A Igreja celebra anualmente a festa de Nossa Senhora Rainha em 22 de agosto. A maioria das pessoas, ao ouvir sobre essa celebração, poderia pensar nela como algo doce e sentimental, uma devoção pitoresca para avós com gosto por uma espiritualidade açucarada. Mas se examinarmos essa festa como deveríamos, de uma perspectiva bíblica, surge uma imagem muito diferente.

A indicação bíblica mais clara de que Maria de Nazaré é rainha é uma passagem notável no capítulo 12 do livro do Apocalipse. O autor vê um sinal extraordinário no céu: uma mulher vestida com o sol, a lua a seus pés e uma coroa de 12 estrelas em sua cabeça.

Doze, é claro, é uma designação das tribos de Israel, e a coroa é uma indicação bastante inequívoca de que estamos lidando com uma figura real. Logo fica claro que essa mulher não é apenas uma rainha, mas, mais precisamente, uma rainha-mãe, pois ouvimos que ela está em trabalho de parto para dar à luz um rei, alguém “destinado a governar as nações com cetro de ferro”.

Tanto a rainha-mãe quanto o rei menino estão envolvidos numa luta terrível. O vidente nos conta que um dragão temível está pronto para devorar o bebê assim que ele nascer. Mas Deus toma a criança e a leva para a segurança do trono divino, enquanto a mãe foge para o deserto onde encontra refúgio. Na esteira disso, uma guerra irrompe entre "Miguel e seus anjos" e o dragão e seus apoiadores angelicais. Essa imagem é, claro, simbolicamente rica e multivalente, mas, no mínimo, indica que a rainha e seu filho real são protagonistas em uma guerra espiritual de alguma magnitude. Eles são, em uma palavra, guerreiros.

Pouco antes dessa passagem, bem no final do capítulo 11 do livro do Apocalipse (e lembre-se de que as designações dos capítulos vieram muitos séculos depois que esse texto foi composto), encontramos a visão do templo celestial. Em meio a relâmpagos, estrondos de trovões e uma poderosa tempestade de granizo, o vidente vê a Arca da Aliança dentro do templo.

A arca, lembramos, era o recipiente dos remanescentes dos dez mandamentos e, portanto, o objeto mais sagrado para o antigo Israel. Colocada dentro do Santo dos Santos no templo de Jerusalém, a arca era entendida como o elo entre o céu e a terra, a portadora definitiva da presença divina.

Quando o rei Davi trouxe a arca para a cidade santa, ele dançou diante dela com abandono imprudente. Em vários pontos ao longo de sua história, Israel levou a arca para a batalha, mais notavelmente quando os sacerdotes marcharam com ela sete vezes ao redor dos muros de Jericó, antes que as muralhas caíssem.

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Agora, a justaposição da visão da arca no templo celestial e a visão da rainha-mãe vestida com o sol não pode ter sido acidental. O autor do livro do Apocalipse nos diz que Nossa Senhora, a portadora do Verbo de Deus feito carne, era a Arca da Aliança por excelência.

Quando ela visitou sua prima santa Isabel, grávida do nascituro são João Batista, ele pulou de alegria no ventre de sua mãe, uma bela imitação infantil da dança de Davi diante da verdadeira arca. Tanto a arca quanto a rainha estão associadas à guerra espiritual.

Em sua oração do Magnificat, registrada no Evangelho de Lucas, Nossa Senhora fala do Deus “que derrubou os poderosos de seus tronos e exaltou os humildes”. Como seu Filho, Nossa Senhora não luta com as armas insignificantes do mundo, mas sim com as armas do amor, do perdão, da compaixão e da não-violência provocativa.

Aqueles que vivenciaram um retiro jesuíta baseado nos exercícios espirituais de santo Inácio reconhecerão a meditação dos “dois padrões”. Inácio pede a quem faz o retiro que imagine um grande campo de batalha. De um lado, sob o padrão da Igreja, está o exército de Cristo; do outro, sob o padrão de Satanás, está o exército dos poderes das trevas. Então santo Inácio obriga a tomar uma decisão, de fato a escolha mais fundamental e importante imaginável, a eleição que determinará tudo o mais que ele dirá e fará pelo resto de sua vida: A qual exército você se unirá?

Bob Dylan apresentou a mesma opção espiritual rígida em sua canção de 1979 "Gotta Serve Somebody": ("Pode ser o diabo ou pode ser o Senhor, mas você terá que servir a alguém.") Em outras áreas da vida, uma boa dose de nuance e sutileza é necessária, mas no nível mais básico, em que se determina a orientação fundamental da própria vida, as coisas realmente ficam bem simples e claras.

A festa de Nossa Senhora Rainha tem a ver com essa escolha: Onde você está na grande luta espiritual? Com ​​qual exército você luta? Você marcha sob a bandeira da Rainha Mãe e seu Filho, ou com seus inimigos? Você sai com a Arca da Aliança ou contra ela? Diga o que quiser sobre essas perguntas, mas elas não são doces nem sentimentais.