São Jerônimo, cuja festa a Igreja celebra hoje (30), traduziu a Bíblia inteira para o latim no século IV d.C., criando uma edição amplamente lida, mais tarde conhecida como Vulgata.

“Não conheço nenhuma outra tradução, antiga ou moderna, tão boa quanto a Vulgata”, disse Christophe Rico, linguista católico que vive Jerusalém, à CNA, agência em inglês da EWTN News.

A Vulgata se tornou a Bíblia predominantemente usada na Idade Média e. com o Concílio de Trento (1545–1563), a Bíblia oficial da Igreja.

O francês Rico é professor de grego antigo e reitor do Instituto Polis em Jerusalém, que ensina várias línguas antigas. No Instituto Polis, Rico produz livros para ajudar os alunos a aprender latim e grego.

Professor especialista em grego e latim, Rico disse que, apesar dos mais de 1,6 mil anos decorridos desde sua conclusão, a tradução da Bíblia feita por são Jerônimo provou ser incrivelmente precisa e muito valiosa para a Igreja.

“Se você tem alguma dúvida sobre a solidez de uma tradução moderna, vá para a Vulgata; especialmente para o Novo Testamento”, disse Rico. A tradução do Antigo Testamento da Vulgata também é “excelente”, disse ele.

Christophe Rico. École Biblique
Christophe Rico. École Biblique

Quem foi são Jerônimo?

São Jerônimo nasceu por volta de 340 d.C. como Eusébio Hierônimo Sofrônio em uma cidade do Império Romano que ficava, provavelmente, no atual território da Croácia. Seu pai o enviou a Roma para estudar retórica e literatura clássica, a formação de um advogado da época.

Batizado em 360 d.C. pelo papa Libério, ele viajou muito e eventualmente se estabeleceu como eremita no deserto na Síria. Mais tarde, foi ordenado padre e realocado, vivendo uma vida solitária e ascética em Belém, na Terra Santa, a partir de meados da década de 380 d.C. Foi lá que ele aprendeu hebraico, principalmente com rabinos judeus. Ele eventualmente tornou-se secretário pessoal do papa são Dâmaso I.

Bom humor, gênio linguístico e uma admirável ética de trabalho não são as únicas qualidades pelas quais são Jerônimo é conhecido hoje. Ele também é o santo padroeiro das pessoas com personalidades difíceis, como se diz que ele próprio tinha um temperamento severo e era mordaz nas críticas a seus oponentes intelectuais.

O nascimento da Vulgata

A Vulgata não foi a primeira Bíblia em latim. Na época de são Jerônimo, no século IV d.C., havia uma versão já amplamente usada chamada de Vetus Latina (Latina velha). Era uma tradução da Septuaginta, a tradução grega do Antigo Testamento feita do hebraico e aramaico por judeus no século II a.C. A Vetus Latina tinha também a tradução do grego original de todos os livros do Novo Testamento.

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Rico descreve a Vetus Latina como uma “boa tradução, mas não perfeita”. Em 382 d.C., ​​são Dâmaso I encarregou são Jerônimo, que trabalhava como seu secretário na época, de revisar o Novo Testamento da Vetus Latina.

Ao longo de anos, são Jerônimo revisou e melhorou meticulosamente a tradução latina do Novo Testamento a partir dos melhores manuscritos gregos disponíveis. Rico disse que, em todo o processo, são Jerônimo corrigiu certas passagens e expôs os significados profundos de muitas das palavras gregas que haviam sido perdidas em traduções anteriores.

Por exemplo, a palavra grega “epiousios”, que provavelmente foi cunhada pelos escritores dos Evangelhos, aparece na Oração do Senhor, o Pai Nosso, nos evangelhos de são Lucas e são Mateus. Na oração, ele foi traduzida por “de cada dia”. No Evangelho de são Mateus, no entanto, Jerônimo traduziu a palavra para o latim como supersubstantialem ou “supersubstancial”, uma alusão, como diz Catecismo da Igreja Católica aponta, ao corpo de Cristo na Eucaristia.

Todo o trabalho de são Jerônimo resultou numa “melhoria brilhante” em relação à Vetus Latina, disse Rico.

O que são Jerônimo fez em seguida foi ainda mais ambicioso. Ele começou a traduzir todo o Antigo Testamento também, do hebraico original. São Jerônimo sabia hebraico muito bem, disse Rico, já que ele tinha vivido na Terra Santa por 30 anos naquele momento e mantinha contato próximo com rabinos judeus. Jerônimo também teve acesso à Hexapla de Orígenes, uma espécie de “Pedra de Roseta” para a Bíblia que exibia o texto da Bíblia em seis versões lado a lado: o texto hebraico, uma transliteração em letras gregas do texto hebraico, a tradução da Septuaginta e três outras traduções gregas feitas por judeus.

Num trabalho que levaria 15 anos, Jerônimo conseguiu traduzir todo o Antigo Testamento do hebraico original.

 

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A Vulgata foi revista algumas vezes ao longo dos anos, mais notavelmente em 1592 pelo papa Clemente VIII, que mandou publicar a versão que ficou conhecida como Vulgata Clementina, e a revisão mais recente, a Nova Vulgata, mandada publicar pelo papa são João Paulo II em 1979.

Duas importantes traduções em português da Bíblia, a do padre Antônio Pereira de Figueiredo, começada no fim do século XVIII, a do padre Mattos Soares, do século XX, foram feitas a partir da Vulgata.

Embora diga que nenhuma tradução é perfeita, Rico elogia a Vulgata de são Jerônimo por sua precisão e sua importância na história da Igreja.

“Para o Novo Testamento, não consegui encontrar nenhum erro... é incrível”, disse Rico.

São Jerônimo é hoje reconhecido como um doutor da Igreja. Ele viveu seus últimos dias em estudo, oração e ascetismo no mosteiro que fundou em Belém, onde morreu em 420 d.C.