Vaticano, 1 de ago de 2019 às 12:15
O vice-presidente do Pontifício Instituto João Paulo II, Pe. José Granados, advertiu que os novos estatutos estabelecidos e as mudanças acadêmicas anunciadas para esta instituição são “um perigo para manter a herança” do santo polonês em torno dos estudos sobre matrimônio e família.
Desta forma, o sacerdote, especialista em Teologia, juntou-se às preocupações que mais de 240 alunos e ex-alunos expressaram em uma carta enviada, em 25 de julho, ao presidente do Instituto, Mons. Pierangelo Sequeri, e ao Grão-Chanceler, o Arcebispo Vincenzo Paglia
Do mesmo modo, também respaldou os questionamentos que um membro importante do instituto, consultado pelo Grupo ACI, faz sobre a maior ingerência que Dom Paglia tem agora para nomear novos professores e a eliminação de cátedras importantes sobre Moral.
Isso, indicou Pe. Granados, “para se libertar de um professor de fama reconhecida, sem julgamento nem direito a defesa”, referindo-se a Mons. Livio Melina; e a um docente que se destaca por sua linha favorável a Humanae vitae e a Veritatis splendor, como é Pe. José Noriega.
Nesse sentido, em uma extensa entrevista concedida ao Grupo ACI, Pe. Granados esclareceu que os novos estatutos não foram fruto de um trabalho comum “com os demais conselhos do Instituto”.
“Como vice-presidente da sede de Roma durante este período de transição, quero negar qualquer responsabilidade em relação aos novos estatutos, que conheci no mesmo dia de sua publicação. Eu vejo, não apenas nos estatutos, mas especialmente nas mudanças dos professores (e especialmente nas demissões) um perigo para manter a herança de São João Paulo II”, expressou.
O vice-presidente do Instituto assinalou que, com o motu proprio Summa familiae cura de 2017, o Papa Francisco expressou seu desejo de “acolher o Instituto, expandi-lo, promovê-lo, como Mons. Sequeri nos disse desde o início”. “Mas, no último momento, apareceu algo que não tinha nada a ver com o trabalho comum realizado, por surpresa e em pleno verão (...). Isso nos deixou estupefatos”, expressou.
Pe. Granados indicou que, se os estatutos antigos forem comparados com os novos, dá para perceber claramente que se diminui a presença do conselho de professores, pois “os professores estáveis têm agora apenas dois representantes”, quando antes todos participavam. Isso, indicou, “diminui a contribuição colegial dos professores estáveis para aprovar as teses doutorais ou os planos de estudos”.
Além disso, agora, a nomeação de novos professores está “sob a influência direta do Grão-Chanceler” e “é quase impossível” se opor a um candidato que ele promova.
“Antes, era necessário que o conselho, onde estavam todos os professores estáveis, desse seu consenso ao candidato, depois de uma análise das publicações do candidato feita por três professores externos ao Instituto. O Grão-Chanceler se limitava a aprovar a pessoa que o presidente lhe apresentasse após obter o consenso do conselho”, recordou.
Redução da Teologia Moral
Outra das consequências que os novos estatutos trazem é “a drástica redução da Teologia Moral”, porque, embora em seu comunicado de 29 de julho o Instituto diga que esta “encontra um novo posicionamento e indica que existem duas cátedras de moral”, do amor e do matrimônio e da ética da vida, não se diz "que, de acordo com os antigos estatutos, já havia duas cátedras que cobriam estas matérias".
“Também não se diz que no plano de estudos, a moral do matrimônio (equivalente à moral especial) agora tem apenas 3 créditos, metade da maioria das outras cátedras. A moral, portanto, foi reduzida pela metade e não foi só isso: os professores que a ensinavam foram demitidos: Melina, Noriega e, para a bioética, Maria Luisa di Pietro”, assinalou na entrevista ao Grupo ACI.
Pe. Granados se referiu especialmente à abolição da cátedra de moral fundamental ocupada por Mons. Melina, uma cátedra de 38 anos que o Cardeal Carlo Caffarra também ensinou e “que é essencial para o trabalho do Instituto, se levamos em consideração que Wojtyla foi um moralista e confiou-a ao primeiro presidente do Instituto”.
“Se não se conhecem os fundamentos da moral, se não forem bem colocados, a moral matrimonial fica no ar. A forma como alguém se posiciona diante da Veritatis splendor será como se posicionará diante das questões da moral especial, como a moralidade da contracepção ou dos atos sexuais fora do matrimônio”, e diante da “grandeza da vocação à que Deus chama o homem”, expressou.
Por que foi eliminada?
O vice-presidente do Instituto alertou que a razão dada na declaração de 29 de julho "é inconsistente". Diz-se "que é um assunto da primeira etapa da teologia", mas há pelo menos duas outras cátedras, antropologia teológica e teologia fundamental, "que estão no mesmo caso e não parecem criar problemas".
“E por que esse argumento não foi uma objeção nos 38 anos de vida da cátedra? A razão dada pode ser explicada apenas como uma cortina de fumaça. Qual é a razão verdadeira e triste? Não será que Melina, como titular da cátedra, permaneceu fiel a Humanae vitae e a Veritatis splendor, e a cátedra foi eliminada para eliminar Melina?
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Nesse sentido, denunciou que “não é que Melina não esteja, porque não há cátedra; mas não há cátedra para que Melina não esteja. Eliminou-se a moral fundamental para se libertar de um professor de fama reconhecida, sem julgamento nem direito de defesa”.
No caso do professor Pe. Noriega, o vice-presidente questionou que se dê como razão uma suposta incompatibilidade entre os cargos de professor e Superior Geral da Congregação dos Discípulos dos Corações de Jesus e Maria, à qual ele pertence.
No entanto, o cânon 152 do Código de Direito Canônico “proíbe apenas que se assumam dois cargos incompatíveis, e o mesmo vale para a Veritatis gaudium 29. Será que são incompatíveis neste caso, quando a comunidade religiosa do Pe. Noriega conta apenas com 24 membros de pleno direito? A resposta requer um julgamento prudente. E, as duas pessoas responsáveis por isso anteriormente, ou seja, os dois presidentes anteriores do Instituto, Melina e Sequeri, não julgaram que os dois cargos eram incompatíveis, tanto que permitiram que o professor Noriega ensinasse durante 12 anos, sendo pública e notória a sua condição de superior”.
Além disso, indicou que o fato de não serem cargos incompatíveis se demonstra porque ambos os presidentes confiaram a Pe. Noriega ser também “diretor editorial, além de suas funções de professor”.
“Por último, o professor Noriega termina seu cargo como Superior Geral em cinco meses, algo que Dom Paglia e Mons. Sequeri já sabem. Se o problema é a incompatibilidade, e seu trabalho é apreciado, por que não lhe concedem agora uma licença de seis meses, algo previsto no regulamento da cúria, e assim se elimina o problema?”, questionou.
“Se isso não for feito, que outra explicação resta, a não ser que se trata de uma desculpa para poder liberar a cátedra de moral do amor e do matrimônio e livrar-se do encargo de publicações. Não será, por acaso, por causa da linha favorável a Humanae vitae e Veritatis splendor que seguiu?”, perguntou.
Pe. Granados advertiu que são dois casos "gravíssimos em uma instituição acadêmica". “Por acaso, havia problemas doutrinais no ensino desses professores? Como os estudantes podem testemunhar e mostrar através de uma análise de seus escritos, eles sempre foram excelentes em seu respeito ao Magistério, incluindo, é claro, o do Papa Francisco”.
“Explicar o magistério do Papa em continuidade com os Papas anteriores não é apenas algo essencial para toda hermenêutica católica, mas algo que o próprio Papa promove. E, em todo caso, se pensássemos, apesar de tudo, que havia problemas doutrinais em seus ensinamentos, por que eles não são julgados e lhe concedem a possibilidade de se defenderem?”, questionou.
Do mesmo modo, assinalou que, "se permitem este abuso, a cátedra de todos os professores fica ameaçada", porque "poderíamos ser expulsos, não porque negamos a doutrina da fé, que seria justo, mas por seguir linhas teológicas que as autoridades da universidade não gostam”.
No entanto, Pe. Granados advertiu que não foram eliminados apenas Mons. Melina e Pe. Noriega, mas também “tiraram os cursos de quase todos os professores poloneses” e que eram especialistas em São João Paulo II.
“Agora, quais são os cursos que serão oferecidos para aprofundar na herança de São João Paulo II? E, além disso, ao não pedirem à professora Maria Luisa di Pietro seus vários cursos, desaparece a principal representante da contribuição do Cardeal (Elio) Sgreccia”, muito apreciado pelo santo polonês “e grande pioneiro da bioética”, expressou o vice-presidente, que alertou sobre “os rumores de que virá ensinar o professor Maurizio Chiodi, que se abre à licitude da contracepção e aceita como ‘bem possível’ em algumas situações os atos homossexuais”.
"Com os poderes que o Grão-Chanceler tem agora e as intenções que revela ao dispensar Melina e Noriega, será uma questão de tempo a substituição do corpo docente com outro alheio à visão de São João Paulo II”, para quem sempre esteve no centro a fidelidade da Igreja a Cristo, assinalou.
"Os professores também estão muito tristes por causa da demissão dos nossos colegas”, expressou o sacerdote, que acrescentou que a carta enviada a Dom Paglia e a Mons. Sequeri, em 25 de julho, explica por si só e inclui as razões do medo dos alunos e ex-alunos “a que não se conserve a identidade que São João Paulo II quis dar ao Instituto fundado por ele e encomendado à proteção de Nossa Senhora de Fátima”.
Nesse sentido, pediu a Dom Paglia e a Mons. Sequeri “para refazerem os passos equivocados”, porque “a identidade do Instituto está gravemente ameaçada”.
São João Paulo II, recordou, fundou o Instituto como uma comunidade acadêmica para investigar a verdade do amor "do plano de Deus para o matrimônio e a família". "A luz para a nossa noite não vem principalmente de uma análise dos problemas do homem, mas de algo mais original: o dom que Deus deu ao homem e à Igreja em cada matrimônio e em cada família", afirmou.
Confira também:
Alunos do Instituto João Paulo II divulgam carta e a instituição responde https://t.co/buZpXvz3gI
— ACI Digital (@acidigital) July 31, 2019