“A Igreja tem um ensinamento, uma diretiva para ajudar, mas ninguém fala”, disse á ACI Digital Maurício Abambres, coordenador nacional leigo do apostolado Courage Brasil. Fundado em 1980, nos Estados Unidos, pelo padre John Francis Harvey, o courage é um apostolado para pessoas com atração pelo mesmo sexo. Diante dessa realidade, abre-se espaço para “um movimento contra”, tanto dos que acusam a Igreja de “preconceituosa” quanto dos que adotam um “relativismo” e fazem uma interpretação própria da doutrina.

Courage ajuda as pessoas a se manterem fiéis ao que a igreja ensina: que “os atos homossexuais são intrinsecamente desordenados” e “não podem, em caso algum, ser aprovados” (Catecismo da Igreja Católica 2.357), mas que as pessoas com esse tipo de atração  “devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á, em relação a eles, qualquer sinal de discriminação injusta. Estas pessoas são chamadas a realizar na sua vida a vontade de Deus e, se forem cristãs, a unir ao sacrifício da cruz do Senhor”.

Courage começou com um grupo de pessoas com atração pelo mesmo sexo que tinham se afastado da Igreja. O grupo procurou o então arcebispo de Nova York, cardeal Terence Cooke. O grupo havia voltado para a Igreja e buscava apoio para viver segundo a doutrina católica.

O apostolado tem cinco metas que devem ser vividas por seus membros: castidade, “segundo o ensinamento da Igreja Católica em relação à homossexualidade”; oração e dedicação, “que é dedicar-se a Cristo por meio da oração e do serviço ao próximo, ou seja, ter uma vida de espiritualidade católica plena”; companheirismo, ”que é ter um ambiente em que se possa falar dos desafios, que a pessoa possa se expressar e não enfrentar sozinha os desafios que a homossexualidade apresenta”; apoio, “saber que é possível fazer amizades boas, castas, isto é, uma amizade em que não se sexualiza o afeto por outra pessoa”; e bom exemplo, que é “viver de acordo com essas metas para servir de bom exemplo para os outros, com a finalidade de mostrar que a castidade é possível”. Os grupos, chamados de células, são acompanhados por um capelão, um sacerdote indicado pelo bispo. Fazem reuniões mensais, em que há momento de oração, formação e partilha.

“O nosso fundador sempre disse que era necessário para toda pessoa homossexual que se tenha um ensinamento correto sobre a homossexualidade como ensina a Igreja. Então, usamos muito como fundamento a Teologia do Corpo de são João Paulo II, todos os parágrafos do Catecismo que falam sobre a castidade, a noção de amor – que amor não envolve só o aspecto erótico, como se tem tanto no mundo moderno”, contou Abambres.

O coordenador do Courage Brasil recordou que o Catecismo ensina que “a castidade é uma virtude e um dom, porque pedimos essa virtude a Deus”. Entretanto, atualmente, “percebemos uma noção que o papa Bento XVI falava sobre o relativismo, como já tinha permeado o mundo moderno e já estava atrapalhando questões de fé, da nossa crença”, disse.

Nesse sentido, destacou a questão da consciência, pois “a consciência também precisa ser esclarecida”. “A pessoa pode ter uma consciência que não foi bem formada. Ela pode também ter uma consciência deformada, de formar a própria consciência”, afirmou. Com isso, pode-se acabar distorcendo o que a Igreja ensina e caindo em uma “racionalização do pecado”. “É apresentada a noção de pecado, a pessoa sabe, mas por não querer viver a virtude, ter dificuldades para isso, passa a racionalizar, a dizer que não é pecado o que é pecado, a querer mudar a doutrina”, disse.

Segundo Abambres, isso “é o que tem acontecido e percebemos até em movimentos que se dizem católicos e são pró-ideologia LGBT”. “Eles dizem que a Igreja está errada. Isso é algo esquisito, porque, se Cristo veio dizendo que é a Verdade e a Igreja é a esposa de Cristo, detentora da doutrina, se eu começo a dizer que a doutrina está errada, estou falando que Cristo errou. Cristo não é só o que o pessoal diz hoje em dia que ‘Cristo pregou o amor’. Realmente, pregou o amor e temos que amar. Mas, Cristo falou várias coisas. Tem todo o Novo Testamento com os ensinamentos de Cristo, temos a tradição da Igreja...”, declarou.

O Catecismo da Igreja Católica diz no número 2.357: “A homossexualidade designa as relações entre homens ou mulheres, que experimentam uma atração sexual exclusiva ou predominante para pessoas do mesmo sexo. Tem-se revestido de formas muito variadas, através dos séculos e das culturas. A sua gênese psíquica continua em grande parte por explicar. Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves a Tradição sempre declarou que ‘os atos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados’. São contrários à lei natural, fecham o ato sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afetiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados”.

Maurício Abambres destacou que o que a Igreja diz nesse numeral do Catecismo é que “os atos são intrinsicamente desordenados”, e não a pessoa. “Aí, vemos algo muito comum da modernidade que é identificar o ato com a pessoa. Então, entramos um pouco na questão da ideologia de gênero, onde se tem identidades diferentes a partir de uma orientação sexual”, afirmou.

Segundo ele, “a Igreja não considera ninguém simplesmente pela atração sexual”, mas considera “a pessoa, filha de Deus”. Por isso, é necessário “fazer a distinção entre pessoa, inclinação e ato”. “A pessoa não deve ser considerada apenas pela sua orientação sexual, ela não se reduz a isso. Depois, toda pessoa tem inclinações, inclinação a comer, ao sexo, à beleza e a outras coisas. Essas inclinações podem estar ordenadas, ou seja, de acordo com a própria natureza humana, ou desordenadas. Inclinações ordenadas e desordenadas todos nós temos. Mas, como a ideologia identifica a pessoa à inclinação, batem muito nessa tecla de que a Igreja diz que a pessoa é desordenada, o que é uma mentira”.

Além disso, afirmou, “a Igreja vai adiante”. “Se a inclinação é desordenada, toda pessoa que sente inclinação desordenada está em pecado? Não. Todos nós temos inclinações desordenadas. O que vai definir se é pecado ou não são os nossos atos. Então, os atos são pecaminosos e é isso que mostramos no Courage”, disse, destacando que “a Igreja me dá os meios para que eu não ceda a esta inclinação desordenada”.

O coordenador do Courage Brasil ressaltou que, “Deus não pede nada impossível e, com Ele, podemos tudo”. “Então, se Ele pediu a castidade para todos, é sinal de que nós temos essa graça, mas temos que fazer nosso esforço tanto para compreender quanto para viver”.

A espiritualidade possui grande importância no Courage. Abambres recordou que o fundador, padre Harvey, era Oblato de São Francisco de Sales e, por isso, a espiritualidade do doutor da Igreja é muito presente no apostolado, com o Sagrado Coração de Jesus e a vivência das virtudes cotidianas. Segundo ele, dois livros de são Francisco de Sales, Filoteia e Tratado do Amor de Deus, são muito usados no apostolado, além de um opúsculo de padre Harvey, chamado ‘Plano espiritual para o homossexual de hoje’. Este estabelece “pelo menos quinze minutos de oração mental, rezar o terço todos os dias, ter uma grande devoção à Virgem Maria, escolher um santo de devoção, comungar e se confessar o mais frequente possível e ter esse plano diário para viver a espiritualidade de modo constante e regular, não esporádico”.

Além disso, para a vivência do que a Igreja ensina sobre a castidade, disse Abambres, “padre Harvey colocou outro ponto a mais: dedicar-se a um serviço de caridade, para não ficar ‘ensimesmado’, para sair de si mesmo e não ficar apenas nas cruzes interiores”.

Experiência pessoal

Maurício Abambres contou à ACI Digital que ele próprio passou por uma longa experiência até encontrar o Courage e entender e viver os ensinamentos da Igreja Católica sobre pessoas que sentem atração pelo mesmo sexo. Segundo ele, desde a adolescência sente atração pelo mesmo sexo. Aos 16 anos, converteu-se, mas, “por não encontrar naquela época um apoio, um ensinamento” e, como “não aguentava mais a pressão na cabeça e não obtinha respostas”, os 27 anos abandonou a fé.

“Eu simplesmente abandonei porque não queria perverter o ensinamento da Igreja. Eu assumi minhas atitudes e não fiquei racionalizando o que eu queria fazer dizendo que a Igreja estava errada”, declarou. Então, “durante mais de dez anos”, adotou “um estilo de vida gay”.

No entanto, disse que sempre teve em sua vida “aquele apelo para retornar à fé, aos ensinamentos de Deus”, e, depois de muito tempo, sentiu “Deus dizendo ‘volta filho’, como ao filho pródigo”. Abambres voltou a assistir a missa, “mas não comungava porque sabia que não podia”. Também retomou as orações, as leituras espirituais.

“Mas sabia que precisava dar passos adiante para viver plenamente a minha fé. Eu estava em um relacionamento há uns quatro anos. O que aconteceu? Comecei a rezar e a pedir a Deus uma orientação. Terminei meu relacionamento. Eu gostava muito daquela pessoa, tinha um grande amor, mas aquele amor poderia muito bem ser expresso em uma amizade sincera e não ser sexualizado. Então, terminei esse relacionamento para fazer uma confissão sincera e arrependida e poder voltar a frequentar o sacramento da Eucaristia”, recordou.

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Após esse retorno à Igreja, quando “já havia internet”, pesquisou e descobriu o apostolado Courage. “Foi a ajuda que tive para viver a castidade. Fiquei até abismado de saber que havia uma resposta para tudo o que eu me perguntava desde a adolescência”, disse, destacando que já naquela época havia uma carta pastoral de 1986 do então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, cardeal Joseph Ratzinger – posteriormente papa Bento XVI – sobre o atendimento pastoral das pessoas homossexuais.

“Infelizmente é uma coisa que ainda é pouco divulgado hoje em dia. Não se fala da doutrina da Igreja, não se fala dessa carta pastoral. Quer dizer, a igreja tem um ensinamento, uma diretiva para ajudar as pessoas e ninguém fala, ninguém divulga. Tem um movimento contra e aí começam os discursos dizendo que a Igreja é preconceituosa. Mas não se fala exatamente o que a Igreja ensina. O que se fala é o que é produto da cabeça das pessoas”, concluiu.

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