falou de uma ameaça constante aos cristãos na Terra Santa.
"Números exatos de incidentes anticristãos são difíceis de encontrar. Dados sugerem que houve um aumento dramático de ataques de civis judeus" contra os cristãos "em Israel e na Cisjordânia ocupada", disse Azar.
O relatório enfatizou "a necessidade urgente de esforços colaborativos para lidar com a escalada das hostilidades contra os cristãos em Jerusalém e defende uma abordagem abrangente envolvendo a condenação por parte das autoridades estatais e religiosas, aplicação da lei, educação, envolvimento da comunidade, engajamento da mídia e conscientização internacional".
O relatório também apresentou uma série de propostas concretas, incluindo "reforçar a intervenção policial, aumentar a presença de policiais em áreas críticas e promover a conscientização sobre ataques a cristãos; oferecer treinamento sobre o cristianismo aos membros da polícia local, do município e de outras autoridades relevantes; melhorar os currículos sobre o cristianismo no sistema público de ensino; condenações mais fortes das autoridades e lideranças religiosas judaicas; e encorajar as comunidades cristãs a denunciar [ataques]".