Para frei Clodovis Boff, o domínio da Teologia da Libertação está na raiz do declínio do catolicismo no Brasil. Boff sabe do que está falando. Até 2007, o religioso da ordem dos Servos de Maria foi um teólogo importante da Teologia da Libertação, ainda que não tão famoso quanto seu irmão Leonardo. Foi nesse ano que Clodovis publicou o artigo “Teologia da Libertação e Volta ao Fundamento”, em que acusa os teólogos da libertação de pôr o pobre no lugar de Jesus Cristo como centro.

Agora, Boff volta à carga. “É preciso que a Igreja volte a dar ênfase a Cristo também como Sacerdote, como Mestre e Senhor, e não apenas ao combate à pobreza e à crise climática”, disse no lançamento do livro A crise na Igreja Católica e a Teologia da Libertação, escrito em colaboração com o padre Leandro Rasera e lançado recentemente pela editora Ecclesiae. “São pautas importantes, mas sem beber de Cristo, que é a Fonte, tudo seca, tudo morre”.

No final dos anos 1960, quando a Teologia da Libertação começou a dominar o pensamento religioso no Brasil, o país tinha mais de 90% de católicos em sua população.

De lá para cá, a porcentagem de católicos na população brasileira só decresceu, até chegar aos cerca de 51% segundo pesquisa do Datafolha de 2020.

Mesmo esses católicos têm um índice muito baixo de participação na Igreja. Uma pesquisa da Universidade Georgetown, dos EUA, feita em 36 países no ano passado, mostrou que só 8% dos católicos brasileiros vão à missa no domingo. A taxa é a terceira menor entre os países analisados. 

Para Boff e Rasera, o declínio da frequência dos fiéis à Igreja se deve a que o depósito da fé não está sendo transmitido.

Com a Teologia da Libertação, “acontece a instrumentalização da fé em função do pobre”, escreve Clodovis no livro. “Cai-se no utilitarismo ou funcionalismo em relação à Palavra de Deus e à teologia em geral”.

A Teologia da Libertação “apela para ideias como ‘margens de gratuidade’ e ‘reserva escatológica’ para afirmar seu respeito à transcendência da fé. Na verdade, a parte da transcendência é, nesta teologia, a parte menor e menos relevante, a ‘parte de leão’ cabendo, como sempre, à ‘leitura libertadora’ da fé”, escreve Clodovis

Para o frade, é esse esvaziamento que fez muitos católicos tentar preencher esse vazio no protestantismo, no esoterismo, no neopaganismo e até mesmo no satanismo.

“Longe de ter desaparecido, seria absurdo dizê-lo, a fé em Cristo continua a ser referência para a Igreja”, disse o frade numa live de lançamento de seu livro em que palestrou sobre o tema A Crise na Igreja Católica: Falta de Fé, Ideologias e Mundanismo. “Mas a pergunta decisiva é se a fé em Cristo é a sua referência central, principal, determinante”.

“Não se trata assim de a Igreja afirmar a centralidade de Cristo apenas em termos formais e teóricos, mas de afirmá-la existencial e operativamente, como sendo o coração pulsante de toda a sua vida e ação”, comenta o frei.

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“Afirmar doutrinariamente a primazia de Cristo na Igreja custa pouco”, diz o frade. “Afirmar, porém, de modo existencial, que Cristo é o centro absoluto da Igreja, custa, e muito: custa o coração e a alma, quando não custa lágrimas e quiçá o sangue”.

No livro Clodovis fala sobre como colaborou com a teologia da libertação durante os pontificados do papa são João Paulo II e do papa Bento XVI.

Para ele, é necessário que a Teologia da Libertação seja repensada tendo Cristo no centro, não o pobre, para que seja “oportuna, útil e necessária”, como foi dito pelo papa são João Paulo II em sua carta aos bispos brasileiros de 1986.

As críticas à Teologia da Libertação afastaram os irmãos Clodovis e Leonardo Boff. Leonardo deixou a Igreja, casou-se e é professor aposentado de Ética, Filosofia da Religião e Ecologia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Clodovis vive como frade em Rio Branco (AC).

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