RECIFE, 15 de out de 2021 às 16:03
O bispo de Pesqueira (PE), dom José Luiz Ferreira Salles, reconheceu as “presumíveis aparições de Nossa Senhora da Graça” a duas crianças na Vila de Cimbres, em 1936, em carta pastoral publicada no início de outubro. Nas aparições, a Virgem teria alertado Maria da Luz e Maria da Conceição sobre três castigos que seriam enviados por Deus e pediu oração e penitência. Dom Salles considerou que as mensagens dessa aparição estão de acordo com as “verdades da fé cristã” e permitiu que os fiéis continuem com a devoção à Virgem Maria no local.
Em sua carta pastoral, o bispo de Pesqueira afirma que “nas relatadas aparições da Virgem Maria, na Aldeia da Guarda, sob o título de ‘Nossa Senhora da Graça’, há elementos, traços e sinais que abalizam e sinalizam a grande probabilidade do caráter sobrenatural da experiência vivida pelas jovens Maria da Luz (Irmã Adélia) e Maria da Conceição”. Segundo dom Salles, “as mensagens comunicadas durante as alocuções com as videntes documentadas e cuidadosamente analisadas, estão em profunda consonância com as verdades da fé cristã, contidas nas Sagradas Escrituras e na Doutrina Católica e, em nada, contrastam com a moral e os costumes”. O bispo, então, concedeu “a permissão para que os fiéis possam, nessas terras. continuar com a devoção e a veneração à Virgem Santíssima, Mãe de Deus, invocada com o título de ‘Nossa Senhora da Graça’”.
O bispo também disse que “a diocese de Pesqueira é a responsável direta pelo cuidado pastoral da Aldeia Guarda e proporcionará, através dos meios que se fizeram necessários, a assistência sacramental e espiritual a peregrinos e devotos que acorrem ao lugar”. Disse ainda que “interpretações, posicionamentos oficiais acerca das mensagens ou quaisquer conteúdos relativos às presumíveis aparições são exclusivamente do Magistério da Igreja e, de modo particular, do bispo diocesano de Pesqueira, a quem compete vigiar e dar o consentimento prévio sobre o assunto”.
A carta pastoral foi assinada durante um ato no local das aparições, a Aldeia Guarda, em Vila de Cimbres, no dia 2 de outubro. Na ocasião, dom Salles afirmou que ao longo destes anos, a diocese “vem fazendo um caminho de escuta do Espírito” e, “em meio a crises e desafios, buscou acolher em seu seio as expressões populares, seja de devoção, seja de vivência comunitária da fé”.
“Ainda que, às vezes de forma silenciosa, aguardando o tempo do Espírito, a nossa diocese não deixou de olhar e acompanhar com amor de mãe este local e as suas mensagens”, disse. Por isso, afirmou que “por várias vezes e em vários anos, a Aldeia Guarda, as supostas aparições de Nossa Senhora estiveram presentes para contemplar e avaliar a ação pastoral à época existente. Mas sempre de acordo com as orientações da Igreja”.
Padre Fábio Pereira, Vigário Geral e membro da Comissão Diocesana de investigação e aprofundamento sobre as aparições disse ao site da diocese de Pesqueira que “a Igreja é sempre prudente em relação a assuntos ligados a aparições, e assim deve ser”. Segundo ele, o bispo diocesano “constituiu uma comissões para estudos junto a teólogos e historiadores”. “Depois de um longo período, é chegado o tempo em que a Diocese sentiu a necessidade de dizer algo sobre as ‘presumíveis aparições’. Nós estamos escrevendo ao Vaticano, junto com o bispo diocesano, uma resposta, mediante a pergunta: O que de fato aconteceu naquele lugar? Depois de 85 anos, a Igreja de Pesqueira vem se pronunciar sobre o fato”, afirmou.
Autora do livro ‘O diário do silêncio - O alerta da Virgem Maria contra o comunismo no Brasil’, sobre as aparições em Cimbres, Ana Lígia Lira disse à ACI Digital que recebeu “com muita alegria esta carta pastoral” e vê “como uma atitude de muita coragem do bispo, porque foram 85 anos de silêncio”. Para ela, este documento é “um ato de desagravo à memória de tantas pessoas que foram perseguidas e ridicularizadas no passado por não negar as aparições, como Maria da Conceição, a irmã Adélia (nome que Maria da Luz adotou ao ingressar no Instituto das Religiosas da Instrução Cristã), padre Kehrle” (um dos responsáveis que investigou o caso na época).
“Esta carta pastoral traz a palavra do pastor e da Igreja, por isso, traz credibilidade para as aparições. É o sim da Igreja para algo que antes já havia recebido o sim do povo, porque primeiro vem a devoção popular e depois a Igreja investiga e dá o seu sim”, disse a autora, que é mestre em História.
Na carta pastoral, dom Salles também informa que “no que concerne especificamente à irmã Adélia Teixeira de Carvalho, morta em odor de santidade, já solicitamos e estamos aguardando o Nihil Obstat da Congregação das Causas dos Santos, autorizando a abertura oficial do seu Processo de Beatificação e Canonização em nossa Diocese”.
Para a autora Ana Lígia Lira, irmã Adélia teve grande visibilidade, pois “estava em uma congregação religiosa muito ativa”. “E acredito que mesmo que ela não tivesse sido uma das videntes, também seria vista como modelo de santidade, porque teve uma vida de entrega como religiosa, trabalhava sempre pelos pobres e mais humildes”, afirmou. Entretanto, destacou que é preciso lembrar que houve outra vidente, Maria da Conceição, “também tem em sua vida um testemunho de fé, tendo vivido mais recolhida, na simplicidade, pobreza, humildade. Mas, sua vida também tem um histórico de possível santidade e acredito que um dia a Igreja possa olhar para ela”.
Receba as principais de ACI Digital por WhatsApp e Telegram
Está cada vez mais difícil ver notícias católicas nas redes sociais. Inscreva-se hoje mesmo em nossos canais gratuitos:
As aparições de Nossa Senhora da Graça em Cimbres
As aparições de Nossa Senhora em Cimbres tiveram início no dia 6 de agosto de 1936. Naquele dia, Maria da Luz e Maria da Conceição foram colher sementes de mamona no sítio. Na época o cangaceiro Lampião e seu bando agiam na região com roubos e assassinatos. Maria da Luz, então, perguntou à amiga o faria se Lampião aparecesse. Maria da Conceição respondeu: “Nossa Senhora haveria de dar um jeito de nos proteger”. Em seguida, as meninas viram no alto da serra a imagem de uma mulher com uma criança nos braços que acenava para que elas se aproximassem.
Ao retornarem para casa, segundo relata o site das Religiosas da Instrução Cristã, “contaram a história para os pais de Maria da Luz, Arthur Teixeira de Carvalho e Auta Monteiro de Carvalho. Inicialmente, os dois não acreditaram e Arthur foi com as meninas até o local da aparição, que era de difícil acesso. Chegando lá, as duas viram novamente a mulher. Sem conseguir enxergar e achando que era alucinação das garotas, o pai de Maria da Luz pediu que ela perguntasse para a moça quem era Ela e o que queria. ‘Eu sou a Graça’, respondeu. ‘Vim para avisar que hão de vir 3 castigos mandados por Deus. Diga ao povo que reze e faça penitência’”.
A notícia logo se espalhou pela região e muito passaram a ir ao local para rezar ou por curiosidade. Algumas pessoas pediram um sinal visível. Em 10 de agosto, quando as meninas foram visitar o local, a imagem lhes apontou a água que saía da rocha em frente ao lugar da aparição. Há na rocha uma pequena cavidade sem rachadura e estava cheia de água e receberam esta resposta: “Para curar doenças”. Muitos, então, acorreram ao monte onde se verificou a presença da água e, no lugar onde sempre se colocava a imagem, uma marca branca e, ao lado, duas marcas de pés, sendo uma de mulher e outra de uma criança pequena.
Segundo a carta pastoral de dom Salles, “os dias que se seguiram foram marcados por uma inicial desconfiança dos familiares, silenciamento das autoridades eclesiásticas e a tentativa de parte dos governantes de interromper a devoção do povo. Devido às movimentações no local após as primeiras visões, os relatos se tornaram caso de polícia, com a detenção do pai de Maria da Luz, a presença de vigilância armada na região e ameaças às manifestações de fé. No entanto, as aparições foram acompanhadas por um processo de legitimação dos fiéis que, em uma região com diferentes problemas sociais, buscavam conexões com o divino”.
“São vários os relatos de curas, graças, milagres e conversões alcançadas por fiéis que visitaram a localidade das presumíveis aparições desde agosto de 1936”, afirmou o bispo. Recordou ainda que, “por determinação de dom Adalberto Accioli Sobral (1887-1951)3, o padre José Kehrle (1891-1978), seu secretário, e frei Estevam Roettger, OFM (1877-1955), acompanharam os fatos, com diferentes interrogatórios às crianças, com o parecer favorável sobre os eventos e o atestado da sua veracidade”. “Durante as análises, os eclesiásticos fizeram investigações das mais variadas formas, com interrogatórios e observações do que foi relatado pelas videntes. Entre as suas estratégias, acompanharam pessoalmente as presumíveis aparições, com indagações que buscavam confrontar as informações e identificar alguma suposta inverdade. Mesmo assim, todos os relatos foram confirmados”, disse.
Para dom Salles, “as narrativas históricas sobre os eventos na diocese de Pesqueira podem ser compreendidas a partir das afirmativas presentes no Diário do Frei Estevam Roettger”. O religioso escreveu que quem “acompanha atentamente os acontecimentos do Sítio Guarda no ano de 1936, há-de se convencer que foi ‘Nossa Senhora da Graça ou das Graças’ que se manifestou e que na bondade do seu Coração maternal quer ajudar aos homens a se salvarem”. Por isso, o bispo de Pesqueira declarou que “as romarias, as ações de fiéis e religiosos mantidas até os dias atuais demonstram a importância do evento para as ações religiosas da Igreja Católica, não apenas em nossa diocese, mas em todos os espaços e manifestações do culto mariano”.
Confira também:
3 supostas aparições da Virgem que ainda não foram aprovadas pela Igreja https://t.co/OgzUc04rhN
— ACI Digital (@acidigital) June 25, 2021