25 de jul de 2024 às 15:35
Em 25 de julho de 1968, o papa são Paulo VI publicou Humanae vitae, encíclica sobre controle da natalidade condenando os métodos contraceptivos artificiais, documento que já naquela época, logo depois do Concílio Vaticano II, foi rejeitado até por cardeais e bispos.
O documento, publicado no início da revolução sexual, continua a gerar reações divergentes. É conveniente aprofundar cinco pontos que permitem entender melhor a encíclica, o contexto em que foi escrita, sua mensagem profética e sua validade até hoje:
1. Magistério ordinário, definitivo e irreformável
Padres, teólogos e leigos costumam afirmar que a encíclica pertence apenas ao magistério ordinário de um papa e que, como tal, seu conteúdo pode mudar com outro sucessor. No entanto, a Humanae Vitae foi apoiada pelos papas que sucederam são Paulo VI.
São João Paulo II chegou a afirmar em 1987 que "o que foi ensinado pela Igreja sobre a contracepção não pertence à matéria livremente disputada pelos teólogos" e que "ensinar o contrário equivale a enganar a consciência moral dos cônjuges".
O papa polonês também sustentou em discurso no ano seguinte que a doutrina católica sobre a contracepção pertence à doutrina moral da Igreja e que isso foi proposto "com continuidade ininterrupta", porque é "uma verdade que não pode ser contestada".
Assim, a doutrina de uma encíclica faz parte do magistério ordinário, mas, se for feita de modo contínuo e definitivo, é irreformável, mesmo que não seja infalível.
2. A Humanae Vitae é uma encíclica profética
Várias vozes católicas classificaram a encíclica como "profética e oportuna".
Em 1968, a discussão sobre contraceptivos artificiais estava em sua infância, mas o documento não significava apenas uma resposta concreta ao debate em torno da ética sexual, "mas significava na época, e continua a significar, uma recusa da Igreja, clara e explícita, em se curvar às propostas e demandas da revolução sexual", segundo a Conferência Episcopal Espanhola.
Em 2018, o então arcebispo de Varsóvia-Praga, Polônia, dom Henryk Hoser, disse que a voz do papa são Paulo VI na Humanae Vitae foi profética sobre os contraceptivos, pois "previu que sua aplicação abriria o caminho mais fácil para a infidelidade conjugal e o declínio geral dos nascimentos".
O arcebispo também disse que a encíclica é sempre atual porque o amor conjugal "carnal ou espiritual, deve combinar essas duas dimensões" e que deve ser sempre um amor "desprovido de egoísmo".
Da mesma forma, o padre espanhol Javier "Patxi" Bronchalo disse em 2022 que o documento alertava na época sobre o aumento da infidelidade conjugal, a degradação moral, a perda generalizada da dignidade das mulheres e a colonização ideológica através da política.
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3. A encíclica sofreu mudanças significativas antes de ser publicada
Segundo a pesquisa de um estudioso italiano no Arquivo Apostólico da Santa Sé, a Humanae Vitae deveria ser publicada originalmente em 23 de maio de 1968, mas então são Paulo VI decidiu publicá-la em 25 de julho.
Essa medida foi tomada pelo papa, apesar de o documento já estar impresso em latim sob o título De nascendae prolis (Das crianças que vão nascer, em latim), porque considerava que era muito denso em doutrina e que não era pastoralmente adequado.
Depois de algumas modificações no documento original, são Paulo VI "pegou toda a seção pastoral e acrescentou uma série de observações de grande delicadeza que ainda hoje revelam sua marca".
4. São Paulo VI consultou os bispos antes de publicar a encíclica
Alguns acusam o papa São Paulo VI de ter publicado a encíclica Humanae Vitae sem consultar os bispos. No entanto, a pesquisa do estudioso italiano revela o contrário. Durante o Sínodo dos Bispos de 1967, o papa pediu a opinião de todos os bispos participantes sobre o assunto.
Dos quase 200 bispos que participaram do sínodo, apenas 26 responderam no período de 9 de outubro de 1967 a 31 de maio de 1968. Desse grupo, 19 se manifestaram a favor dos anticoncepcionais e apenas sete contra.
Desses sete, os mais conhecidos e importantes foram o arcebispo de Newport, EUA, o venerável Fulton Sheen; e o então arcebispo de Cracóvia, Polônia, Karol Wojtyla, hoje são João Paulo II, que sempre quis ser lembrado como "o Papa da família", como disse o papa Francisco durante a canonização do papa polonês em 2014.
O então secretário de Estado da Santa Sé, cardeal Agostino Casaroli, disse que “na manhã de 25 de julho de 1968, Paulo VI celebrou a Missa do Espírito Santo, pediu luz do alto e assinou: assinou sua assinatura mais difícil, uma de suas assinaturas mais gloriosas. Ele assinou sua própria paixão".
5. A Humanae Vitae promove uma racionalização da esfera sexual
Segundo o teólogo jesuíta Bertrand de Margerie, a expressão "racionalizar a esfera sexual" não evoca uma autonomia indiscriminada e completa da vida íntima do casal ou o uso de meios artificiais para controlar os nascimentos, mas o exercício da virtude da castidade.
"A virtude adquirida da castidade penetra com racionalidade o exercício da vida sexual quando é legítima", disse o padre jesuíta citando a Suma Teológica de são Tomás de Aquino.
"Ao encorajar a continência periódica e a regulação dos nascimentos sem controles artificiais, Paulo VI exalta corretamente uma racionalização humilde e completa da esfera sexual sujeita ao conhecimento da razão humana e ao controle da liberdade auxiliada pela graça", disse o padre.
"Ele não apela para os instintos, que são comuns ao homem e aos outros animais e que são privados da razão, mas apela para a liberdade do homem, através da qual o homem se assemelha a espíritos puros, como anjos", acrescentou.