A Assembleia Nacional da Nicarágua aprovou uma reforma do Código Penal para punir crimes contra o Estado cometidos no exterior. Trata-se de uma medida para manter os nicaraguenses dispersos no exterior “calados, em silêncio, sem expressar nada”, disse o ex-ministro da Educação nicaraguense Humberto Belli, que vive exilado nos EUA.

Segundo a agência de notícias americana Associated Press (AP), a assembleia aprovou na terça-feira (3), quase por unanimidade com 88 votos, a reforma que permite processar e confiscar bens de pessoas ou organizações nicaraguenses ou estrangeiras que cometerem crimes contra o Estado, mesmo fora do país.

As penas podem variar de seis meses a 30 anos de prisão.

A lei permite punir quem, na Nicarágua ou fora dela, “promove, solicita ou gere sanções ou bloqueios econômicos, comerciais e financeiros” contra o Estado, as suas empresas ou os seus funcionários.

O Alto Comissariado das Nações Unidos para os Direitos Humanos falou na terça-feira (3) sobre “a grave deterioração” das liberdades fundamentais na Nicarágua, onde o regime continua “a perseguir não só aqueles que expressam opiniões dissidentes, mas também qualquer pessoa ou organização que atua de forma independente ou que não está diretamente sob seu controle”.

“Quieto, em silêncio, sem dar opinião”

Para Humberto Belli, ex-ministro da Educação do governo de Violeta Chamorro, presidente da Nicarágua de 1990 a 1997, e ex-membro da Frente Sandinista – o partido do atual regime – essa reforma significa que “se um nicaraguense (…) no exterior participa de algum programa ou expressa uma opinião e, por qualquer motivo, o governo o considere seu inimigo, [membros do governo] podem acusá-lo nos tribunais da Nicarágua, sem direito à defesa, de conspirar contra a paz, contra a ordem estabelecida”.

“E depois confiscam tudo o que esta pessoa possa ter na Nicarágua: a sua pensão de velhice, a sua segurança social ou quaisquer bens que possua”, disse ele.

“É uma espada de Dâmocles pairando sobre todos os nicaragüenses no exterior, para que fiquem muito quietos, em silêncio, sem dar opinião alguma”, disse ele à EWTN Noticias em Miami, Flórida, EUA, onde vive no exílio.

Depois de dizer que “na Nicarágua não há separação de poderes e o sistema judicial acusa sem necessidade de qualquer prova e sem direito a recurso”, o ex-ministro nicaraguense disse que o regime não só está “punindo pessoas que não estiveram diretamente envolvidas, como no meu caso, com alguma atividade política e de opinião, mas estão punindo os familiares”.

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Querem acabar com “a pregação do Evangelho” na Nicarágua

Respondendo sobre a perseguição do regime contra a Igreja, Belli disse à EWTN Noticias que “há uma vontade, não apenas de silenciá-la politicamente, mas de realmente pôr fim à influência religiosa e à pregação do Evangelho no país”.

“Caso contrário não se explica por que uma das primeiras punidas foram as Irmãs Missionárias da Caridade, de Madre Teresa de Calcutá, que eram totalmente apolíticas, ou porque fecharam a Radio María, emissora que nunca se envolveu em política, mas que pregou o Evangelho”, disse ele.

Em 6 de julho de 2022, 18 missionárias da Caridade foram expulsas da Nicarágua e enviadas para a Costa Rica, medida aprovada pela Assembleia Nacional como “urgente”, enquanto a Radio María Nicarágua foi fechada em 9 de julho de 2024, depois de suas contas bancárias, onde recebiam doações, serem bloqueadas em abril.

Belli disse que o regime também fechou “milhares de ONGs protestantes e católicas”.

“É uma ofensiva (…) uma animosidade contra a religião católica e contra o cristianismo em geral”.

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Em 19 de agosto, o regime da Nicarágua cancelou o status jurídico de 1,5 mil ONGs, entre as quais havia 678 católicas e evangélicos, como o fundo para padres aposentados.

A Casa Branca informou ontem (5) que 135 presos políticos foram libertados e enviados para a Guatemala, incluindo 13 membros da igreja cristã Puerta de la Montaña e vários leigos católicos.

Em 15 de agosto, Martha Patricia Molina, advogada e pesquisadora, apresentou a quinta parte de seu relatório Nicarágua: Uma Igreja Perseguida? que contabiliza 870 ataques do regime contra a Igreja, de 2018 a julho de 2024.