O presidente da Conferência dos bispos da Alemanha, dom Georg Bätzing, bispo de Limburg, rejeitou ser chamado de cismático, em entrevista exclusiva à ACI Stampa, serviço em italiano do grupo ACI, no dia 6 de maio. O termo vem sendo usado com frequencia crescente por críticos do Caminho Sinodal em que a igreja alemã se lançou há pouco mais de um ano.

Fórum de discussões entre bispos, padres e leigos, o Caminho Sinodal vai ao longo de dois anos, propor mudanças na prática pastoral da Igreja no país. Com a pretensão de ser um fórum vinculante para a Alemanha, o Caminho Sinodal, porém, pôs em dicussão propostas como ordenação de mulheres, fim do celibato e mudança na moral sexual da Igreja, incluindo o homossexualismo que, se adotadas na Alemanha, separariam a igreja local da Igreja Universal.

“É absolutamente claro que existem questões que só podemos debater em nível da Igreja Universal”, disse Bätzing. “Vamos contribuir da Alemanha com nossos pensamentos”.

“Desejo, porém, rejeitar a acusação dirigida repetidas vezes a nós de sermos cismáticos ou de querermos nos separar de Roma como igreja nacional alemã. Nosso vínculo com Roma e com o Santo Padre é muito estreito”, disse.

O bispo afirma que “’todos os que participam oficialmente deste Caminho Sinodal são responsáveis pelo caráter vinculante de suas conclusões”. “Por esse motivo”, diz, “procederemos com base no princípio da subsidiariedade avaliando, no âmbito do Caminho Sinodal, quais são os passos que nós como igreja local podemos livremente regular e decidir.”

Bätzing foi eleito presidente da conferência episcopal da Alemanha em em março de 2020. A primeira rodada de discussões do Caminho Sinodal ocorrera entre 30 janeiro e 1º de fevereiro daquele ano.

A motivação para essa série de discussões, segundo o presidente da conferência episcopal foi a publicação, em setembro de 2018, do estudo sobre abusos sexuais cometidos por religiosos nas dioceses alemãs de 1946 a 2014. A extensão do problema minou significativamente a credibilidade da Igreja na Alemanha.

Segundo Bätzing, daí surgiu a questão central é do Caminho Sinodal: “Como podemos falar sobre Deus hoje e chegar a uma fé mais profunda?”

“A fé pode crescer e aprofundar-se se nos libertarmos dos medos e dos bloqueios mentais, se nos questionarmos e procurarmos formas de a Igreja hoje estar presente para as pessoas”, diz Bätzing. Em seu apoio, o bispo cita a ‘Carta ao Povo de Deus que está em caminho da Alemanha’, enviada pelo papa Francisco em de 29 de junho de 2019, quando a realização do Caminho Sinodal já estava decidida.

Na carta, o papa alerta os alemães contra uma “tentação particular”. “Na base dessa tentação”, diz Francisco na carta, “está a crença de que a melhor resposta para os muitos problemas e falhas que existem é reorganizar as coisas, mudá-las e ‘remontá-las’ para trazer ordem e tornar a vida eclesial mais fácil adaptando-a à logica corrente ou à de um grupo em particular.”

O Caminho Sinodal se divide em quatro fóruns temáticos: o poder na Igreja, o celibato, o papel das mulheres e o tema da sexualidade. “Os quatro fóruns sinodais fazem parte do percurso sinodal, que se reúnem entre as assembleias, e nos quais discutimos quais são as consequências de falar de Deus hoje: na distribuição do poder na Igreja, na sexualidade e nos relacionamentos, no serviço sacerdotal e no papel da mulher. É com base nessas questões que se avalia hoje se alguém se sente ou não pertencente à Igreja. O trabalho dos fóruns continua em curso, portanto, não posso prever hoje que sugestões e resultados virão”, disse Bätzing.

A possibilidade de a Igreja aceitar e dar a bênção a uniões entre homossexuais é um dos temas discutidos mais controversos na Alemanha. No dia 15 de março, a Congregação para a Doutrina da Fé emitiu uma resposta sobre essa possibilidade. Segundo o dicastério responsável pela manutenção da integridade da fé católica, a Igreja não está autorizada a abençoar uniões homossexuais porque “não pode abençoar o pecado.” O Catecismo da Igreja Católica estabelece as relações homossexuais como pecado por serem “intrinsecamente desordenadas”.

A declaração da CDF foi mal-recebida, especialmente na Alemanha e Áustria. Na entevista, Bätzing fez novamente a crítica que já fizera ao documento.

“Não existem respostas simples para essas perguntas”, disse o presidente da conferência episcopal alemã. “A questão da bênção de casais do mesmo sexo é um dos muitos tópicos abordados neste fórum. Casais do mesmo sexo e casais que não podem e não querem se casar na igreja, mas que, no entanto, desejam a bênção da Igreja, são parte de nossa sociedade e da Igreja”, afirmou.

“Por isso, o Caminho Sinodal se compromete, em particular no que se refere ao tema das relações bem-sucedidas, a discutir em um contexto amplo, que considere também a necessidade, a possibilidade e os limites do desenvolvimento do Magistério da Igreja. As perspectivas apresentadas pela Congregação para a Doutrina da Fé vão encontrar espaço nestes debates”.

Para o bispo de Limburg, no entanto, “na Alemanha e em outras partes da Igreja Universal, há muito se discute como desenvolver mais o magistério com argumentos válidos com base nas verdades fundamentais da fé e da moral”, mas também “com um espírito de abertura para os resultados mais recentes das ciências humanas e as situações de vida das pessoas hoje”.

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Chad Pecknold, professor associado de teologia sistemática da Universidade Católica da América, em Wahington, DC, nos Estado Unidos, disse à CNA, serviço em inglês do grupo ACI, que Bätzing está “propondo o impossível.”

“Ele tem uma visão errônea do que significa ‘desenvolvimento doutrinal’, argumentando que a Igreja tem que ser ‘atualizada’ com normas sociais progressistas”, diz.

“A Igreja não pode abençoar o pecado, e não pode mudar verdades eternas que Cristo entregou de uma vez por todas. O que o bispo Bätzing espera ‘desenvolver’ resulta em nada menos do que uma eclesiologia diferente. Não é uma eclesiologia católica, e não é uma nova eclesiologia que ele propõe, mas sim uma eclesiologia que se parece com o protestantismo liberal.”

O fórum sobre o papel das mulheres do Caminho Sinodal “pergunta que papel as mulheres podem e devem ter na Igreja?”.

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“A questão da igualdade de gênero está relacionada com a das mulheres em cargos de liderança. Estou muito feliz por termos conseguido aumentar significativamente o número de mulheres em posições de liderança nas dioceses alemãs”, diz Bätzinig. “É importante para mim mencionar honestamente os argumentos da Igreja sobre por que apenas os homens podem ter acesso ao ministério sacramental. Também percebo que esses argumentos são cada vez menos convincentes e que na teologia têm-se elaborados argumentos a favor da abertura do ministério sacramental também às mulheres”.

Bätzing não esconde o fato de que “sobre o ministério sacerdotal, os papas, de João Paulo II em diante, disseram em uníssono que essa questão já foi respondida”. Mesmo assim, o bispo vê uma abertura que o Caminho Sinodal pode explorar. “Costumo citar o diaconato feminino, porque aí vejo possibilidades”, diz.

Uma questão muito importante na Alemanha é a aproximação entre católicos e protestantes. Dentro desse debate, propostas de que protestantes possam comungar em missas católicas têm sido feitas.

“O debate atual não se concentra na intercomunhão no sentido de um convite mútuo generalizado para participar da Eucaristia e da Santa Ceia”, diz Bätzing, “mas em como se comportar em relação às escolhas de acordo com a consciência de cada crente católico ou evangélico”.

“Pessoalmente, respeito essa decisão e não nego a Comunhão quando chega alguém que acredita no que nós, católicos, acreditamos e deseja receber o Senhor”, diz o bispo.

“Devemos, sem dúvida, continuar o diálogo teológico sobre a importância da Eucaristia e da Santa Ceia. E felizmente já existem convergências claras nos últimos anos”, afirma Bätzing.

O professor Pecknold é taxativo diante das declarações do bispo alemão. “Que ele assuma tal posição de aberto desafio ao papa Francisco, e da própria fé, deveria bastar como prova de que o Caminho Sinodal de Bätzing não é, na verdade, um ‘caminho à frente’, mas um caminho para fora da comunhão com Roma”.

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