29 de set de 2024 às 13:36
O papa Francisco celebrou hoje (29), pela manhã a missa de encerramento da sua viagem a Bélgica, com o rito de beatificação da serva de Deus Ana de Jesus, advertindo que “na Igreja há lugar para todos, mas todos seremos julgados”, reafirmando que na Igreja Católica “não há lugar para o encobrimento dos abusos”.
O papa Francisco chegou ao estádio King Babuino e deu uma volta de papamóvel para cumprimentar os 35 mil fiéis presentes.
Beatificação da espanhola Ana de Jesús
A celebração da missa iniciou com a leitura da biografia da espanhola Ana de Jesus, filha espiritual de santa Teresa de Ávila, que ajudou a expandir os Carmelitas Descalços na França e na Bélgica no início do século XVII.
Em seguida, o papa Francisco proclamou a fórmula de beatificação e, acompanhado pelo coro que entoou a Laudate Dominum, as relíquias da nova beata foram apresentadas ao papa e colocadas aos pés da imagem de Nossa Senhora.
Em sua homilia, o papa Francisco recordou o testemunho de Ana de Jesus, uma mulher que foi uma das protagonistas, na Igreja do seu tempo, de um grande movimento de reforma, seguindo os passos de uma “gigante do espírito” - Teresa de Ávila - “cujos ideais difundiu em Espanha, em França e também aqui, em Bruxelas, nos então chamados Países Baixos espanhóis”.
“Numa época marcada por dolorosos escândalos, tanto dentro como fora da comunidade cristã, ela e as suas companheiras, com uma vida simples e pobre feita de oração, trabalho e caridade, conseguiram trazer de novo tantas pessoas à fé a ponto de alguém descrever a sua fundação nesta cidade como um “'íman espiritual"”, recordou.
O papa também destacou que a nova beata não deixou escritos, mas em vez disso “empenhou-se em pôr em prática o que tinha aprendido e, com o seu estilo de vida, contribuiu para reerguer a Igreja num momento de grande dificuldade”.
“Acolhamos, pois, com gratidão o modelo, simultaneamente delicado e forte, de ‘santidade feminina’ que ela nos deixou, feito de abertura, de comunhão e de testemunho. Confiemo-nos à sua intercessão, imitemos as suas virtudes e renovemos com ela o nosso compromisso caminharmos juntos seguindo as pegadas do Senhor”, exortou o papa.
“Na Igreja não há lugar para o encobrimento dos abusos”
O papa Francisco recordou o seu encontro com as vítimas de abusos na Igreja durante a sua visita à Belgica e convidou os fiéis a pensar nos pequenos que "são vítimas de escândalo, golpeados, abusados por aqueles que deveriam cuidá-los, nas feridas de dor e de impotência, principalmente nas vítimas, mas também nos familiares e em toda a comunidade”.
Depois de ouvir o sofrimento dos abusados e de reviver os seus testemunhos, reafirmou que “na Igreja há lugar para todos, mas todos seremos julgados e não há lugar para o abuso, não há lugar para o encobrimento dos abusos”.
“Peço a todos: não encobri os abusos! Peço aos bispos: não encobri os abusos! Condenai os abusadores e ajudai-lhes a curar-se desta enfermidade que são os abusos. O mal não se esconde, mas deve ser posto ao descoberto: que se saiba! Como o fizeram com coragem alguns dos abusados. Que se saiba! E que se julgue o abusador, seja leigo, leiga, padre ou bispo", pediu Francisco.
O papa também afirmou: “todos somos pobres pecadores… todos… eu, o primeiro –; e as pessoas abusadas são um lamento que sobe aos céus, que toca a alma, faz-nos envergonhar e nos chama à conversão”.
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“A comunidade dos crentes não é um círculo de privilegiados”
O papa também lembrou que todos nós, com o Batismo, “recebemos uma missão na Igreja” que “trata-se de um dom, não de um título ostentoso".
E frisou que “A comunidade dos crentes não é um círculo de privilegiados, é uma família de salvos, e nós não é pelos nossos próprios méritos que somos enviados a levar o Evangelho ao mundo, mas pela graça de Deus, pela sua misericórdia e pela confiança que, apesar de todos os nossos limites e pecados, Ele continua a depositar em nós com amor de Pai, vendo em cada um o que nós próprios não conseguimos ver. É por isso que, dia após dia com paciência, Ele nos chama, envia e acompanha".
Continuando, enfatizou que “temos de cumprir a nossa missão com humildade, gratidão e alegria. Não devemos ficar ressentidos, mas sim alegrarmo-nos com o facto dos outros poderem também fazer o que nós fazemos, para que o Reino de Deus cresça e para que, um dia, todos unidos nos encontremos entre os braços do nosso Pai”.
Depois recordou que “o único caminho da vida é o do dom, do amor que une na partilha”, uma vez que “o caminho do egoísmo gera apenas fechamentos, muros e obstáculos - ‘escândalos’, precisamente - que nos acorrentam às coisas e nos afastam de Deus e dos irmãos”.
“O egoísmo, como tudo o que impede a caridade, é “escandaloso”, porque esmaga os pequenos, humilhando a dignidade das pessoas e abafando o clamor dos pobres”, disse.
Francisco também advertiu que clamor dos pobres e dos que sofrem "não podem ser ignorados, não podem ser eliminados, como se fossem uma nota dissonante no concerto perfeito do mundo da riqueza, nem podem ser silenciados através de uma forma de assistencialismo de fachada”.
“Não tenhamos ilusões: sem amor não há nada que dure, tudo se desvanece, desmorona e nos deixa prisioneiros de uma vida fugaz, vazia e sem sentido, de um mundo inconsistente que, para além das fachadas, perdeu toda a credibilidade, porque escandalizou os mais pequenos”, afirmou o papa Francisco.
“Cessem imediatamente as hostilidades” no Oriente Médio
Ao final da missa, o papa Francisco recitou a oração mariana do Angelus e agradeceu aos reis e autoridades pela acolhida nestes dias. Agradeceu também "a todos aqueles que, de muitas maneiras, colaboraram na organização dessa visita; especialmente aos idosos e doentes que ofereceram as suas orações".
Ainda recordou que hoje "se celebra a Jornada Mundial do Migrante e do Refugiado" e renovou a Europa e a comunidade internacional o seu apelo para "que considerem o fenômeno migratório como uma oportunidade para crescer juntos na fraternidade", convidando "todos a ver em cada irmão e irmã migrante o rosto de Jesus que se fez hóspede e peregrino em meio a nós”.
Ele também expressou "muita preocupação o crescimento e a intensificação do conflito no Líbano" e afirmou que neste momento, o Líbano "é uma mensagem". Ainda lamentou "os efeitos avassaladores sobre a população" do Oriente Médio e pediu orações pelas vítimas, pelas suas famílias e pela paz. “Peço a todas as partes que cessem imediatamente as hostilidades no Líbano, em Gaza, no resto da Palestina e em Israel".
Também pediu que “liberem-se os reféns e permita-se a ajuda humanitária” e como de costume, pediu não esquecer "a martirizada Ucrânia".
Início do processo de beatificação do rei Balduíno
O papa declarou ainda que, ao regressar a Roma iniciará "o processo de beatificação do rei Balduíno". “Que o seu exemplo de homem de fé ilumine os governantes”, disse.
"Peço aos bispos belgas que se empenhem em levar adiante esta causa", concluiu.