24 de out de 2024 às 16:14
“Buon pranzo e arriverderci!” (Bom almoço e até mais ver, em italiano); basta ouvir essa frase com a qual o papa Francisco se despede dos fiéis no final do Ângelus de cada domingo para perceber a importância que ele dá à alimentação.
O papa falou sobre comida em tom humorístico em várias ocasiões. Em uma entrevista ao retornar de uma de suas viagens apostólicas, o papa disse, brincando, que seu próximo destino vai depender da gastronomia do país.
Ao falar aos jornalistas que o acompanham nas suas viagens pelo mundo, Francisco costuma lhes desejar um bom almoço. Ao retornar de Budapeste, Hungria, no ano passado, o papa riu ao sugerir ironicamente que não tinha certeza se haveria jantar no avião “ou algo para enganar o estômago”.
Na ocasião, o papa disse que só entendeu duas palavras da língua húngara: goulash (prato típico húngaro feito principalmente com carne, cebola, pimenta e páprica) e tokaj (vinho característico do país).
Já é quase uma tradição que o papamóvel pare na praça de São Pedro quando um peregrino oferece ao papa uma das bebidas que ele mais gosta, o mate. E a “chipa”, alimento tradicional em alguns países latino-americanos feito à base de fécula de mandioca e queijo, também é um dos alimentos que mais agrada ao papa Francisco. “Onde está a chipa?”, perguntou Francisco em encontro com paraguaios na praça de São Pedro.
Em sua viagem a Luxemburgo no mês passado, o papa parou de “surpresa” numa cafeteria. Francisco chegou até a convidar o dono da sua sorveteria preferida em Roma, a Padrón, para visitar o Vaticano. E sabe-se que os seus doces preferidos são os alfajores argentinos da marca El Nazareno.
No livro The Vatican Cookbook (O Cozinheiro do Vaticano, em tradução livre), publicado em 2014, o papa também cita outras receitas, como empanadas de carne ou pizza de muçarela com fainá.
Seu apreço pela comida é tão notável que os líderes ou bispos que o visitam no Vaticano costumam levar presentes que podem ser degustados.
Mas o prato preferido do papa, que ele pôde saborear com a família no seu aniversário de 90 anos, é o chamado Bagna Calda, muito conhecido na região italiana do Piemonte, que costuma ser preparado com anchovas, azeite e alho e é usado como molho para legumes.
No entanto, o prazer e a diversão não são a única razão pela qual o papa falou sobre o valor da alimentação e da nutrição. Ao longo do seu pontificado, o papa deu também um enfoque pastoral e falou sobre seu significado espiritual.
Francisco diz em sua nova encíclica Dilexit Nos, que quando era criança, para o carnaval, sua avó “preparava doces, e a que ela fazia era uma massa muito fina”.
Receba as principais de ACI Digital por WhatsApp e Telegram
Está cada vez mais difícil ver notícias católicas nas redes sociais. Inscreva-se hoje mesmo em nossos canais gratuitos:
“Depois colocava-a no azeite e aquela massa crescia e quando nós a comíamos, estava vazia. Aqueles doces em dialeto chamavam-se ‘mentirinhas’. E era precisamente a avó quem explicava a razão: aqueles doces ‘são como as mentiras, parecem grandes, mas dentro não têm nada, não há nada verdadeiro, não há substância alguma’”.
No mesmo documento, o papa diz que “o que nenhum algoritmo conseguirá abarcar é, por exemplo, aquele momento de infância que se recorda com ternura e que continua a acontecer em todos os cantos do planeta, mesmo com o passar dos anos”.
“Penso na utilização do garfo para selar as bordas daquelas empadas caseiras que preparávamos com as nossas mães ou avós. É aquele momento de aprendizagem culinária, a meio caminho entre a brincadeira e a idade adulta, em que assumimos a responsabilidade do trabalho para ajudar o outro”, escreve Francisco.
O arcebispo de Chieti-Vasto, Itália, dom Bruno Forte, disse que essa encíclica “dá a chave para compreender todo o magistério” do papa Francisco. Assim, não poderia faltar alguma referência à comida.
Para Francisco, a alimentação é também um elemento fundamental da dignidade humana. Ele falou várias vezes sobre a necessidade de uma distribuição justa de alimentos e disse que desprezar a comida “é arrancá-la das mãos” dos pobres.
O papa faz uma refeição com os mais necessitados no Vaticano todos os anos no Dia Mundial dos Pobres. Em Roma, há um boato de que algumas noites, há alguns anos, ele distribuía comida incógnito aos moradores de rua que encontrava nos arredores da basílica de São Pedro.
Para Francisco, a comida também tem um significado de fraternidade e até de amor. Na homilia do Dia Mundial da Família de 2015, em Filadélfia, EUA, o papa disse que “a fé abre a ‘janela’ à presença operante do Espírito e demonstra-nos que a santidade, tal como a felicidade, está sempre ligada aos pequenos gestos”.
“São gestos mínimos, que uma pessoa aprende em casa; gestos de família que se perdem no anonimato da vida diária, mas que fazem cada dia diferente do outro. São gestos de mãe, de avó, de pai, de avô, de filho, de irmãos. São gestos de ternura, de afeto, de compaixão. Gestos como o prato quente de quem espera para jantar, como o café da manhã de quem sabe acompanhar o levantar na alvorada. São gestos familiares”.
Mas, a doutrina fundamental do papa Francisco sobre a alimentação é aquela sobre o alimento essencial, o Corpo de Cristo: “Quem recebe o Corpo e Sangue de Cristo na fé não só come, mas fica saciado”, disse o papa depois da oração do Ângelus em junho de 2022.
“Comer e ficar saciado: são duas necessidades fundamentais, que na Eucaristia são satisfeitas”, disse Francisco.